Marinha do Brasil se adapta para melhor enfrentar as novas ameaças

Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Junior - FOTO: Tatiana Pimentel

Por Marcos Ommati

Desde o dia 9 de janeiro de 2019, a Marinha do Brasil (MB) tem um novo comandante. Ao assumir a nova função, o Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Junior disse que sua prioridade fundamental à frente da MB é a capacitação de pessoal. Na ocasião, o Alte Esq Ilques destacou ainda a importância de dar continuidade às ações em curso e a necessidade de aprimorar a constante interação entre as Forças. Para falar sobre os principais desafios da MB, o programa do submarino nuclear e o exercício militar UNITAS 2019, entre outros temas, Diálogo conversou com o AE Ilques em seu escritório localizado no Comando da Marinha, em Brasília.



Diálogo: Quais são seus principais desafios à frente da Marinha do Brasil?

Comandante da Marinha do Brasil, Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Junior: Nos oceanos e nas hidrovias temos a sobrevivência e a prosperidade do nosso país, por onde trafegam os produtos e serviços vitais para o Brasil. Dessa forma, torna-se necessário aprimorar, continuamente, a integração das atividades da MB relacionadas à proteção marítima com as de segurança da navegação, a salvaguarda da vida humana no mar e a preservação ambiental. Nosso maior desafio é manter o desenvolvimento de nossos projetos estratégicos, como o Programa Nuclear da Marinha, o Programa de Desenvolvimento de Submarinos e o projeto dos novos navios da Classe Tamandaré, além de fortalecer a mentalidade marítima em nossa sociedade.

Diálogo: Que projetos principais o senhor pretende implementar na MB durante a sua gestão?

Alte Esq Ilques: A continuidade dos programas estratégicos é uma das nossas prioridades. Entre eles, destacam-se: Pessoal Nosso Maior Patrimônio; Programa Nuclear da Marinha (PNM); Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB); Construção do Núcleo do Poder Naval, onde constam a obtenção dos navios da Classe Tamandaré e a construção de navios patrulha; Programa de Capacidade Operacional Plena; Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul; e Segurança da Navegação. Esses programas permitem a autonomia e perenidade ao ciclo evolutivo tecnológico, fortalecendo a Base Industrial de Defesa, gerando empregos diretos e indiretos, promovendo o desenvolvimento nacional, estimulando os segmentos associados à ciência, tecnologia e inovação, e fomentando a indústria naval brasileira.

Diálogo: O Brasil, como outros países da América Latina, está passando por um processo de adaptação em suas Forças Armadas para que apoiem cada vez mais esforços como o combate ao crime organizado transnacional e o terrorismo. Qual a participação da MB nestes esforços?

Alte Esq Ilques: De uma forma geral, o emprego das Forças Armadas em repressão a crimes comuns ocorre com fundamento nas atividades de Garantia da Lei e da Ordem, conforme previsto na Constituição Federal. A MB realiza, rotineiramente, patrulhas navais com os seus navios nas águas jurisdicionais brasileiras, inclusive nos rios da região Amazônica e do Pantanal, consolidando a sua contribuição no policiamento ostensivo marítimo preventivo e repressivo, fiscalizando e implementando as leis, os regulamentos, os tratados, as convenções e os atos internacionais ratificados por nosso país. Além disso, a MB realiza o patrulhamento contra delitos transfronteiriços e ambientais, cooperando com os órgãos competentes. Adicionalmente, temos navios e helicópteros de prontidão nas sedes dos Distritos Navais, que podem ser acionados a qualquer momento para o cumprimento dessas tarefas, assim como grupos de operações especiais, com capacidade de serem rapidamente deslocados para qualquer localidade do território nacional.

Diálogo: Há ações neste sentido que envolvam parcerias com países amigos?

Alte Esq Ilques: O Brasil participa, por exemplo, do Grupo de Trabalho dos Oceanos Pacífico e Índico sobre o Tráfego Marítimo (PACIOSWG, em inglês), que promove a troca de informações e acompanha o desenvolvimento da Doutrina de Controle Naval do Tráfego Marítimo (CNTM) da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), no âmbito das marinhas dos países que o compõem. Dez nações fazem parte do grupo atualmente, além do Brasil: África do Sul, Austrália, Canadá, Chile, Cingapura, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Nova Zelândia e Reino Unido. Os pontos considerados mais sensíveis são as chamadas novas ameaças ao tráfego marítimo. Entre elas, se encontram a pirataria, o terrorismo, os acidentes ambientais, o controle de epidemias e doenças infecto contagiosas, a imigração e a pesca ilegais.

Diálogo: Qual será a participação do Brasil na UNITAS 2019? Quais os países participantes?

Alte Esq Ilques: A UNITAS é um exercício marítimo multinacional que tem como propósito promover a interoperabilidade entre as forças regionais. O exercício ocorre anualmente, desde 1959, e esta será a 60ª edição. A operação é dividida em duas fases, Pacífico (PAC) e Atlântico (LANT). Para o corrente ano, o Chile será o país anfitrião da UNITAS PAC e o Brasil, da UNITAS LANT. O Brasil, como país anfitrião da UNITAS LANT LX 2019, é o responsável pelo planejamento e execução da operação. O Comando da 2ª Divisão da Esquadra foi designado para desempenhar essas tarefas e exercer o comando da Força-Tarefa Multinacional, que será estabelecida. Os países confirmados são Argentina, Brasil, Colômbia, Equador, Estados Unidos, Namíbia, Paraguai, Peru e Portugal. A Operação UNITAS ocorrerá na área marítima adjacente ao estado do Rio de Janeiro e contará com a participação de 3.500 militares. A edição de 2019 da UNITAS LANT ocorrerá em paralelo à UNITAS AMPHIBIOUS, que contemplará um exercício de operação humanitária, por meio de uma projeção anfíbia.

