Por Shashank Joshi
Os submarinos nucleares entraram no centro das discussões do mundo nas últimas semanas. Em 15 de setembro EUA, Austrália e a Grã-Bretanha assinaram o pacto Aukus para ajudar a Austrália a construir submarinos com propulsão nuclear, uma capacidade militar tão poderosa, que os EUA nunca compartilhou com qualquer outro aliado que não seja a Grã-Bretanha. Mas há apetite em outros lugares. Em 26 de setembro, dois dos quatro candidatos para suceder Sugia Yoshihide como líder do LDP, a primeiro-ministro do Japão, incluindo o Frontrunner, Taro Kono, deu o apoio ao Japão para adquirir seu próprio submarino nuclear. No entanto, do outro lado da Terra de Perth, onde os submarinos australianos podem ser baseados um dia, outro poder naval está se aperfeiçoando com a mesma tecnologia há muito mais tempo.
No Complexo Naval de Itaguaí, perto do Rio de Janeiro, e outros locais espalhados pelo Brasil, centenas de engenheiros estão lentamente projetando e juntando partes do Álvaro Alberto, um submarino com propulsão nuclear, que leva o nome de um antigo vice-almirante e pioneiro do país no programa nuclear. Se tudo que está planejado, ele deverá estar na água na Ilha da Madeira, em Itaguaí, no início dos anos 2030, antes da Austrália sentir o cheiro de seus submarinos. Se tudo sair como está previsto, o Brasil se tornará o primeiro país sem armamento nuclear, que operará um submarino movido a energia nuclear, reforçando as ambições do país para se tornar um grande poder naval.
As forças armadas do Brasil começaram um trabalho sério na área nuclear na década de 1970, com um olho em produzir armas nucleares. A Marinha era a ponta de lança desse esforço, implantando centenas de funcionários em um programa secreto para enriquecer urânio em centrifugadoras, um processo que enriquece o unânio para uso em reatores (ou bombas), e para construir os reatores em miniatura que podem caber dentro do casco apertado de um submarino. Este trabalho sobreviveu ao final do regime militar em 1985. Ele recompensou por um tempo, mas recebeu apoio entusiasmado de Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de esquerda do Brasil de 2003 a 2010, que deu um grande impulso financeiro ao programa em 2007.
O progresso tem sido lento, embora Jair Bolsonaro, atual presidente do Brasil, tenha participado de uma cerimônia que marcou a construção inicial de protótipo de reator em Iperó, que fica a 120 km no noroeste de São Paulo, no dia 20 de outubro 2020. Um mês depois, a Marinha finalizou o design básico do submarino. Isso foi em pequena parte, graças ao Naval Group, estaleiro francês com forte participação do governo, que com a quebra de contrato no mês passado pela Austrália, como parte do Aukus, provocou um incidente diplomático.
Sob um acordo feito em 2008, o Naval Group assinou um contrato com a Odebrecht, um conglomerado agora sinônimo de corrupção, para vender submarinos diesel-elétricos avançados para o Brasil, e auxiliar nos aspectos não nucleares do submarino Álvaro Alberto em Itaguaí.
Muitos vêem a busca do Brasil por submarinos nucleares como algo quixotesco. É “uma indulgência louca da época de Lula”, diz um diplomata estrangeiro. “Mas nada contra aos novos estádios para a Copa do Mundo de 2014”. Autoridades brasileiras justificam o programa apontando para uma doutrina conhecida como a “Amazônia Azul”, um termo cunhado pela Marinha, que se refere ao litoral de 8.000 km, as riquezas econômicas que estão fora e a importância de defendê-los contra possíveis predadores. Em 2010, o Brasil expandiu unilateralmente sua Zona Econômica Exclusiva (ZEE), além das 200 milhas náuticas estabelecidas pela Convenção das Nações Unidas sobre a Lei do Mar.
Existem fatores geopolíticos no trabalho também. Os submarinos justificaram a necessidade de dominar o ciclo completo de combustível, o processo de mineração, fresagem e enriquecimento de combustível nuclear, e assim colocando o Brasil “no limiar entre ser um estado nuclear e não ser um estado nuclear”, diz Carlo Patti, professor da Universidade Federal de Goiás e autor do livro “Brasil na Ordem Nuclear Global”. Isso significa que o país pode produzir sua própria energia nuclear, sem buscar ajuda de países ricos que, na opinião do Brasil, monopolizam essa tecnologia sobre o pretexto da não proliferação. Também significa que o Brasil poderia produzir urânio para armas, se assim for escolhido. Ambas as capacidades são fontes de “prestígio político e tecnológico”, diz Patti.
Por esta razão, eles defendem a não proliferação. O Brasil uma vez teve um programa de armas secretas. Em 2019, o filho de Bolsonaro, um membro do Congresso, disse que o Brasil seria “levado mais seriamente” se tivesse armas nucleares. Considerando que a maioria dos países assinaram um chamado protocolo adicional com a Agência Internacional de Energia Atômica, um cão de guarda nuclear, que permite inspeções aprimoradas, o Brasil há muito se recusou a fazê-lo, com base em que os países com armas nucleares, não fizeram o suficiente para se desarmar.
Na prática, no entanto, os submarinos não são um grande motivo de preocupação. O material nuclear brasileiro é monitorado sob um pacto bilateral especial com a Argentina em 1991, e, ao contrário dos subsídio britânicos e americanos, que usam urânio enriquecido aos altos níveis adequados para uma bomba, o reator planejado do Brasil usará urânio enriquecido com baixo teor, e precisaria dar uma guinada em sua política para usar com fins nefastos. Os oficiais navais brasileiros estão interessados em mostrar que seu programa é acima do conselho e não gostaria de ser colocado com parias nucleares como o Irã. “Não estou preocupado”, diz Tgzhan Kassenova, especialista em não proliferação na Universidade Estadual de Nova York em Albany. “Eles querem se posicionar como um programa aberto, responsável e legítimo sem nada a esconder.”
Um submarino nuclear é uma das peças mais sofisticadas e complexas de hardware militar que qualquer país pode construir. A construção é difícil o suficiente. Manter um reator seguro em um tubo subaquático pressurizado é tão desafiador. No entanto, o programa do Brasil sobreviveu aos governos militares e civis e presidentes da esquerda e direita. Sua sobrevivência deve muito a Lula, que disse que ele vai concorrer nas eleições presidenciais do próximo ano e desfruta de 18% de vantagem sobre o Sr. Bolsonaro.
“O programa parece ser irreversível”, observou a Sra Kassenova e outros outros especialistas que visitaram o estaleiro de Itaguaí em 2018. Nenhum país abaixo do equador possuí ou opera um submarino alimentado por energia nuclear. O Brasil e a Austrália agora estão na disputa para chegar primeiro.
TRADUÇÃO E ADAPTAÇÃO: DAN
FONTE: The Economist