Historiadora canadense, porém, vê semelhanças com a situação atual e adverte que o mundo deve estar alerta para os riscos da corrida armamentista, da mudança climática, das grandes epidemias e dos 51 milhões de refugiados.
LONDRES- Uma das historiadoras mais respeitadas, a canadense Margaret MacMillan vê semelhanças quase aflitivas – para quem a ouve – entre o mundo atual e aquele de 100 anos atrás, quando o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando por terroristas em Sarajevo desencadeou a primeira grande guerra mundial. Os Bálcãs de antes poderiam perfeitamente ser o Oriente Médio ou os mares do Sul da China de hoje, segundo ela. Cercada por livros em seu gabinete na Universidade de Oxford, onde passa a maior parte do tempo, disse ao GLOBO que os riscos não podem ser descartados. Mas não está completamente pessimista. Para ela, o mundo de hoje tem instituições internacionais mais fortes e um sentimento de Humanidade compartilhado que podem evitar uma nova grande guerra.
“Então, vamos tentar ter confiança nisso…”, disse, sorridente, a autora do livro “A guerra que acabou com a paz: como a Europa trocou a paz pela primeira guera mundial”.
A senhora diz o mundo está parecido com o do pré-I Guerra. Quais as semelhanças?
Ambos são muito globalizados. O período de 1914 já era, com a disseminação das comunicações, dos telégrafos, das ferrovias, o movimento de povos pelo planeta, com os europeus partindo para o novo mundo. Os eventos em uma parte do mundo afetavam as outras. Havia uma expansão da prosperidade, mas a divisão era muito desigual. Havia também os movimentos de trabalhadores, os movimentos revolucionários. Havia ainda um medo exagerado, talvez como agora, do poder dos terroristas, de ataques.
O nacionalismo também se repete: nos Bálcãs, ou na Escócia, logo ali, querendo deixar o Reino Unido, e em partes da Ásia, no Japão. E uma força de partidos de direita, como o Tea Party ou o Ukip aqui no Reino Unido. Não se trata mais de partidos de direita tradicionais, mas anti-elite, novas organizações política. Os protestos eram mais organizados em 1914 do que agora. Os sindicatos estavam em ascensão e agora estão em queda. Mas há greves na China. Há problemas que se repetem, embora não necessariamente nas mesmas partes do mundo. As pessoas também estão pensando de maneira mais internacional.
As semelhanças indicam riscos similares de uma guerra hoje?
Seríamos bobos se não tivéssemos cautela, ou não pensássemos em riscos. Temos que estar preocupados. Há o risco da corrida armamentista, da mudança do clima, das grandes epidemias, vírus. Uma nova guerra mundial não é provável, porque tivemos duas e sabemos o que pode acontecer, ainda mais agora que as armas têm uma capacidade de destruição muito maior. Poderia ser o fim de tudo. Uma semelhança interessante são as partes do mundo em que há problemas e disputas locais que ameaçam envolver países (poderes) de fora. Antes de 1914 eram os Bálcãs; hoje poderiam ser, por exemplo, o Oriente Médio ou os mares do Sul e do Leste da China.
Conflitos como o da Ucrânia não significam que a tensão pode estar no ar?
Os países do Ocidente não souberam lidar com a Rússia corretamente desde o fim da Guerra Fria. É um país orgulhoso. O discurso de Putin por conta da anexação da Crimeia mostra que há muito ressentimento e orgulho ferido.
Ele menciona o Kosovo, em que o Ocidente agiu exatamente da mesma maneira. Tudo isso importa. E agora quer desestabilizar a região. Uma das coisas que mais me assustam hoje são as estatísticas. Há 51 milhões de refugiados no mundo, muito mais do que em qualquer momento de guerra.
Como a senhora mesma diz: não aprendemos com a I Guerra?
O aprendizado aconteceu de maneira diversa no mundo. A Europa aprendeu, prova disso é a importância da União Europeia. Mas isso é algo que as gerações mais jovens, que não viveram a guerra diretamente, já não sabem valorizar.
A senhora compara as turbulências nos Bálcãs, que acabaram por desencadear a Primeira Guerra, ao Oriente Médio. Há riscos semelhantes?
O perigo sempre depende de como os poderes de fora lidam com a situação, disso depende o risco. Cada um tinha os seus interesses nos Bálcãs, daí a importância que ganhou. O Oriente Médio é parte problemática do mundo, com países que podem levar suas forças para lá. Há interesses na Síria, no Iraque. Qualquer lugar pode oferecer risco.
A China, com a militarização e os problemas no mar do Sul e do Leste, é um exemplo. O Japão também vem se movimentando com investimentos militares. Os Estados Unidos têm um acordo de defesa com o Japão, se a China e o Japão se desentendem.
Mas o mundo já não está dividido nas mãos de algumas potências como cem anos atrás…
O mundo está mais multipolar do que naquela época. Acho que podemos ver agrupamentos mais regionais, com potências regionais. A China pode, ou não, tornar-se a potência hegemônica no lugar dos Estados Unidos. Mas pode não querer sê-lo, ou não ser capaz.
