Por Monica Giugliano
Quem vai decidir o futuro da Antártida? Como será esse futuro? O continente de superlativos estimula a imaginação dos povos, tem incitado nações de todo o planeta a buscar um lugar para chamar de seu nestes 13,6 milhões de quilômetros quadrados. Não importa que eles estejam cobertos por aproximadamente 25 milhões de metros cúbicos de gelo, volume suficiente para tapar todo o território brasileiro com uma camada de quase três quilômetros de espessura. Tampouco amedrontam as temperaturas que podem chegar a 80 graus centígrados negativos no inverno do Polo Sul. Haverá minérios? Petróleo ou outras fontes de energia? Quais riquezas esconde essa última fronteira a ser desbravada pelo homem? Esses recursos poderão ser aproveitados?
Quase 200 anos depois da descoberta do continente, sabe-se muito sobre a Antártida. Mas esse muito é ainda pouquíssimo. Entre as certezas, a unanimidade é que a maior riqueza mineral da Antártida consiste na reserva de 90% da água doce potável do mundo; nas possibilidades de pesquisas e estudos que podem revolucionar e transformar o que sabemos sobre o clima e sobre todas as formas de vida.
Três anos após perder a Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF) – destroçada por um incêndio em 2012 -, o governo brasileiro está na fase final da licitação para reconstruir a base científica. Embora as atividades na Ilha Rei George tenham sido interrompidas por alguns meses – módulos provisórios montados no mesmo local substituíram o prédio queimado -, as autoridades consideram que o Brasil deve assegurar o espaço e o poder de decisão que já conquistou no extremo sul do mundo.
“O Brasil desenvolve o Programa Antártico Brasileiro, Proantar, como uma política do Estado, focado no desenvolvimento de significativas pesquisas. Existe um firme propósito do governo federal de dar o apoio que se fizer necessário para que o Proantar continue exitoso. Isso se configura não só em termos políticos como orçamentários”, afirmou ao Valor o ministro da Defesa, Jaques Wagner.
A Marinha entrou na etapa final da licitação para reconstruir essa “casa”, a Estação Comandante Ferraz. A companhia chinesa Ceiec, que atua em mais de 120 países nas áreas de engenharia, defesa eletrônica e sistemas de segurança, propôs o menor preço: US$ 99,6 milhões. Portanto, como já fora qualificada tecnicamente, tem a maior chance de ficar com o contrato.
Os chineses já haviam vencido a licitação no começo do ano. Mas um mandado de segurança suspendeu o processo de escolha e a disputa recolocou no páreo o consórcio Brasil-Chile (Ferreira Guedes/Tecnofast) e a finlandesa OY FCR Finland. A licitação fixou o valor máximo em US$ 110,5 milhões (R$ 338,2 milhões) e a obra deverá ser executada em 540 dias corridos. Em meados de 2018, portanto, estima-se que esteja pronta.
A nova estação substituirá os módulos de emergência, onde cientistas e militares continuaram trabalhando. “Entendemos a nossa estação como a ‘casa de pesquisa do Brasil’ na Antártida e no Tratado Antártico. Só esse fato tem um forte simbolismo. A estação tem um significado geopolítico muito grande, pois materializa de forma viva a presença do Estado brasileiro na Antártida e no seu tratado”, disse Jaques Wagner.
O projeto executivo, escolhido em 2013 em um concurso promovido pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), não deverá ser alterado. Segundo o documento do Estúdio 41 (vencedor do concurso), o edifício principal da nova estação terá uma área total de 4.500 m2 e as unidades isoladas, como as torres de energia eólica e a área para helicópteros, somarão outros 500 m2. . Serão 18 laboratórios internos, além de 7 unidades isoladas para pesquisas de meteorologia, ozônio da atmosfera. Terá capacidade para abrigar 64 pessoas.
O Brasil chegou com atraso à Antártida e tem feito esforços para solidificar sua posição no continente. Foi somente a partir da década de 1970 que o governo passou a considerar mais objetivamente a importância de engajar-se em pesquisas na região. Em 1975, o país aderiu ao Tratado Antártico e, em 1982, começou o Proantar, que desenvolve atividades científicas na Antártida (estas um requisito para os países-membros signatários do documento com direito a voto nas decisões).
“A condição de nosso país de sétima nação mais próxima da região justifica plenamente as motivações geopolíticas, estratégicas e econômicas para os investimentos ali. Somos membros consultivos do tratado. Ainda não se encontrou uma fórmula de ocupar – se é que o continente será ocupado – ou de como explorar – se é que haverá alguma exploração. Mas, aconteça o que acontecer, o Brasil participará dessa decisão e sua posição é de que o continente é um patrimônio da humanidade e deve ser usado unicamente para pesquisas científicas que possam melhorar a vida no planeta”, afirma o almirante Marcos Silva Rodrigues, comandante da Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (Secirm).
No ano passado, somente a Marinha teve um custo de R$ 35 milhões para manter a operação logística que envolve a estação. Pouco menos que a metade disso – entre R$ 14 e 15 milhões – são gastos apenas com os navios. Em pesquisas, os investimentos têm sido da ordem de R$ 17 milhões, divididos entre vários organismos como o CNPq. “Esse continente poderá ser reclamado por quem aqui estiver. E o Brasil faz um esforço enorme para estar aqui. É preciso muita energia, preparo e força de vontade para permanecer aqui o ano inteiro, incluindo o inverno”, diz o comandante do NApOc (Navio de Apoio Oceanográfico) Ary Rongel, o capitão de mar e guerra Sergio Lucas da Silva, que deixou o cargo em abril, depois de dois anos na região.
