Ten Cel Maurício J L Oliveira
A guerra do futuro será caracterizada, cada vez mais, pelas seguintes tendências presentes no campo de batalha: inteligência artificial, robótica, busca pela dimensão espacial, necessidade de pronta resposta estratégica, capacidade em guerra eletromagnética, ações no campo informacional, presença de crime organizado transnacional e demais tensões sociais, ações terroristas e sistemas e materiais de emprego militar cada vez mais sofisticados com alto valor agregado, além da gradativa substituição de tarefas antes desempenhadas por humanos, mas com forte probabilidade de serem realizadas por aeronaves remotamente pilotadas de um local fora da área de conflito.
Nesse contexto, destaca-se o Sistema de Aeronaves Remotamente Pilotadas, também conhecido como SARP ou drone, como uma nova ameaça no campo de batalha do século XXI e com a possibilidade de cumprir várias tarefas e atingir vários objetivos nos campos estratégico, operacional e tático. Dentre as várias capacidades de emprego dessa ameaça aérea, destacam-se: a execução de ações de inteligência, reconhecimento, vigilância e aquisição de alvos (IRVA); a realização de ataques às instalações e às tropas no terreno, utilizando-se de mísseis altamente precisos ou bombas guiadas, ou até mesmo ser empregado como o próprio armamento – tática dos drones suicidas já treinada pelo Exército dos EUA (com sistema de controle man-in-the-loop e outros drones no ar fornecendo informações dos alvos); a futura capacidade de realizar combate aéreo de forma eficaz em substituição a uma aeronave pilotada por humanos; a realização de mapeamento aéreo, com a possibilidade de ser movido a energia solar e hidrogênio, ganhando maior autonomia e economia; a capacidade de guerra antissubmarino e a possibilidade de maior permanência em voo cumprindo ações militares, sem a interferência da fadiga humana, dentre outras.
Os países que possuem maior investimento anual aplicado em Defesa já empregam esse novo ator na área militar e em larga escala, tais como: EUA, Israel, China, Rússia e Alemanha, dentre outros. Os EUA perceberam o potencial militar dessa nova arma e, dessa forma, utilizam-na para atacar alvos suspeitos de terrorismo no Afeganistão, no Paquistão, no Iêmen e na Somália, além de desenvolverem novas capacidades para o aperfeiçoamento dessas máquinas. Em janeiro de 2020, o drone norte-americano MQ-9 Reaper, um dos mais letais da frota dos EUA que utiliza os mísseis AGM-114 Hellfire, atacou o comboio que conduzia o General iraniano Qasem Soleimani, ex-chefe da Força Al Quds iraniana, próximo ao Aeroporto de Bagdá. A China, por sua vez, já realizou um exercício marítimo com helicópteros de ataque Z-19, lançando mísseis inteligentes fora do alcance a olho nu contra alvos marítimos detectados e rastreados por drones.
No Brasil, a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) registrou, em 2020, um crescimento de 150% no cadastramento de drones no País em relação ao ano de 2017, atingindo o número de mais de 77 mil equipamentos registrados, sendo 28 mil para uso profissional, gerando cada vez mais empregos e alavancando a economia brasileira. No campo militar, as Forças Armadas, cientes das possibilidades militares dessa nova ameaça no campo de batalha, realizam estudos sobre o emprego armado do SARP e sobre como se contrapor a
essa nova ameaça. Qual deverá ser a forma mais eficiente e eficaz de se realizar a defesa contra drones? Será suficiente somente a utilização de mísseis e canhões de baixa e média altura? Haverá a necessidade da obtenção de armamentos, como a arma a laser, de alta capacidade de energia dirigida? Armamentos que gerem ondas eletromagnéticas e que derrubem a ameaça são realmente eficazes? Será importante a combinação dessas soluções mencionadas? A discussão é necessária e importante para os Centros de Doutrina, na medida em que as três Forças Singulares precisarão discutir e decidir sobre materiais e doutrina para esse novo enfrentamento no combate moderno.
No Exército Brasileiro, particularmente, esse assunto tem grande relevância e está sendo pesquisado no Centro de Doutrina do Exército, por meio da criação de um grupo de trabalho de SARP armado, permitindo uma visão geral do emprego desse sistema de armas nos principais conflitos recentes. O tema é de interesse não só para a Artilharia Antiaérea, mas também para a inteligência militar, a guerra eletrônica e outras capacidades.
Ciente dessa necessária discussão, a Escola de Artilharia de Costa e Antiaérea (EsACosAAe) vem estudando o tema com atenção, por intermédio da sua Divisão de Doutrina e Pesquisa, e realiza, no final de junho do corrente ano, um Simpósio de Defesa Anti SARP envolvendo militares do Ministério da Defesa, das três Forças Singulares da área combatente e de Ciência e Tecnologia, algumas empresas da Indústria Nacional de Defesa e universidades que pesquisam o tema “defesa” na geopolítica mundial. A intenção é proporcionar espaço para a discussão do tema e trocar experiências de estudos já realizados, e em andamento, sobre o assunto no âmbito das Forças Armadas brasileiras.
Atualmente, o conhecimento e a inovação são prerrogativas para o desenvolvimento das nações, e nenhuma tomada de decisão será tão eficaz quanto o envolvimento de com ações que abranjam a capacidade militar, o desenvolvimento de nossa Base Industrial de Defesa e o conhecimento fornecido pela Academia (universidades). Essa forte tríplice hélice é fundamental para a obtenção de sucesso a partir da inovação e a criação de soluções com emprego dual, de forma a garantir a sustentabilidade de projetos voltados para a indústria de defesa do Brasil.
Por fim, voltando ao início deste texto, é importante destacar a importância do acompanhamento das novas tendências da guerra do futuro, tais como a maximização do emprego do SARP nos conflitos recentes e as soluções para o seu enfrentamento, na busca de Forças Armadas modernas e preparadas para um futuro que já começou. Além disso, o conhecimento atualizado e aplicado durante o preparo permitirá o emprego de Forças altamente capacitadas para se defrontarem com as características dos combates modernos.