Se no mundo globalizado de 1914 já havia tantos riscos, hoje, com a internet, usada para promover protestos pacíficos e a propaganda jihadista, eles não são potencializados?
A internet é neutra. Mas ajuda a pôr em contato pessoas do mal. Pode, sim, servir de combustível para ações do mal. Mas também pode ser usada para o bem, para caridade. Os governos já perceberam a importância e o poder da rede, e estão tentando usá-la a seu favor. Sabem que as pessoas usam a internet para atrair uma audiência cada vez maior.
Há uma corrida armamentista no mundo. E não é só em países como Irã, ou Síria. EUA e o Reino Unido gastam bilhões. Não é uma ameaça?
No caso britânico, é mais uma ressaca imperial. Tem valor simbólico. Para que precisa disso tudo? Os EUA também continuam se armando. Israel não diz ter armas nucleares, mas todos sabem que sim. Tem o Paquistão, uma ameaça no Irã. A Ucrânia desistiu em troca de integridade territorial quando se tornou independente da URSS. A proliferação de armamentos de massa é um grande risco.
A senhora diz que a Primeira Guerra aconteceu por um conjunto de acidentes e decisões tomadas pelos líderes da época. Que acidentes podem acontecer hoje?
Os chineses com seus navios de guerra, por exemplo, podem esbarrar em uma embarcação filipina ou num barco pesqueiro japonês. Tudo isso por engano. A Coreia do Norte agir de maneira imprudente, o que não é impossível. Se o Isis resolver atacar o Irã& Não podemos descartar nada. O assassinato de Francisco Ferdinando foi um acidente. Os terroristas acharam que, matando o arquiduque, as coisas automaticamente se resolveriam. Não previram os desdobramentos. Nunca pensaram numa guerra global. Faz parte da natureza humana ter problemas. Sempre os teremos de uma maneira ou de outra.
FONTE: O Globo – Vivian Oswald
Concordo em partes minha cara. Oriente Médio é parte
problemática do mundo, é claro que não o correto seria vc dizer assim :os americanos é parte problemática do mundo. Os policiais do mundo gostam de se intrometer em tudo que ocorre mundialmente….. Estamos por um fio dos americamos dispararem bombas na coréia norte ,na rússia,venezuela,irã,argentina, tem + é que não me lembro agora kkk.
Senhora Margaret MacMillan, Deus te ouça. E que os aparatos bélicos que tanto gostamos fiquem só no campo da dissuasão, que jamais tenham de ser colocados a prova pois o resultado seria apenas morte, fumaça e escombros, acredito que ninguém em sã consciência deseje isso.
Como uma vez disse Einstein: ” Eu não sei como será a terceira guerra mundial, mas sei como será a quarta; com paus e pedras”
Respeito a autoridade de conhecimento da historiadora , mas achar que não haverá uma outra guerra em escala global é uma besteira total. Não se pode utilizar desse tipo de pseudo-determinismo histórico. Quem diria que a Rússia, combalida e quebrada nos anos 90 após sair da União Soviética, poderia em tão pouco tempo se rearmar, investindo pesadíssimas somas na pesquisa e desenvolvimento de novos armamentos, a esquadra vai ser modernizada, a força aérea também, novos mísseis saem do forno, encomendam navios classe Mistral à França, partem para cima da Ucrânia ? Quem garante que os países árabes não vão conseguir armas nucleares e em seu fanatismo ou ultra conservadorismo ao estilo Mahmoud Armadinejad da vida, não provocarão uma catástrofe ? Nada pode ser excluído, pode não ser agora, pode não ser daqui ha 40 anos, mas um dia ela ocorrerá.
Desculpe, meu caro Luiz: a última frase saiu mal.
“…, vejo essas chamadas de ‘possibilidade’ de guerra, na mídia de hoje como sensacionalismo como as manchetes típicas da chamada imprensa marrom, representado pelos tabloides ingleses.”
Particularmente também não acredito numa guerra de escala mundial, pois não entendo como nessa onda de comparações com a situação pré-I Guerra Mundial que vemos na mídia, nenhum historiador ou think tank destaque a diferença óbvia da situação de hoje para com a vivida há 100 anos atrás: que hoje os ditos ‘inimigos’, China e EUA (aqueles que todos imaginam que seriam os potenciais candidatos a se engalfinharem numa guerra) possuem uma fortíssima relação comercial onde ambos tiram lucros imensos de parte a parte, coisa que não existia um século atrás, com uma Alemanha sedenta por procurar colônias quando países-colonizadores como Inglaterra e França já haviam ‘loteado’ entre si a África e a Ásia, deixando a nova potência da época, a Alemanha prejudicada na economia, visto que o colonialismo era necessário para se desenvolver economicamente então, como pra se buscar matéria-prima.
No fundo, guardadas as diferenças, vejo essas chamadas de ‘possibilidade’ de guerra na mídia de hoje como sensacionalismo como a chamada imprensa marrom, representado pelos tabloides ingleses,