Por Cap Bruno Trentini Lopes Ribeiro
A crescente ameaça nos conflitos atuais proporcionada pelos Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotados (SARP), popularmente conhecidos como Drones, voltou os olhos do mundo para a necessidade de desenvolvimento bélico e doutrinário de meios capazes de se contraporem a tais equipamentos. O emprego de SARP em conflitos não é recente, muitos são os exemplos de uso, principalmente por parte das grandes potências mundiais, de equipamentos para levantamento de inteligência e ataques estratégicos em conflitos como a Guerra do Iraque ou os combates na Síria. Contudo, a atual situação traz o aumento da capacidade tecnológica ao mesmo tempo em que os equipamentos ficam menores como fatores diferenciais, que, por sua vez, exigem novas formas de abordagem dos sistemas de defesa dos exércitos.
Contrapor-se a um SARP, como o RQ-4 Global Hawk, produzido pela empresa americana Northrop Grumman, não difere dos modelos doutrinários utilizados na defesa antiaérea contra ameaças tradicionais, como caças e bombardeiros, havendo apenas a peculiaridade da necessidade de radares com maior cobertura e armamentos com maior alcance, como sistemas de média e grande altura/médio e grande alcance. Entretanto, o atual uso de SARP produzidos para emprego civil e de SARP descartáveis, como os equipamentos fabricados com papelão e empregados na Guerra da Ucrânia, traz a necessidade de atualizar o funcionamento da estrutura sistêmica de defesa antiaérea. Essa atualização não significa abandonar ou modificar o modelo já existente, mas agregar novas capacidades e visualizar como essas serão empregadas de forma integrada e harmônica dentro da sistemática de defesa antiaérea.
Em termos de defesa antiaérea brasileira, observa-se que a estrutura capitaneada pelo Comando de Defesa Antiaérea do Exército (Cmdo DAAe Ex) e executada pelos diversos Grupos de Artilharia Antiaérea (GAAAe) e Baterias de Artilharia Antiaérea (Bia AAAe), espalhados pelo território nacional, é eficaz contra essa ameaça. A capacidade de alguns dos armamentos utilizados pelo Exército Brasileiro como o sistema de mísseis RBS70 NG e a Viatura Blindada de Combate Antiaérea Gepard, a qual possui dois canhões 35 mm, garantem uma eficaz proteção das tropas e instalações contra SARP com baixíssima capacidade de reflexão das ondas radares, como é o caso, por exemplo, do SARP civil Matrice, produzido pela empresa DJI, que, de acordo com a classificação utilizada pelo Exército Brasileiro, pertence à categoria 1. Adestramentos desenvolvidos pela Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea (EsACosAAe) mostraram na prática a eficácia do material RBS70 contra alvos aéreos pertencentes à categoria 1, assim como diversos outros exemplos de utilização da viatura Gepard contra o SARP Shared, de origem iraniana, durante a Guerra da Ucrânia, também corroboram o emprego desse armamento. Entretanto, observa-se que a defesa contra aeronaves menores, classificadas na categoria 0, utilizadas principalmente para realizar reconhecimentos em níveis táticos e ataques pontuais a equipamentos e pessoal específico, requer um incremento de capacidades para a defesa antiaérea, visto que a possibilidade de detecção e de engajamento desses SARP fica comprometida pela pequena reflexão das ondas incidentes em sua fuselagem.