Sete países reivindicam territórios na Antártida: Argentina, Austrália, Chile, Inglaterra, França, Noruega e Nova Zelândia. Porém, nenhuma dessas reivindicações tem reconhecimento internacional, o que faz da Antártida o único continente do mundo que não pertence a nenhum país. O Tratado Antártico se baseia em grandes princípios: a não militarização e a não nuclearização do continente, liberdade de pesquisa científica, proteção do ambiente e congelamento de qualquer reivindicação territorial. O documento proíbe, principalmente, qualquer tipo de mobilização e os testes com armas de todo tipo, inclusive as nucleares, bem como quaisquer medidas de caráter militar. Além disso, congela qualquer reivindicação territorial no continente branco e obriga os membros a colaborar entre si.
Quando o tratado entrou em vigor estava assinado por 12 países – África do Sul, Argentina, Austrália, Bélgica, Chile, Estados Unidos, Japão, Noruega, Nova Zelândia, Reino Unido e União Soviética (e depois pela Rússia). O documento entrou em vigor em 23 de junho de 1961. Atualmente, tem 52 Estados-membros. O governo americano, que estimulou a confecção do documento para precaver-se das ambições soviéticas na região em plena Guerra Fria, é o depositário do tratado.
Em 1991, um protocolo de proteção ambiental vinculado ao tratado foi assinado em Madri. O documento, que passou a se chamar Protocolo de Madri, proíbe a mineração e a exploração de petróleo no continente gelado durante 50 anos. Textos anexos preveem a proteção da flora e da fauna, o controle do turismo, a prevenção da contaminação marinha e a eliminação dos dejetos.
Desde que aderiu ao tratado, o governo brasileiro tem buscado manter os investimentos amparado na tese de que o país só alcançará um protagonismo antártico na medida em que mantiver um programa científico de vanguarda, bem estruturado gerencial e financeiramente. Um grande passo nesse sentido foi dado com a elaboração do plano de ação estratégico de pesquisa na Antártida-2013/2014.
“Hoje não basta ir à Antártida e ter um programa mal financiado, com metas de curto prazo. Há que se ter visão estratégica e tentar atrair os melhores cientistas para que esse programa seja forte. Então, esse programa tem um viés político. Não podemos negar a parte política na ação científica do Brasil na Antártida. Do ponto de vista da geopolítica, é até uma questão de ‘softpower’. É uma maneira de mostrar a envergadura do país dentro desse sistema. Na Antártida se medem forças com muita sutileza”, diz o cientista Jefferson Cardia Simões, diretor do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador-geral do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera (INCT da Criosfera).
O plano tem cinco programas temáticos de pesquisa que tratam da criosfera; ecossistemas antárticos e suas conexões com a América do Sul; mudanças climáticas e o oceano austral; geodinâmica e história geológica da Antártida; dinâmica da alta atmosfera na Antártida. “Propomos uma visão integrada, sinérgica, que otimize recursos humanos e financeiros”, explica Simões. Cientistas como ele têm feito questão de ressaltar a importância da Antártida, principalmente considerando a proximidade do continente com o Brasil: “Se não podemos nos alijar de processos que ocorrem do outro lado do mundo, muito menos dos que se passam aqui. Porto Alegre está mais perto da Antártida do que de Boa Vista. Isso é falta de olhar o mundo de maneira correta”.
Um exemplo clássico é o das frentes frias – quando chegam à Amazônia são friagens – chamadas de ar polar (subpolar, na verdade) que se formam no oceano austral, atravessam a América do Sul e vão até o sul da Amazônia. A ação delas pode fazer a temperatura cair 10 graus, 15 graus em dois dias. “Muitos não fazem ideia do impacto socioeconômico disso. Mas só vamos conseguir melhorar a previsão meteorológica no Brasil se incluirmos a Antártida”, alerta Simões. Ele cita o exemplo do aumento da frequência das frentes polares na década de 70, que liquidou as plantações de café em parte do Paraná.
Simões foi o primeiro brasileiro a chegar ao Polo Sul e é um cientista reconhecido internacionalmente em sua área, a glaciologia. As pesquisas nesse setor são consideradas de extrema relevância porque mostram como a ação do homem, ao longo dos séculos, tem modificado as condições do planeta. “O gelo e a neve da Antártida preservam o registro da química atmosférica dos climas passados. É por isso que o programa antártico brasileiro, a partir dos últimos cinco anos, tem expandido sua área geográfica de atuação. Antigamente, era restrito ao que chamamos de Antártida Marítima, o arquipélago Shetland do Sul e o norte da península antártica, onde as temperaturas médias oscilam em torno de -1° C, -2° C, -5° C, ao norte do círculo polar. Muito já foi feito ali e ainda há muito por fazer. Mas precisamos avançar”.
FONTE: Valor Econômico
Solução:
Criação de uma unica estação para pesquisa, que abrigue todos os cientistas dos países membros, financiada pelos países membros, sendo as descobertas compartilhadas a todos, a exemplo da estação espacial internacional.
Seria mais barato pra todo mundo…
Solução
O continente Antártico deverá ser dividido proporcionalmente aos 5 continentes de acordo com as áreas dos seus territórios. Os países de cada continente formará um consórcio para explorar os recursos.