Por General de Exército José Luiz Freitas
A dinâmica das relações internacionais e das interações sociais, neste primeiro quartil do século 21, é altamente desafiadora. As aceleradas mudanças, que abrangem todos os aspectos da vida humana e das sociedades, afetam também o fenômeno da guerra, exigindo de todas as nações um grande esforço para manterem seu estamento militar pronto e em condições de ser empregado, garantindo a defesa de seus interesses e de sua soberania.
A instantaneidade que caracteriza a modernidade mudou a velocidade das respostas que são exigidas das instituições. Não há mais tempo para longas deliberações e demorados processos decisórios. Os planejamentos devem estar prontos de modo que a ação, em face de uma nova demanda, seja imediata.
Essa também é a realidade da instituição militar. Em razão disso, o Exército Brasileiro tem procurado aperfeiçoar sua capacidade de pronta resposta, sempre com o foco no cumprimento de sua missão constitucional e de acordo com o seu conceito operativo, que é o da atuação no amplo espectro dos conflitos.
Tal capacidade, consubstanciada em um permanente estado de prontidão operacional, já é realidade em toda a Força Terrestre, como comprovam as sucessivas operações nas quais o Exército Brasileiro atuou com oportunidade e efetividade, especialmente em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) – algumas das quais com expressivo uso da força -, em operações na faixa de fronteira no contexto da Lei Complementar 97 e em apoio à Defesa Civil ou a órgãos governamentais. Esse nível de operacionalidade é essencial e deverá ser mantido por toda a Força Terrestre.
Entretanto, a conjuntura atual e a que se descortina para o futuro próximo exigem o aperfeiçoamento constante da capacidade de pronta resposta da Força para missões mais complexas, características do ambiente volátil, incerto, complexo e ambíguo que caracterizam o atual momento histórico. Para tanto, a Força Terrestre deverá manter uma parcela de seus meios em permanente estado de prontidão, em condições de cumprir as diversas missões que podem ser impostas ao País, de acordo com a legislação vigente e com as orientações do Ministério da Defesa e do Comandante do Exército, além das diretrizes e dos planos estratégicos do Estado-Maior do Exército e do Comando de Operações Terrestres.
Essa Força deverá ser capaz de atuar nos múltiplos domínios do campo de batalha moderno, de forma simultânea ou sucessiva, em operações ofensivas, defensivas e de cooperação e coordenação com agências, em situação de guerra e de não guerra, com considerável grau de autonomia. Nesse contexto, a composição de forças deve ser flexível e modular, em estruturas elásticas adaptáveis às mudanças de ambiente.
Atento a essa necessidade, o Exército Brasileiro incluiu no seu Plano Estratégico 2020/23 o Objetivo Estratégico do Exército (OEE) 5 – Modernizar o Sistema Operacional Militar, que, em sua Ação Estratégica 5.1.3 – Implantar o Sistema de Prontidão Operacional de Forças, prevê a execução de ações para incrementar as capacidades de apoio a órgãos governamentais, de pronta resposta estratégica e de superioridade no enfrentamento.
Assim, o Comando de Operações Terrestres (COTER) estruturou o Sistema de Prontidão (SISPRON), que englobará as Forças de Prontidão (FORPRON). Essas Forças poderão compor, ainda, uma Força Expedicionária e uma Força de Operações de Paz, essa última destinada a cumprir o compromisso brasileiro no âmbito do Sistema de Prontidão de Capacidades para Operações de Paz da Organização das Nações Unidas (UNPCRS, em inglês), em apoio à política externa do País.
Como consequência, o COTER promoveu ações em quatro eixos: revisão doutrinária, definição de capacidades e Forças necessárias, preparo e certificação das Forças e sustentação da prontidão. Para tal, expediu portarias e orientações para que, no ano de 2020, tivesse início um projeto-piloto com as seis brigadas da Força de Emprego Estratégico do Exército.
Além das brigadas da Força de Emprego Estratégico, outras brigadas definidas pelo Comando do Exército e um número variável de unidades que comporão os módulos especializados, também farão parte da FORPRON.
Em função da análise de cenários e de necessidades do Exército, poderá haver modificações nas Forças integrantes do SISPRON, tais como inclusões, exclusões ou substituições de grandes unidades (GU) ou módulos especializados. Esses, compostos por tropas com características e capacidades de apoio, logísticas e especiais, também seguirão os conceitos da prontidão operacional.