Diálogo: Há planos de aumentar exercícios navais conjuntos entre a MB e outros países da região e também com os Estados Unidos? Que outras parcerias entre a MB e outras marinhas da região e dos EUA o senhor poderia destacar?

Alte Esq Ilques: A interoperabilidade e intercâmbio com outras marinhas e guarda-costeiras de outros países possibilitam o aprofundamento de nossos relacionamentos, parcerias e uma enorme possibilidade de aprendizado e troca de experiências. A política externa brasileira considera o diálogo e a cooperação internacionais instrumentos essenciais para a superação de obstáculos e para a aproximação e o fortalecimento da confiança entre os Estados. De modo a manter a presença proeminente no Atlântico Sul, a MB adota uma forma clara de diálogo com diversos países, em especial do entorno estratégico brasileiro, buscando conhecer as suas mais prementes necessidades e contribuir com as iniciativas de organismos internacionais relevantes, dentre outros a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA). Mantemos uma excelente relação de intercâmbio com a Marinha dos EUA. Constantemente estamos enviando militares aos EUA para intercâmbios, além de também recebermos efetivos americanos para exercícios ou intercâmbios em assuntos específicos. A intenção é continuar os esforços para melhoria da interoperabilidade, por meio de um processo de planejamento comum a ambas as Marinhas, dos acordos de troca de conhecimentos e da capacidade de comunicações.

Diálogo: Em que ponto se encontra o desenvolvimento do primeiro submarino nuclear brasileiro? Pode explicar o que é o PROSUB?

Alte Esq Ilques: O lançamento ao mar do primeiro submarino convencional (S-BR), o “Riachuelo”, aconteceu ano passado, no dia 14 de dezembro. Os outros três submarinos convencionais encontram-se em construção, seguindo os cronogramas previstos. Com relação ao submarino com propulsão nuclear (SN-BR), o projeto básico foi concluído em janeiro de 2017, pelo Centro de Desenvolvimento de Submarinos. As próximas fases são de detalhamento de projeto, seguida da fase de construção, com previsão de prontificação para o final de 2029, a depender dos desafios tecnológicos a serem enfrentados e recursos orçamentários a serem provisionados.

O PROSUB é um dos maiores programas estratégicos do Brasil. Além de gerar muitos empregos, possui um elevado grau tecnológico que capacita nossa indústria, num processo de transferência de tecnologia. Ao final do programa, o Brasil terá a infraestrutura industrial instalada no Complexo Naval de Itaguaí (RJ), um dos mais modernos e equipados pólos da indústria naval do continente, com enorme potencial, atendendo demandas de reparo e construção de submarinos, navios de guerra, mercantes e outros produtos industriais.

Diálogo: A MB é a única Força Armada no Brasil a ter mulheres em funções de comando como oficiais generais. A partir de quando as mulheres conseguirão chegar a almirante de esquadra e ingressar nos postos armados?

Alte Esq Ilques: A MB foi a pioneira nas Forças Armadas a realizar o ingresso das mulheres em 1980 e, na prática, existem inúmeras delas, de vários corpos e quadros, trabalhando em atividades operacionais, como navios e unidades do Corpo de Fuzileiros Navais, inclusive na Estação Antártica Comandante Ferraz e na Ilha da Trindade, além de Operações de Paz sob a égide da ONU. Hoje, em sua Força de Trabalho Militar, a MB conta com cerca de 9.000 mulheres. Há quadros em que a mulher é maioria, como o de médicos, onde 436 dos 810 profissionais (54%) são do sexo feminino; o de cirurgiões-dentistas, 217 de 334 Oficiais (65%); e o Quadro de Apoio à Saúde, com 77% de mulheres (278 de 360). Outro fato que reafirma este pioneirismo foi a promoção da primeira oficial-general mulher das Forças Armadas brasileiras, a Contra-Almirante Dalva Maria Carvalho Mendes, em 2012 (médica do Corpo de Saúde da Marinha), e, em 2018, a Contra-Almirante Luciana Mascarenhas da Costa Marroni (Corpo de Engenheiros), segunda a alcançar tal posto. Como parte contínua do processo de aprimoramento e atualização da administração de seu pessoal, a Marinha admitiu, no ano de 2014, a primeira turma de aspirantes femininas da Escola Naval. Em 2017, por iniciativa da Marinha, houve a alteração da legislação específica, permitindo às mulheres integrarem qualquer quadro, como o Corpo da Armada, para os combates navais, e do Corpo de Fuzileiros Navais, para os combates em terra. Destaco que as mulheres podem ser do Corpo da Armada, do Corpo de Intendentes da Marinha e do Corpo de Fuzileiros Navais, com as escolhas em igualdade de condições com os aspirantes do sexo masculino, sendo fundamentadas na meritocracia, decorrente de suas classificações durante o curso. Quando tivermos mulheres dos corpos que tenham tempo de serviço e possam chegar ao posto de almirante de esquadra elas concorrerão, com certeza, em igualdade de condições com os homens e poderão alcançar o último posto da carreira.

FONTE: Diálogo

FOTO: Tatiana Pimentel



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