Atualmente, a solução encontrada para a contraposição a essas pequenas aeronaves é o uso de equipamentos de guerra eletrônica capazes de emitir ondas direcionais que interrompem a ligação entre o operador e o SARP, podendo também interromper o sinal GPS do equipamento. A eficácia de tais materiais já é de conhecimento universal, visto que sua tecnologia vem sendo aperfeiçoada constantemente devido ao emprego em grandes eventos como os Jogos Olímpicos ou a posse de líderes de governo. Entretanto, o que deve ser analisado é como empregar tais instrumentos, os quais interferem no espectro eletromagnético da região em que operam, durante um conflito. Entende-se que nas condições de defesa contra SARP, constituindo, assim, um equipamento direcionado à neutralização de vetores aéreos hostis, esses sistemas de guerra eletrônica devem ser inseridos na coordenação, já existente, da defesa antiaérea destacada no terreno. Tal situação reveste-se de vital necessidade, pois a emissão eletromagnética gerada pelo equipamento não pode alterar ou dificultar o funcionamento de qualquer um dos subsistemas constituintes da defesa antiaérea. Dessa feita, realizando uma análise paralela e, utilizando o fundamento da defesa em profundidade presente na artilharia antiaérea brasileira, tem-se que esses equipamentos de GE constituiriam uma camada de defesa mais aproximada, ou seja, como seu raio de ação é relativamente curto, cerca de 500 metros quando realiza interferência na ligação rádio entre o operador e o equipamento, esses instrumentos realizariam a proteção mais aproximada das tropas e de instalações de interesse, sendo, dessa forma, controlado e comandado a partir do Centro de Operações Antiaéreas mais próximo, no qual estaria destacado um oficial de ligação das tropas de guerra eletrônica.
Outra solução muito empregada atualmente para desencadear uma defesa eficaz contra os SARP é a capacitação e o maior emprego dos postos de vigilância. O vigia antiaéreo, como antigamente se denominava, ou postos de vigilância são equipes destacadas em pontos estratégicos do terreno, geralmente próximo das principais rotas utilizadas pelas aeronaves para atacar, e que tem por finalidade alertar as defesas antiaéreas com tempo hábil sobre uma possível incursão inimiga. Essa doutrina durante anos pareceu ultrapassada, entretanto, hoje observamos que a manutenção dos postos de vigilância como sensores do subsistema de controle e alerta na defesa antiaérea foi crucial para que consigamos, atualmente, nos contrapor às ameaças representadas pelos novos SARP. Nos conflitos como a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, podemos observar o incremento do números de equipes de postos de vigilância destacadas por ambos os lados, principalmente para a proteção de tropas contra ataques de drones civis militarizados, os quais, muitas vezes, não são detectados pelos radares em tempo hábil.
Por fim, entende-se que o mundo já observa os SARP como uma grande ameaça nos campos de batalha e que, objetivando aprimorar sua doutrina e aumentar suas capacidades, a Artilharia Antiaérea Brasileira deve, juntamente com os elementos de Guerra Eletrônica do país, trabalhar de forma concisa na busca do incremento do sistema de defesa antiaérea já em operação pela Força Terrestre, buscando, assim, garantir a defesa contra qualquer modelo de ameaça aérea existente.
FONTE: EBLOG
Sobre o autor: O Cap Bruno Trentini Lopes Ribeiro é Oficial de Artilharia oriundo da Academia Militar das Agulhas Negras. Possui os seguintes estágios, especialização e cursos: Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais de Artilharia, Curso de Artilharia Antiaérea para Oficiais, Curso Especial de Defesa Antiaérea (Marinha do Brasil), Estágio de Artilharia e Defesa Antiaérea e Estágio de Operações Urbanas. Foi instrutor da Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea (EsACosAAe) no biênio 2022-2023. Atualmente serve no 1º Grupo de Artilharia Antiaérea – Rio de Janeiro – RJ.
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Bom artigo. Temos que estudar o planejamento da colocação das Turmas de P Vig para fazer frente aos drones, pois diferente das aeronaves, talvez não sigam o que constam em nossos manuais como rotas prováveis. Nesse sentido, como dificilmente vão ser pegas por radar, também não podemos usar o critério de zonas de sombra.
O “drone” ou SARP iraniano citado no terceiro parágrafo do texto se chama SHAHED e não Shared. Sugiro a edição para corrigir a informação imprecisa.
A defesa antiaérea brasileira frente às novas ameaças representadas pelos atuais Sistemas de Aeronaves Remotamente Pilotados: inexistente.
Novas ameaças e ameaças antigas, não temos uma defesa antiaérea, e isso é bastante vergonhoso para nós…