Por Daniel Rittner
Prioritário no programa espacial brasileiro, o desenvolvimento do veículo lançador de microssatélites (VLM-1) dará um passo decisivo nesta semana. Foi marcado para sexta-feira, em uma unidade do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) na divisa dos municípios paulistas de São José dos Campos e Jacareí, o principal ensaio do motor que permitirá o efetivo lançamento dos foguetes à órbita terrestre. Todas as atenções dos engenheiros e cientistas estão voltadas para o teste.
Cerca de R$ 100 milhões já foram aplicados no desenvolvimento do motor S50, com tecnologia nacional, ao longo dos últimos 12 anos. Ele deverá funcionar plenamente, em uma simulação do que vai ocorrer em voo mais adiante, por até 84 segundos. Se tudo der certo, estará vencida uma etapa crucial para a conclusão do VLM-1 (Veículo Lançador de Microssatélites), prevista para 2025.
Eventuais falhas não são necessariamente um revés no projeto, servem para corrigir problemas mas podem provocar alongamento do prazo.
“Hoje, quando se fala em acesso ao espaço para colocar satélites em órbita, o nosso carro-chefe é esse motor. O ensaio será determinante para calibrar os nossos esforços com vistas às fases seguintes”, disse ao Valor o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Carlos Moura, admitindo ansiedade pela chegada da data.
Já houve testes menos complexos com outros protótipos, a fim de verificar aspectos como a trepidação e a resistência dos materiais, mas vem pela frente o ensaio mais amplo até agora, uma simulação, em terra, do desempenho do motor no futuro lançamento na base de Alcântara(MA).
Moura recorre a uma imagem simples para explicar quais são os objetivos na sexta-feira: “lmagine uma bexiga bem grande, que você enche quase até o limite de estourar, soltando a pontinha logo em seguida. Se soltar de uma vez só, vai esvaziar rápido e descontroladamente. Se soltar de fininho, o ar sair aos poucos, devagar. Você vai no limite. O motor que leva ao espaço é mais ou menos isso.”
“Há um casulo, feito de materiais compostos, dimensionado para suportar uma pressão muito grande. São 12 toneladas de propelente que vão queimar numa velocidade calibrada, durante 84 segundos, de forma contínua. Não pode haver um pico e voltar de repente. O ensaio no chão vai observar justamente isso: se a velocidade de queima, se o empuxo estão conforme as nossas previsões, se o propelente (combustível) teve as prioridades calculadas em laboratório, se o comportamento do invólucro resistirá. Agora, tudo será testado de uma vez só”, afirma Moura.
O projeto VLM-1 tem sido desenvolvido por meio de uma parceria entre o Brasil e a Alemanha com o objetivo de lançar microssatélites (até 50 Kg) em órbitas baixas equatoriais ou de reentrada atmosférica. No início, brasileiros e alemães planejavam fazer seus motores paralelamente.
Depois, a Alemanha decidiu se concentrar em outros componentes, A evolução do motor acabou ficando exclusivamente com o Brasil. Houve participação ativa da Avibras, uma das principais indústrias de defesa do pais, no desenvolvimento do S50, contratada mediante recursos orçamentários da AEB. Todo o desenvolvimento do veículo lançador de microssatélites é estimado em aproximadamente US$ 100 milhões.
O foguete poderá levar ao espaço não apenas microssatélites, mas também um conjunto maior de nanossatélites (inferior a 10 Kg). Ter um lançador próprio dará mais autonomia ao Brasil para alocar, quando quiser e na órbita mais adequada, os equipamentos que deseja para fins específicos, “Quando você pega uma carona com um amigo, nem sempre desce no melhor lugar. Teremos mais autonomia.”
Os microssatélites, ou nanos, podem ter várias aplicações: na defesa civil (alertas para desastres nacionais), na proteção do meio ambiente (detecção rápida de incêndios), na agricultura de precisão (com coleta de dados sobre clima e pragas por meio de sensores no campo), em comunicação remota (em áreas não cobertas pela telefonia convencional), em defesa (monitoramento das faixas de fronteira e movimentação de barcos que fazem pesca ilegal).
“Alguns equipamentos chegam a ter o tamanho de uma caixa de sapatos. Dos pequenos satélites, por exemplo, se encarregará de fazer em breve o mapeamento de todo o litoral do Rio Grande do Norte para verificar a localização exata dos melhores pontos para futuras torres eólicas, em termos de intensidade e direção dos ventos, umidade, nível das marés.
Ao colocar os satélites na órbita mais apropriada, diz Moura, há um ganho de eficácia na chamada “taxa de revisita”, intervalo de tempo entre uma passagem e outra do equipamento sobre aquele mesmo ponto na Terra. Assim, em vez de demorar algumas horas ou até mesmo alguns dias, pode-se ter um intervalo mais curto e monitoramento mais preciso.
FONTE: Valor Econômico