Por João Victor Marques
A insegurança marítima do Golfo da Guiné (GoG, sigla em inglês) está em escalada, suscitando esforços entre atores regionais e extrarregionais. As especificidades deste espaço marítimo exigem dois compromissos: respeito à soberania dos Estados costeiros, depositada no arcabouço legal-institucional da Arquitetura de Yaoundé (2013); e, cooperação para financiar e construir capacidades locais.
Questiona-se, então, como a União Europeia (UE) tem equilibrado esses compromissos em suas decisões políticas para o GoG. O relatório sobre pirataria e roubo armado do International Maritime Bureau registrou, entre 2019 e 2020, um aumento de 64 para 82 incidentes no GoG. Destacam-se os 22 casos (17 em alto mar) com 130 tripulantes sequestrados (95% dos casos globais) e os 80% de ataques portando armas de fogo.
Diante da crescente sofisticação, escopo e impacto dos crimes marítimos, o Conselho da UE aprovou em 25 de janeiro de 2021 o lançamento do primeiro projeto-piloto da iniciativa “Presença Marítima Coordenada” (CMP, sigla em inglês) para o GoG, que torna a região uma Área Marítima de Interesse sob coordenação de um Estado-Maior sob o escopo da UE. A UE e, especialmente, a presidência portuguesa no seu Conselho (janeiro-junho/2021) reforçam, via CMP, a relevância do GoG ao buscar na presença naval dos Estados-membros a coordenação e o incremento da consciência situacional marítima na área. Trata-se também de um passo militarmente assertivo e complementar, reconhecendo a insuficiência das diversas iniciativas de cooperação sustentadas pelo Plano de Ação 2015-2020 a UE, para assegurar a segurança marítima da região.
Embora sejam continuamente financiados projetos de capacitação local como a Rede Inter-regional do Golfo da
Guiné, responsável pelo sistema de informação YARIS; espera-se maior estímulo a exercícios navais europeus.
Já sob a CMP, o NRP Setúbal da Marinha de Portugal suspendeu para o GoG em 01 de março para compor, durante três meses, a Iniciativa Mar Aberto, prioritária a países africanos de língua portuguesa. Assim, continua-se a Estratégia da UE para o GoG (2014), mas há uma reconfiguração de pesos entre financiar capacidade regional e presença militar extrarregional. Por um lado, os reflexos apontam para um maior protagonismo da UE na colaboração transatlântica e estímulo a Estados resistentes a forças exógenas, como a Nigéria, a aprimorarem suas Marinhas. Por outro, a maior militarização do GoG pode focar excessivamente nos sintomas, ao invés das causas socioeconômicas estruturais da insegurança marítima.
FONTE: Boletim Geocorrente