Brasil não está preparado para evitar ataque na Olimpíada, dizem especialistas

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Por Pedro Fonseca e Rodrigo Viga Gaier

RIO DE JANEIRO (Reuters) – O Brasil ainda não tem o conhecimento e o preparo necessários para impedir que a Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro seja alvo de ataques como os que ocorreram em Paris, e dependerá da ajuda de países estrangeiros para garantir a proteção do evento, avaliaram especialistas em segurança.

As preocupações com a possibilidade de um ataque nos Jogos do Rio cresceram desde que militantes do Estado Islâmico reivindicaram a autoria de ações coordenadas que deixaram 129 mortos em Paris na semana passada e tiveram como um dos alvos a área do estádio onde a seleção francesa disputava um amistoso com a Alemanha.

A facilidade de se conseguir armas no Rio, onde várias favelas são dominadas por traficantes de drogas fortemente armados, a falta de uma rede de inteligência no país capaz de interceptar planos de ataques de militantes e o despreparo dos estádios para a eventualidade de uma bomba são os principais problemas enfrentados pelas autoridades, segundo especialistas ouvidos pela Reuters.

“O Brasil mais que engatinha nessa área de prevenção ao terrorismo, na verdade se arrasta”, disse o professor e especialista em segurança da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Fernando Brancoli. “O Brasil não tem condições de rastrear no campo internacional ou saber se dinheiro está vindo para cá para financiar atentados. Terá que contar com ajuda de quem sabe fazer. Não tem jeito.”

A segurança sempre foi uma das maiores preocupações do Comitê Olímpico Internacional em relação aos Jogos do Rio, mas não relacionada diretamente ao terrorismo. A cidade foi escolhida em 2009 como sede dos Jogos em parte por ter convencido os dirigente do COI da eficácia do programa de ocupação de favelas pela polícia, as chamadas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que reduziram os índices de criminalidade.

Representantes de governos estrangeiros demonstraram preocupação com a segurança durante os Jogos, uma vez que não veem as autoridades do país levando a sério a ameaça de um ataque terrorista.

Diplomatas em Brasília ficaram surpresos na segunda-feira quando, três dias depois dos ataques a Paris, a presidente Dilma Rousseff minimizou a possibilidade de um ataque no Brasil em entrevista durante o G20, na Turquia, ao dizer que o país está “muito longe dos locais onde esse processo está se dando”.

“O Brasil está colocando a cabeça no buraco como um avestruz”, disse um diplomata europeu ligado a questões de segurança.

As autoridades públicas e os organizadores dos Jogos sempre exaltaram o fato de o Brasil não ter enfrentado nenhum caso de violência em grandes eventos, inclusive na Copa do Mundo do ano passado, mas a nova ameaça representada pelo Estado Islâmico deve levar a uma revisão do planejamento de segurança.

“Há um aumento natural e justificável da preocupação e esse assunto entrou na prioridade”, disse uma fonte próxima à organização da Olimpíada do Rio. “Desde os lamentáveis ataques, o governo (federal) começou a revisitar os planos de segurança com muita força.”

Há ainda a expectativa para que o Congresso aprove um projeto de lei que tipifica o crime de terrorismo e estabelece pena de até 24 anos de prisão em regime fechado.

O projeto, no entanto, é alvo de polêmica devido a um dispositivo aprovado pela Câmara para garantir que movimentos sociais não possam ser enquadrados na nova lei, mas que foi retirado da proposta aprovada no Senado.

COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

Os Jogos Olímpicos já foram alvo de ataques no passado. Em 1972, 11 membros da delegação israelense e um policial alemão foram mortos por integrantes do grupo palestino Setembro Negro na Olimpíada de Munique.

Nos Jogos de 1996 em Atlanta (EUA), uma pessoa morreu e outra sofreu um ataque cardíaco fatal devido à explosão de uma bomba no Parque Olímpico Centennial. Mais de 100 pessoas ficaram feridas.

O governo brasileiro, que vem trabalhando em colaboração com outros países na área de segurança desde a preparação para o Mundial de 2014, deve intensificar essa coordenação. Autoridades brasileiras e internacionais vão se reunir na próxima semana em Brasília para discutir o enfrentamento ao terrorismo.

“O Brasil se vê obrigado depois do que aconteceu em Paris a aumentar a cooperação com agências internacionais. Sozinho não tem como dar conta, e países como Estados Unidos, Rússia e Israel já têm tradição de mandar agentes a grandes eventos para garantir a integridade de seus atletas, e isso vai aumentar ainda mais”, disse o professor Brancoli, da FGV.

Segundo Brancoli, as grandes potências não vão deixar a segurança dos Jogos a cargo apenas do Brasil. “Seria uma temeridade para os dois lados”, avaliou.

O esquema de segurança dos Jogos de 2016 contará com um Centro Integrado Antiterrorismo, que irá funcionar em Brasília e terá a participação de profissionais de outros países especializados na prevenção e combate a ações de terror.

No total serão empregados cerca de 85 mil homens na proteção dos Jogos, mais que o dobro dos 40 mil estimados em Londres-2012.

O valor total de investimento ainda não foi apresentado. Até o momento, o custo divulgado é de 930 milhões de reais, sendo 350 milhões de reais do Ministério da Justiça e 580 milhões de reais por parte do Ministério da Defesa. Há ainda recursos investidos em equipamentos para a Copa de 2014 que também serão utilizados nos Jogos.

Um dos problemas apontados por estudiosos no caso de um atentado na Olimpíada é a falta de planejamento dos estádios para a eventualidade de uma bomba.

Apesar de obras recentes, o Estádio Olímpico e o Maracanã não têm saídas e escapes considerados ideais para casos de atentados, além de carecerem de mais câmeras de segurança, detectores de metal e até mesmo de proteção antiaérea nos arredores.

“A arquitetura dos nossos estádios em muitos casos não ajuda, porque não tem um número de saídas radialmente distribuídas para se fazer uma evasão rápida em caso de uma ameaça terrorista”, disse o professor Moacyr Duarte, especialista em gerenciamento de riscos e planejamento de emergências da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Como exemplo, Duarte cita as escadas em espiral de ambos os estádios, que obrigam os torcedores a andarem ao menos 150 metros sem conseguirem se afastar do local da ameaça. “Nunca houve uma preocupação com a taxa de afastamento, o número de metros que você anda no terreno para se afastar do perigo. Isso sem dúvida é um problema.”

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, cujo ministério está encarregado da segurança dos Jogos por meio da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, garantiu nesta semana que o “êxito da segurança pública” da Copa se repetirá na Olimpíada.

Oficialmente, a secretaria não confirma que o esquema de segurança para os Jogos será reforçado após os atentados em Paris, mas uma fonte do órgão disse que “ajustes” em grandes eventos como uma Olimpíada são normais.

“Depois do que aconteceu, é óbvio que ajustes serão feitos, só que ainda estão em discussão”, afirmou.

(Reportagem adicional de Anthony Boadle, em Brasília)

 

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