(ou, em chinês, Diaoyu). Uma interpretação mais alarmante, e plausível, é a de que Pequim resolveu fazer frente aos EUA no Pacífico Ocidental. O Leste da Ásia parece um lugar cada vez mais perigoso.
Quando Xi Jinping se reuniu com Barack Obama na Califórnia, alguns meses atrás, o presidente chinês disse ao colega americano que o Oceano Pacífico era suficientemente grande para acomodar duas grandes potências. A afirmação a ser inferida era a de que EUA e China deveriam dividir o butim.
Também estava implícito na observação que a China não aceitaria um status quo que permitisse que os EUA continuassem a potência dominante do Pacífico.
Na reunião de cúpula, Obama fugiu à questão. Agora parece que Xi concluiu que chegou a hora de a China começar a se apoderar de sua parte.
As Senkaku são governadas pelo Japão desde o fim do século XIX, excetuando-se um curto período de controle americano após a Segunda Guerra. A China voltou a reivindicar a área no início da década de 1970, mas por várias décadas pouco fez para levar concretizar o pleito. Desde os Jogos Olímpicos de 2008, adotou uma postura mais afirmativa, fazendo incursões regulares no espaço aéreo e marítimo do território disputado.
Isso levou os EUA a advertir que a área faz parte do pacto mútuo de segurança entre EUA e Japão. Esse compromisso americano está agora sendo posto à prova. A pergunta que Pequim parece estar fazendo é até que ponto Obama irá para preservar a ordem atual. O objetivo estratégico da China é empurrar os EUA para longe de seu litoral e afirmar sua soberania nas porções oriental e sul do Mar da China. Será que um país exaurido por guerras no Oriente Médio como os EUA, tem vontade política suficiente para se arriscar a empreender um conflito na Ásia para defender um punhado de rochas desabitadas? Provavelmente não foi por acaso que o momento escolhido por Pequim coincidiu com um dos períodos mais problemáticos da Presidência de Obama.
A decisão de Washington de enviar dois bombardeiros B-52 para a recém-declarada “zona de identificação de defesa aérea” – desconsiderando as exigências de Pequim de que os voos sejam notificados e, assim, se expondo ao risco de uma “ação defensiva de emergência” – sugere que Washington compreende a natureza do desafio.
Chuck Hagel, o secretário de Defesa dos EUA, qualificou a iniciativa chinesa de “tentativa desestabilizadora de mudar o status quo na região”.
Outras autoridades americanas foram menos diplomáticas. Pequim, porém, luta por um objetivo estratégico de longo prazo. A pergunta no Leste da Ásia é se os EUA têm poder de resistência para enfrentar uma investida chinesa em nome da hegemonia regional.
O impacto imediato das novas regras de voo criadas por Pequim é elevar o risco, já considerável, de um conflito armado com o Japão por causa das ilhas. A zona chinesa se sobrepõe à zona de identificação de defesa aérea há muito estabelecida por Tóquio. O perigo de um erro de cálculo dos dois lados está longe de ser desprezível. Em Shinzo Abe, o Japão tem um premiê nacionalista determinado a não se intimidar pelo país vizinho mais poderoso, e nem a ser excessivamente influenciado pelas advertências específicas dos EUA de que Tóquio deveria fazer sua parte para reduzir a temperatura política.
Abe é um revisionista despudorado, com o perigoso hábito de retocar períodos desagradáveis da história do Japão. Ele busca ainda uma desculpa para alterar a Constituição japonesa e incluir nela algo mais que apenas uma capacidade militar defensiva. Um conflito com a China, acidental ou intencional, pelas ilhas Senkaku, poderia fornecer essa justificativa.
Todos os vizinhos da China estão observando de perto para ver exatamente onde Washington vai estabelecer o equilíbrio entre esses dois objetivos.
Para os EUA há muito mais em jogo do que só as relações com o Japão. A disputa de Pequim com Tóquio pelas ilhas é uma das muitas disputas territoriais entre a China e seus vizinhos. As novas restrições aéreas se sobrepõem à zona sul-coreana, assim como à reivindicação territorial do Japão. As Filipinas estão insatisfeitas pelo que veem como um a falha dos EUA em apoiar o país em sua disputa com Pequim por um grupo de ilhas. O Vietnã tem uma rusga com a China por causa de fronteiras marítimas.
De modo consciente ou não, Pequim agora transformou o controle do espaço aéreo em torno de Senkaku num teste decisivo do compromisso dos EUA com a segurança do Leste da Ásia. A aceitação das restrições chinesas por Washington enviaria um sinal para todas as outras nações da região de que não se pode confiar nos EUA para defender o status quo contra o expansionismo chinês.
Mas demonstrar sua resolução de potência residente no Sudeste da Ásia, com o patrulhamento constante do espaço aéreo disputado, é aceitar uma nova fonte de atritos com Pequim. Minha aposta é que Obama, acusado de governar sobre o colapso do poder dos EUA no Oriente Médio, não tem como recuar em relação a Senkaku.
As autoridades chinesas estudam muito a história. A ascensão da Alemanha no fim do século XIX há muito tem destaque no currículo da elite responsável pela política externa da China. Eles dizem que a China não repetirá o erro alemão de unificar os vizinhos contra a sua ascensão à condição de potência maior. Essa atenção ao passado parece agora estar assumindo uma posição secundária na determinação da China de afirmar seu poder. Os erros da história sempre se repetem.
FONTE: Valor – Por Philip Stephens | Financial Times