Por DANIELA KRESCH
“É falta de visão geopolítica e de objetividade de ações. Para as Forças Armadas, ficou uma situação muito sensível, pois nossa parceria com empresas israelenses de alta tecnologia é muito grande. Israel é um dos poucos países com transferência total de ‘know how’ total, inclusive com os ‘keys codes’ [códigoschave] dos armamentos”, afirmou o militar à Folha.
Desde agosto, o governo brasileiro ignora a indicação do argentino naturalizado israelense Dayan, 60, como o embaixador designado por Israel.
O motivo seria o fato de Dayan ter presidido, de 2007 e 2013, o Conselho Yesha, que representa 500 mil colonos israelenses na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental (o Brasil se opõe à existência desses assentamentos).
Além disso, a presidente Dilma Rousseff teria ficado irritada com o fato de que a nomeação de Dayan foi anunciada primeiro no Twitter de Netanyahu e não diretamente ao Itamaraty. Segundo o membro das Forças Armadas, só a França repassa e revela tecnologia de maneira tão aberta ao Brasil, mas a um “custo três vezes maior”.
Um dos contratos em andamento, atualmente, prevê equipar as torres de tiro do VBTPMR Guarani (veículo blindado de transporte de pessoal) com canhões de 30mm de uma das maiores empresas de armamento israelense. Também há uma latente cooperação de segurança entre os dois países às vésperas dos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016.
DISCUSSÃO
Para tentar reverter o problema diplomático em relação a um país considerado aliado, alguns congressistas brasileiros consideram agir em defesa da nomeação de Dani Dayan. Mas ainda não há consenso sobre se uma campanha ajudaria ou não a desatar o nó ou apenas aprofundaria o impasse.
Em novembro, uma lista de 200 assinaturas de judeus contra a nomeação de Dayan foi entregue pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS) à Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara. Há três meses, dezenas de parlamentares de partidos de esquerda assinaram uma petição contra a indicação.
Em Israel, há muita discussão de bastidores sobre o assunto. Alguns membros da comunidade diplomática defendem que Israel entenda a mensagem do Itamaraty, aponte outro nome para a embaixada em Brasília e indique Dayan para outro cargo no exterior. Outros acreditam que, pelo contrário, a chancelaria israelense deve insistir na nomeação —pelo menos pelos próximos meses— por uma questão de princípios.
“O Brasil está tratando Dayan como um cidadão de segunda classe por causa de onde ele mora e do que ele pensa. Mas ele foi indicado por um governo eleito democraticamente. Irá representar esse governo, que defende a solução de dois Estados para dois povos”, disse um diplomata à Folha.
NAZISMO
Na edição de domingo (20), o maior jornal israelense, o “Yedioth Ahronoth”, publicou partes de um discurso feito no Congresso Nacional pelo deputado Marun no dia 6 de agosto, no qual ele compara a nomeação de Dani Dayan para a embaixada em Brasília como o envio, pela Alemanha, de um representante que tivesse trabalhado num campo de concentração nazista.
“Seria a mesma coisa que a Alemanha enviasse ao Brasil como embaixador um ex-dirigente de campo de concentração, que o Chile enviasse um ex-carcereiro do Estádio Nacional, que a África do Sul enviasse um ex-torturador do Apartheid”, afirmou Carlos Marun, que disse à Folha ser a favor da solução de dois Estados na região.
Em sua conta no Twitter, o caçador de nazistas americano Efraim Zuroff afirmou se tratar de uma “comparação ofensiva” e que Marun deveria receber “uma lição de História”.
A parlamentar israelense Ksenia Sveltolva, 38, da legenda de centro esquerda Campo Sionista (que inclui o Partido Trabalhista) também reclamou da referência. “Não concordo com tudo que Dani Dayan pensa, mas a comparação com um guarda nazista mostra ignorância e antissemitismo.
Trata-se de um embaixador qualificado, que fará um trabalho profissional, indicado oficialmente pelo Estado de Israel. Quem fala coisas desse tipo contra ele coloca uma mancha no relacionamento entre Brasil e Israel”.
Até esse incidente, o relacionamento entre Israel e Brasil começava a melhorar depois da crise diplomática de 2014, quando o governo Dilma chamou de volta, para consultas, o embaixador do Brasil em Tel Aviv para protestar contra a guerra entre Israel e o grupo islâmico Hamas, da Faixa de Gaza. Na ocasião, o ex-porta voz do escritório do primeiro ministro, Yigal Palmor, chamou o Brasil de “anão diplomático” por causa da decisão de Dilma.
FONTE: Folha de São Paulo