Por Sabrina Lorenzi e Leonardo Goy
RIO DE JANEIRO/BRASÍLIA, 9 Set (Reuters) – A denúncia de espionagem na Petrobras pelo governo dos Estados Unidos gerou preocupações de que os norte-americanos tenham tido acesso à estratégia da estatal brasileira no leilão do pré-sal, o que poderia afetar os lances realizados pelas companhias na licitação da reserva de Libra, disse uma fonte do governo brasileiro nesta segunda-feira.
Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a denúncia de espionagem não afeta o cronograma nem as regras do certame, uma vez que as informações sobre Libra, a maior área exploratória de petróleo do país, já estão disponíveis para as empresas interessadas no leilão.
O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, confirmou que o cronograma do primeiro leilão do pré-sal sob o sistema de partilha está mantido e que as regras da licitação, prevista para 21 de outubro, não serão alteradas.
“A Petrobras vai emitir uma nota hoje (segunda-feira) sobre o assunto. Quanto à questão política, só o Palácio do Planalto e o Itamaraty”, disse Lobão a jornalistas, após participar de solenidade de sanção da lei que destina os recursos dos royalties do pré-sal para a saúde e a educação.
O governo norte-americano espionou as redes de computadores de empresas como Petrobras e Google, de acordo com documentos vazados da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA, na sigla em inglês) exibidos pela Rede Globo.
Em nota divulgada no domingo, o diretor do Departamento dos Serviços de Inteligência dos EUA, James R. Clapper, afirmou que não é segredo para ninguém que o país coleta informações sobre questões econômicas e financeiras, especialmente para proteger cidadãos norte-americanos e os interesses dos aliados da nação. Mas ele ressaltou que o governo não compartilha segredos comerciais com companhias.
A reportagem do programa Fantástico, da Globo, não informou quando a suposta espionagem aconteceu, quais dados podem ter sido obtidos ou o que a agência estava buscando.
A fonte do governo ouvida pela Reuters, que falou sob condição de anonimato, disse que empresas norte-americanas poderiam usar informações confidenciais da Petrobras para preparar suas ofertas no leilão. Isso reduziria a concorrência e os lances ofertados ao governo brasileiro pela exploração da área de Libra, acrescentou.
O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa concorda que, se realmente ocorreu espionagem envolvendo Libra, seria mesmo um risco ter os lances do leilão influenciados por tais informações.
“A história do petróleo sempre mostra que desde sempre ele é muito disputado pelos países”, disse Costa, que atualmente é consultor. “Libra é uma área que não se tem igual no mundo, nesse tipo de leilão, aberto a outras empresas, é algo muito valioso”, acrescentou, ponderando que é preciso antes de tudo confirmar se realmente houve espionagem.
Segundo ele, a diretoria da Petrobras nunca desconfiou de espionagem, porque sempre confiou em uma série de sistemas de proteções de que dispõe.
REGRAS
Pelas regras da partilha, vencerá o leilão o consórcio que apresentar a maior parcela de óleo destinada à União. Mesmo que não participe do consórcio vencedor, a Petrobras será, por lei, operadora de Libra e terá participação mínima de 30 por cento da área.
Como a Petrobras será a operadora de qualquer maneira e a partilha reserva ao governo poderes de decisão, as bases do leilão não têm como ser afetadas, afirmou uma segunda fonte, também pedindo para não ser identificada.
“É diferente de uma reserva em que não se sabe o que há. Nessa, a reserva já é estimada e, além disso, a operação será pelo sistema de partilha, com mais poderes exercidos pelo governo”, disse.
Libra será leiloada em um único bloco, porque o governo brasileiro teme que uma divisão em lotes poderia criar impasses jurídicos, com a possibilidade de um campo vazar óleo para o outro e a necessidade de acordos de unitização entre empresas, um imbróglio que ocorre quando há interligação entre reservatórios.
O programa Fantástico obteve as informações sobre a espionagem dos EUA na Petrobras através de Glenn Greenwald, repórter norte-americano do jornal The Guardian que vem trabalhando junto com o ex-analista da NSA Edward Snowden para expor os programas de espionagem dos EUA no Brasil e no exterior.
A denúncia sobre a Petrobras pode complicar ainda mais um impasse diplomático tenso entre os EUA e o Brasil provocado pela suposta espionagem da NSA às chamadas telefônicas e emails da presidente Dilma Rousseff.
ROAD SHOW
A ANP informou que concluiu no fim de semana um roadshow internacional para divulgar a primeira rodada do pré-sal. A equipe da ANP apresentou em Cingapura, Londres, Houston, Tóquio e Pequim informações sobre a área de Libra.
Segundo a assessoria de imprensa, a diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, disse a potenciais investidores que Libra é uma oportunidade única no mundo, tanto pelo volume estimado –de 8 bilhões a 12 bilhões de barris de óleo– quanto pela quantidade de informações disponíveis, pois já existe importante descoberta na área, com óleo produzido e analisado.
Se empresas norte-americanas venham a querer se beneficiar de informações obtidas por espionagem, nada mais justo de que espresas daquele país sejam proibidas de participar do leilão, e que se use contra elas o argumento da ilicitude de espionagem para vetar a concorrência das mesmas.
Não é mais ou menos esse argumento que a Presidente Dilma está usando para tirar a preferencia de aquisição dos aviões da Boeing do programa F-X2?