Por AE Ilques Barbosa Junior (Comandante da Marinha)
O mar faz parte da vida dos brasileiros. Pelo mar fomos descobertos. Por ele chegaram os primeiros invasores e consolidamos nossa independência e nosso território. Com a proximidade do dia 16 de novembro, Dia Nacional da Amazônia Azul, é importante refletirmos sobre o potencial estratégico do mar para nosso País.
Desde os bancos escolares ouvimos dizer que o Brasil é um país continental, cuja área de aproximadamente 8,5 milhões de quilômetros quadrados só é menor que o de outros quatro países do mundo. O que muitos ainda desconhecem, contudo, é que o País possui jurisdição sobre uma área oceânica com cerca de 5,7 milhões de km², que equivale a mais da metade da nossa massa terrestre.
Dada a importância estratégica desse espaço marítimo, das riquezas nele contidas e da imperiosa necessidade de garantirmos sua proteção e preservação, a Marinha do Brasil, buscando chamar a atenção da sociedade para as potencialidades desse patrimônio, passou a denominá-lo “Amazônia Azul”, tão promissora e estratégica quanto sua irmã mais conhecida, a Amazônia Verde.
Dos mares retiramos cerca de 95% do petróleo, 80% do gás natural e 45% do pescado produzidos no País. Pelas rotas marítimas escoamos mais de 95% do comércio exterior brasileiro. No mundo globalizado, cada vez mais dinâmico e conectado em que vivemos, é por meio de cabos submarinos que flui o tráfego de dados responsável por quase toda a comunicação com o mundo, incluindo a internet.
Segundo estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), até 2030 é previsto um crescimento anual de 3,5% para as indústrias globais baseadas nos oceanos – porcentual muito superior ao aumento projetado para o produto bruto mundial no mesmo período, com perspectiva de geração de milhões de empregos relacionados às atividades marítimas. *Também segundo projeções da OCDE, a demanda pelo comércio marítimo triplicará entre 2015 e 2050, respondendo os navios por mais de 75% do transporte global de carga.*
O conceito de economia azul emerge, trazendo reflexões sobre a contribuição dos oceanos à economia e a necessidade de garantir a sustentabilidade ambiental e ecológica dos espaços marítimos. Se, por um lado, essa dinâmica instrumenta o uso dos recursos vivos e não vivos em benefício do desenvolvimento, por outro, provoca crescente preocupação com a saúde dos oceanos, principalmente para assegurar que as futuras gerações também possam usufruir os preciosos recursos neles existentes. Nesse cenário, um desafio que se afigura é a implantação de modelos de atividade econômica em arranjos produtivos (clusters), os quais podem servir como mecanismos catalisadores do desenvolvimento, constituídos por atores da cadeia produtiva relacionada às atividades no mar.
No Brasil, o maior desafio tem sido expressar, por meio de políticas públicas consistentemente concebidas, acompanhadas e avaliadas, esse entendimento sobre a importância estratégica do mar.
Passados 25 anos de sua última revisão, uma nova Política Marítima Nacional se apresenta como solução indispensável para que o País empreenda as transformações necessárias para a implementação de uma estratégia nacional para o mar – apresentando um modelo de desenvolvimento firmado no uso econômico e sustentável dos oceanos.
Entendendo a transversalidade, importância e complexidade do tema, a Marinha do Brasil propôs ao ministro de Estado da Defesa a criação de um grupo de trabalho interministerial, integrado por representantes de 13 ministérios, visando à reformulação da atual Política Marítima Nacional.
Os resultados concretos dessa política multissetorial serão vistos com a efetiva integração e o engajamento dos múltiplos atores, instituições e entidades públicas e privadas que atuam no mar ou dele se beneficiam. A participação da sociedade e dos diversos grupos de interesse envolvidos é primordial nessa construção.
Também merece destaque a nossa promissora Marinha Mercante. Ante o projetado cenário de crescimento da demanda pelo setor de transporte marítimo, que responde pela quase totalidade do comércio exterior do Brasil, faz-se mister dispor de tripulantes adequadamente formados e qualificados, de uma frota plenamente dimensionada para o atendimento daquela demanda, de uma infraestrutura portuária robusta e moderna, bem como de serviços compatíveis com os rígidos padrões internacionais de produção, transporte e regulação.
Por outro lado, o mar também pode ser via para ilícitos e ameaças, como pirataria, terrorismo e tráfico de drogas. Recentemente o Brasil foi alcançado por uma dessas ameaças, cujos efeitos transcenderam para outras esferas, como a econômica e a social: desde setembro vivenciamos uma severa agressão, com vários pontos do litoral nordestino atingidos por óleo bruto, decorrente de um crime ambiental.
A garantia da soberania nos nossos mares é, portanto, fundamental para o aproveitamento de suas potencialidades, o que reforça a necessidade de o País dispor de uma Marinha moderna e adequadamente equipada, compatível com a dimensão das águas jurisdicionais brasileiras e com a inserção política estratégica almejada pelo Brasil no cenário internacional. Por sua grande extensão, também é necessário dispor de sistemas de monitoramento e vigilância com alcance que permita identificar ameaças e situações que requeiram pronta resposta do Estado brasileiro.
Por fim, é importante ressaltar que o Dia Nacional da Amazônia Azul foi instituído com o propósito precípuo de darmos o primeiro e mais importante passo para a conscientização do povo brasileiro quanto ao imenso patrimônio existente em nossas águas, o qual, mesmo ainda incalculável, pertence ao Brasil e a todos os brasileiros.
FONTE: Folha de SP
FOTOS: Ilustrativas