“O nosso aluno é o nosso melhor produto”
O Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) está preparando uma renovação no ensino de engenharia. A proposta é tornar o curso mais estimulante e motivar os alunos a inovar. A decisão foi tomada depois que a escola recebeu o aval do governo para duplicar o número de vagas para graduação em dois anos – hoje o ITA admite 120 alunos por ano no vestibular.
O ITA se aliou a parceiros de peso para estruturar o projeto, como o Massachusetts Institute of Technology (MIT). As duas universidades firmaram um acordo de cooperação no ano passado.
O reitor do ITA, Carlos Pacheco, também quer a participação das empresas no processo de renovação da escola, com o desenvolvimento de projetos para trazer a prática de engenharia mais perto dos alunos. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Por que vocês vão reformular o currículo do ITA?
É uma oportunidade que se abriu com a ampliação do ITA. Vamos contratar professores e receber recursos para criar uma estrutura nova de pesquisa. Tudo isso foi desencadeado pelo processo de expansão, que nos fez repensar nosso modelo de ensino.
O que vai mudar?
Queremos um ensino de engenharia renovado e que a inovação seja um carro-chefe do ITA. Para isso, precisamos incrementar as atividades “hands on”, que envolvem os alunos em projetos práticos ao longo de cada disciplina. A intenção é tomar o ensino mais estimulante para o aluno e fazer ele desenvolver novas habilidades, como capacidade de trabalhar em grupo, comunicação e iniciativa. Na vida real, quando ele for exercer engenharia, tem de estar apto a buscar conhecimentos para resolver os problemas do dia a dia.
Quando isso será aplicado?
Essas atividades “hands on” já existem em algumas disciplinas e foram criadas por iniciativa dos professores. Isso tem aumentado na medida em que estimulamos os professores a fazerem imersões em faculdades de ponta no exterior. É uma mudança progressiva.
Como o ITA está preparando os professores?
Talvez o maior desafio do ITA seja a contratação de novos professores. Estamos nesse momento convidando jovens talentosos da própria graduação do ITA para fazer mestrado integrado com a graduação, com a possibilidade de fazer doutorado em universidades de ponta no exterior. Nós queremos nos próximos 10 anos mandar uns 150 jovens para fazer doutorado em universidades parceiras, para formar uma nova geração de professores do ITA. A ideia é que eles tenham uma imersão escolar que já usam novas técnicas de ensino de engenharia e que possam aplicar no ITA depois.
O ITA vai abrir novos cursos de engenharia?
Essa foi uma questão que discutimos quando pensamos na ampliação da universidade. Decidimos que não. Existem cerca de 40 e poucos cursos de graduação em engenharia no País. Para nós, isso é uma especialização precoce. Decidimos não abrir novos cursos, mas queremos oferecer três “minors” eletivos, como existe no currículo americano. A ideia é oferecer especialização em engenharia de sistema, engenharia física e inovação.
As mudanças vieram do MIT?
Não. Elas vêm de um planejamento estratégico do próprio ITA. Mas obviamente temos olhado experiências internacionais para nos inspirarmos.
Quando os cursos começam?
Provavelmente daqui a dois anos. Quem entrar em 2014 já vai poder fazer. O aluno poderá escolher o minor depois que fizer as disciplinas básicas.
Como vai funcionar a parceria com o MIT?
Trabalhamos para desenhar um projeto de cooperação de cinco anos. Vamos identificar projetos de pesquisa que envolvam o ITA e o MIT e vários outros parceiros. Fizemos uma lista de 20 áreas de interesse que estamos avaliando, como controle do espaço aéreo, biocombustível de aviação e automação de manufatura. A nossa ideia é fazer uma chamada de cinco a dez projetos menores por ano para depois selecionar projetos maiores com maior potencial. Queremos projetos que tenham grande impacto, em múltiplas dimensões, como econômico e tecnológico.
Vocês ouviram as empresas na reestruturação do ITA?
Não de uma forma sistemática. Temos na nossa comissão I de planejamento estratégico engenheiros de grandes parceiras, como da Embraer. Mas o mercado nem sempre tem clareza do que quer. Uma mudança curricular é um processo de longo prazo. Vamos começar a implementar isso para os engenheiros que vão entrar na universidade a partir do ano que vem e que vão chegar ao mercado daqui a cinco, seis anos. No mundo privado, a definição do engenheiro que você precisa está orientada no curtíssimo prazo. O tempo das empresas e das universidades é diferente. O que tentamos fazer é identificar quais as tendências do mercado e as necessidades futuras do profissional.
Como as empresas poderão se aproximar da universidade?
Vamos criar um centro de inovação no ITA. Nesse espaço, queremos criar projetos de tutoria com as empresas. A ideia é que os nossos parceiros principais, como Embraer e Boeing, tragam desafios de engenharia capazes de seduzir os alunos logo no primeiro e segundo ano de ensino.
O que as empresas ganham com as parcerias?
O nosso aluno é o nosso melhor produto. A primeira razão da decisão de onde uma pessoa vai trabalhar é entusiasmo. A segunda é salário. Estamos dando a oportunidade para os nossos parceiros de oferecer no centro de inovação projetos absolutamente desafiadores, que façam um aluno ficar apaixonado pelo tema e seja estimulado a trabalhar com eles.
QUEM É
Professor doutor, natural de Curitiba, é formado em Engenharia de Eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, turma de 1979. Concluiu o mestrado em 1988, e o doutorado em 1996, ambos em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas. Pós-doutorado nos Estados Unidos pela Columbia University, no ano de 2005.
FONTE: Estado de São Paulo