Embraer na mira

Americanos acusam gigante brasileira de ter pago propina para vencer duas licitações. As acusações podem prejudicar negócios futuros da companhia?

Terceira maior fabricante de aeronaves do mundo, quarta maior exportadora do Brasil e dona de um faturamento anual na casa dos R$ 12 bilhões, a Embraer sempre foi motivo de orgulho nacional. Sua reputação, porém, está agora ameaçada. Na semana passada, o jornal americano “The Wall Street Journal” e a agência Reuters publicaram uma denúncia contra a empresa brasileira. Segundo investigação da Justiça americana, a Embraer é suspeita de ter pago propina para vencer duas licitações, uma na Argentina e outra na República Dominicana. No caso argentino, é questionada a venda de 20 jatos E-190 para a Austral Lineas Aereas Cielos del Sur entre 2008 e 2009, em um negócio de US$ 900 milhões. Já o contrato firmado com a República Dominicana era referente à venda de oito Super Tucanos, no valor de US$ 90 milhões, em 2008. O então diretor de projetos especiais para as Forças Armadas dominicanas, o hoje coronel aposentado Carlos Piccini, teria cobrado US$ 3,4 milhões de comissão para facilitar o acordo comercial. Dois anos depois, a República Dominicana de fato fechou a compra das aeronaves para o combate ao tráfico de drogas e a defesa de suas fronteiras. Como a Embraer negocia ações na Bolsa de Valores de Nova York, a investigação é conduzida em conjunto pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos e pela Securities and Exchange Comission, agência responsável pela regulação de valores mobiliários.

SUPER TUCANO

A aeronave campeã de vendas da Embraer está no centro de um escândalo de corrupção investigado por autoridades americanas

A repercussão das acusações tem potencial para prejudicar negócios futuros da companhia, principalmente na área de defesa, uma de suas principais apostas. Coincidentemente, as denúncias surgiram pouco depois de a Embraer vencer uma licitação do próprio governo americano. No ano passado, a fabricante brasileira ganhou uma concorrência para fornecer 20 Super Tucanos A-29 à Força Aérea dos Estados Unidos. O contrato, que previa o envio das aeronaves ao Afeganistão, valia US$ 400 milhões, mas podia chegar a US$ 1 bilhão. A Embraer sofreu com o lobby nacionalista da concorrente derrotada, a americana Hawker Beechcraft, e de deputados do Estado do Kansas. Resultado: o contrato foi cancelado sem maiores explicações. A licitação foi refeita em 2013 – e a Embraer venceu novamente. Nesse jogo de interesses, os Estados Unidos também podem sair derrotados. A americana Boeing disputa com a sueca Saab e a francessa Dassault a licitação para fornecer 36 caças à Força Aérea Brasileira, em um negócio estimado em mais de US$ 4 bilhões.

“As denúncias afetaram a imagem internacional da Embraer”, diz Salvador Raza, professor do Defense Institution Reform Initiative da Naval Postgraduate School, da Califórnia. “Quando se contesta a ética da empresa, isso imediatamente é transferido para o produto, não importa quão bom ele seja.” Segundo Raza, o impacto das denúncias pode fazer a Embraer perder competitividade em licitações futuras. Os documentos obtidos pelo “The Wall Street Journal” mostram que a Embraer é acusada por violar uma lei americana antissuborno e que autoridades dos Estados Unidos trataram do assunto com seus pares brasileiros numa conferência internacional de combate à corrupção em Paris, em 2012. Os americanos disseram que tinham provas do suborno, incluindo históricos bancários e e-mails. De acordo com o jornal, os pagamentos foram ocultados como honorários de um acordo para o Reino da Jordânia, que nunca ocorreu.

Em seu relatório anual relativo a 2012, a Embraer reforça que desde 2008 é signatária do Pacto Global da ONU e tem compromisso com o combate à corrupção. Nele, a empresa declara que, no ano passado, quatro de suas operações, responsáveis por 17% do faturamento total, passaram por “análises de riscos relacionados à corrupção”. São elas Embraer Defesa&Segurança, Atech, OrbiSat e OGMA. A expectativa do relatório era que, em 2013, todos os empregados considerados “em exposição” passassem por um treinamento anticorrupção, que inclui tópicos sobre concessão de brindes e presentes e tratamento com entidades públicas. Procurada pela ISTOÉ, a Embraer não disponibilizou nenhum porta-voz. Em nota, disse que “divulga, desde 2011, a existência de um processo interno de investigação relativo a certas operações comerciais ocorridas fora do Brasil”, e que coopera com as autoridades. A empresa também afirma que a investigação é sigilosa e, portanto, não pode se pronunciar. “Sempre que a Embraer foi procurada para comentar esse assunto, reiterou sua impossibilidade legal de fazê-lo, pelo que lamenta quaisquer especulações antes da efetiva conclusão da investigação.”

FONTE: ISTO É – Mariana Queiroz Barboza

“Titulo original: Embraer no alvo”

Sair da versão mobile