Essa conformação de Forças de naturezas diversas (blindada, mecanizada, paraquedista, leve, aeromóvel, de selva e motorizada), além dos distintos módulos especializados, que agregam capacidades de Inteligência (Intlg), Aviação (Av), Sistema de Aeronaves Remotamente Pilotadas (SARP), Guerra Cibernética (G Ciber), Guerra Eletrônica (G Elt), Operações de Informação (Op Info), Comunicação Social (ComSoc), Operações Psicológicas (Op Psico) e Defesa Química Biológica, Radiológica e Nuclear (DQBRN), dos apoios de Fogos e Artilharia Antiaérea (AAAe), Engenharia e Comando e Controle (C2) atende, em excelentes condições, às necessidades previstas para as operações no amplo espectro dos conflitos, em operações de guerra e não guerra, tanto na defesa da Pátria quanto em eventuais atuações sob a égide de organismos internacionais.
O Sistema de Prontidão Operacional prevê o cumprimento de três fases de treinamento e prontidão, de forma que o ciclo de prontidão tenha duração aproximada de 12 meses. Saliente-se que, dessa forma, o ciclo de capacitação orgânica dessas GU será encurtado, deixando de ser trienal e tornando-se anual.
Na primeira fase, os militares selecionados participarão das instruções da Capacitação Técnica e Tática do Efetivo Profissional (CTTEP) e dos Períodos de Adestramento Básico (PAB) de nível pelotão (Pel) e subunidade (SU), conforme previsto no Programa de Instrução Militar (PIM)/202.
Durante a segunda fase, será realizada a validação e a certificação do militar e de sua fração (pelotão, companhia, batalhão e brigada) pelos Comandos Militares de Área enquadrantes, com o apoio dos Centros de Adestramento do Exército, utilizando-se o Sistema de Simulação já em vigor na Força Terrestre. O exercício de certificação deverá contemplar as possibilidades reais de emprego da Força, sempre se considerando que o “emprego orienta o preparo”. Os módulos especializados sempre participarão junto à tropa, buscando-se a constituição completa da Força, a fim de se garantir a integração e a interoperabilidade.
Ao término da fase de certificação, inicia-se a chamada fase de prontidão propriamente dita. A tropa se manterá durante oito meses em prontidão operacional, disponível para ser empregada imediatamente pelo Comando do Exército. As fases se sucedem de maneira ininterrupta, de modo que sempre exista uma tropa pronta para substituir aquela que encerra seu período de prontidão operacional.
A sustentação da prontidão exige ações na área de pessoal, logística e instrução militar, a fim de se garantir a manutenção das capacidades adquiridas. Assim, cabe ao Órgão de Direção Operacional (ODOp), em cooperação com os Órgãos de Direção Setorial (ODS), controlar a situação de Quadro de Cargos (QC), Quadro de Dotação de Material (QDM) e níveis de suprimento, além da coordenação, com os Comandos Militares de Área, da execução de exercícios de tropa, de modo a manter os níveis de adestramento adquiridos.
Os Projetos Estratégicos do EB, alinhados com o PEEx e com a doutrina vigente, encarregam-se de obter novos Sistemas de Materiais de Emprego Militar (SMEM), além de modernizar os existentes. Em princípio, as Forças de Prontidão devem receber de forma prioritária esses equipamentos, sempre com foco na geração das capacidades necessárias.
Assim, ao término do corrente ano, cerca de 10 mil homens já terão sido certificados e, ao término de 2022, cerca de 14 mil, ou seja, um efetivo compatível com o de uma Divisão de Exército.
Dessa forma, a implantação efetiva do SISPRON fornecerá à Força Terrestre, a partir de 2023, condições de empregar, de forma imediata, o efetivo de uma Força Terrestre Componente até o escalão Divisão de Exército, ou módulos especialmente compostos, o que significará um efetivo incremento na operacionalidade da Força Terrestre, trazendo-a para um patamar ainda mais elevado e condizente com a estatura político-estratégica do Brasil.
Sobre o autor: O General de Exército José Luiz Freitas é o atual Comandante de Operações Terrestres. Formou-se no Curso de Cavalaria da Academia Militar das Agulhas Negras em 1979. Dentre as funções que desempenhou ao longo de 45 anos de carreira destacam-se: Instrutor da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais; Chefe do Estado-Maior da 15ª Brigada de Infantaria Motorizada; Comandante da Escola de Material Bélico; Oficial do Gabinete do Comandante do Exército; Adido Naval e do Exército junto a Embaixada do Brasil no Equador; Comandante da 5ª Brigada de Cavalaria Blindada; Chefe de Gabinete do Estado-Maior do Exército; 3º Subchefe do Estado-Maior do Exército e Chefe do Centro de Doutrina do Exército; Subcomandante de Operações Terrestres; Comandante da 5ª Divisão de Exército; e Comandante Militar do Oeste. É doutor em aplicações, Planejamento e Estudos Militares e Especialista em Política, Estratégia e Alta Administração Militar.