Por Alberto Cardoso*, O Estado de S.Paulo
“Alguma coisa é mais importante do que o trabalho do soldado dever ser bem feito?” – Platão, em ‘A República’
Eu o convido para uma conversa sobre o Exército dos brasileiros, o do Braço Forte e Mão Amiga.
Para compreender o papel das Forças Armadas é preciso entender que são órgãos do permanente Estado brasileiro; não dos governos que se sucedem. O que isso significa? Você sabe, mas alinhemos o conhecimento.
A Constituição mostra o caminho definindo as Forças como “instituições nacionais permanentes”, tal qual o Estado, diferentemente da transitoriedade dos governos, com mandatos eleitorais de quatro anos. Ademais, atribui-lhes responsabilidade sobre duas outras instituições nacionais permanentes, nas expressões “defesa da Pátria” e “garantia dos poderes constitucionais”; além da “garantia da lei e da ordem”. Então, a ideia-chave que vincula o Exército ao Estado é a permanência ao longo da história do País.
O que isso significa? Outra ideia-chave: independência em relação aos partidos que ocupem o governo no rodízio democrático.
O argumento definitivo sobre a vinculação do Exército ao Estado encontra-se na sua célula-mãe, as companhias de emboscadas comandadas por Antônio Dias Cardoso na Insurreição Pernambucana contra os holandeses. Ele foi mandado pelo governador-geral do Brasil, em 1644, para organizar os pernambucanos em exército. Era o Estado brasileiro fundando um exército para a libertação da província.
Sua estratégia das emboscadas sucessivas produziu desgaste moral e material nas forças invasoras, vencidas, finalmente, nas Batalhas de Guararapes, em 1648. Ali nascia o Exército, das três raças – negra, indígena e branca -, juntamente com o nacionalismo e patriotismo, dois de seus mais caros valores. No episódio, o Estado tem sua inauguração como entidade política responsável pela segurança nacional; o que permite afirmar que ambos nasceram juntos na defesa formal da Pátria e assim estão permanentemente.
A atitude dos militares derivada dessas ideias os predispõe a se sentirem corresponsáveis pelos destinos do País, junto com os irmãos civis, no caso, na segurança da Pátria, das instituições republicanas e, em última instância, da fiança da lei e da ordem. Para tanto o Exército se prepara e vigia constantemente.
O conceito básico na preparação do Exército para a missão constitucional é dissuasão, entendida como a atitude do Estado com vista a evitar a guerra e a insurreição interna por meio, respectivamente, das capacidades retaliatória e pacificadora (já são 142 operações, inspiradas no patrono Caxias, o Pacificador), preservando a soberania e a ordem interna do País.
Com as coirmãs, Marinha e Força Aérea, o Exército dedica-se diuturnamente à prestação de contas ao povo, aquele de quem “todo o poder emana”. Como?
Ele responde ao povo se preparando duramente nos quartéis, nos campos de instrução e nas manobras de adestramento. Cuidando da capacitação continuada dos oficiais e sargentos. Planejando o emprego das tropas nas hipóteses sempre atualizadas pelo pessoal de inteligência e operações dos Estados Maiores. Atuando com suas 688 organizações de variadas naturezas, nos rincões nacionais, em estado de presteza diuturna.
Pontilhando os limites da Amazônia com 46 Pelotões de Fronteira, marcos humanos da nossa soberania, capacitados nos cursos de Guerra na Selva, sob o lema “Árdua é a missão de desenvolver e defender a Amazônia.
Muito mais difícil, porém, foi a de nossos antepassados de conquistá-la e mantêla”, do general Rodrigo Otávio, antigo comandante militar daquela área.
Ajudando o povo em dezenas de calamidades. Entregando água potável nos povoados do perímetro da seca, num percurso total de 4,6 mil km, e perfurando 1.913 poços artesianos. Apoiando a logística no enfrentamento da pandemia em todo o território nacional. Construindo, pavimentando ou conservando 61 mil km de estradas.
Operando em missões de paz da ONU, que já totalizam 50, incluídos 13 anos no Haiti e 14 ações em andamento. Atuando na fronteira com a Venezuela, acolhendo os refugiados, tratando-os e transferindo-os para outras regiões do Brasil.
Retirando garimpo ilegal de terras indígenas e combatendo o desmatamento ilegal (neste ano, já participou da apreensão de 14 mil m³ de madeira). Dando assistência médica aos índios nos Pelotões de Fronteira e nos hospitais das guarnições na Amazônia. Sempre com o lema do marechal Rondon, fundador do Serviço de Proteção ao Índio, sobre as relações com os indígenas: “Morrer, se preciso for. Matar, nunca”.
Tudo moldado pelos valores da cultura do Exército: democracia, patriotismo, nacionalismo, ordem, vinculação ao Estado, apartidarismo político, caldeamento com a Nação, unidade nacional e integridade territorial, responsabilidade perante a Nação, respeito à autoridade, verdade, probidade, camaradagem, hierarquia e disciplina.
Obrigado, compatriota, por se preocupar em conhecer o seu Exército!
*General de Exército reformado, foi Ministro Chefe do GSI