Rússia vive dilema sobre os contratos técnico-militares e energéticos com venezuela após morte de Chávez, mas já vê outros potenciais parceiros na América Latina.
Em entrevista exclusiva ao jornal “Rossiyskaya Gazeta”, Davidov fala também sobre as perspectivas de fortalecimento de contatos econômicos entre Rússia e os outros países latino-americanos, questão debatida nesta semana na primeira Conferência Internacional de Investimento Russo-latino-americana.
Rossyiskaya Gazeta: A Conferência Internacional de Investimento Russo-latino-americana foi realizada em Moscou, mas a iniciativa partiu dos embaixadores dos países dessa região. O que os latino-americanos querem da Rússia?
Vladímir Davidov: Nosso país tem uma boa imagem no que diz respeito à demanda efetiva, por isso é extremamente interessante para os latino-americanos, na qualidade de mercado promissor. Além disso, eles sabem que a Rússia, em cooperação com outras potências, pode desempenhar um papel importante no cenário mundial e servir, se é que posso dizer assim, de contrapeso para os ditames unilaterais. Por isso eles estão interessados em uma parceria conosco também nesse ponto.
RG: E no que consiste o interesse do nosso país?
V.D.: No desenvolvimento de uma cooperação comercial e econômica, é claro. Em meio a uma recessão da economia europeia e incerteza nos EUA, cresce a importância dos mercados de países latino-americanos e do Caribe que, ao serem testados pela crise, obtiveram êxito. Após um biênio difícil 2009-2010, nosso volume de comércio com a América Latina se recuperou, retornando ao nível dos US$ 16 bilhões. Mas existe um potencial para o desenvolvimento de parceria nessa área. Ele só precisa ser implementado.
RG: Além de Rússia e EUA, também União Europeia e China estão competindo pela América Latina. Quem está em vantagem atualmente e será que vale a pena continuarmos a lutar por essa região?
V.D.:As estatísticas mostram que a presença econômica dos EUA na América Latina está diminuindo. Isso é visível também pela distribuição da influência política. A presença da União Europeia se estabilizou após o rápido crescimento dos anos 1990. A China mostra realmente uma dinâmica impressionante. Atrás dela vêm se sobressaindo Índia, Turquia, Irã, Coreia do Sul… Infelizmente, estamos muito atrás de toda uma série de novos parceiros dos países da América Latina.
Naturalmente, temos de lutar, aprender a trabalhar com uma ampla gama de concorrentes diretos e indiretos. Mas eu não mediria nossos interesses usando a região como um todo. Essa abordagem está desatualizada.
Há determinados países da América Latina, com os quais cooperar seria especialmente promissor para a Rússia. É sobre eles que vale a pena conversar.
RG: Quais são esses países?
V.D.: Em primeiro lugar, o Brasil. Ele está entre as dez maiores economias do planeta. Esse país tem trabalhado com sucesso na indústria de aeronaves. E essa área poderia ser objeto da nossa cooperação frutífera.
Pode-se também falar sobre projetos comuns na exploração espacial, no uso do Glonass (Sistema de Navegação Global por Satélite) e na exploração de depósitos da plataforma continental.
Com a Argentina, poderiam ser implementadas parcerias para o desenvolvimento no campo da utilização pacífica da energia atômica, na construção e modernização de usinas hidrelétricas e termoelétricas, no transporte ferroviário.
Naturalmente, é preciso desenvolver relações com Cuba. É uma tradição, é inércia, no bom sentido. Também estamos interessados no México, com seu volume bilionário de transações comerciais. Lá pode haver cooperação nos setores de exploração de gás e minérios, de energia e de transporte.
RG: Mas será que os EUA vão ceder esse filão?
V.D.: Eles não precisam ceder nada. Nós mesmos temos possibilidade de ocupar nichos bastante promissores no mercado mexicano.
RG: E quanto à Venezuela? A Rússia conseguirá preservar o relacionamento anterior e os acordos, por exemplo, em relação à cooperação técnico-militar?
V.D.: Essa é uma pergunta difícil, porque a própria situação no país é muito complicada. O atual presidente, Nicolás Maduro, que herdou o cargo de Hugo Chávez, pretende manter integralmente todos os compromissos e obrigações nas relações com a Rússia.
Mas muito dependerá da situação econômica da Venezuela, do nível dos preços do petróleo no mercado mundial. Eles determinam a solvência econômica do país. A propósito, o líder da oposição Henrique Capriles, que está questionando os resultados da última eleição presidencial, é contrário à manutenção do atual nível de cooperação técnico-militar com a Rússia, mas não se opõe à cooperação no setor de energia e de uma série de grandes projetos industriais.
Também deve-se ter em mente que, com a continuidade da crise econômica mundial é difícil garantir algo. A economia da Venezuela não está imune à recessão. O resultado da escolha sobre onde gastar dinheiro, em uma situação crítica, pode não ser favorável à Rússia.