“Sem possuir armas próprias, nenhum principado estará seguro; estará, antes, à mercê da sorte, não existindo virtude que o defenda nas adversidades”
(Maquiavel)
Porém, tem interesses a defender, responsabilidades a assumir e papel a desempenhar no tocante à segurança e defesa, em níveis hemisférico e mundial, em face de sua estatura político-estratégica no concerto das nações.
O primeiro objetivo de nossa política de defesa, portanto, deve ser a de assegurar a defesa dos interesses vitais da nação contra qualquer ameaça forânea. Não se pode precisar, a priori, a fronteira entre os interesses vitais e os interesses estratégicos. Os dois devem ser defendidos com ênfase e determinação. Essencialmente, os interesses estratégicos residem na manutenção da paz no continente sul-americano e nas regiões que o conformam e o rodeiam, bem como os espaços essenciais para a atividade econômica e para o livre comércio (Setentrião Oriental, Costão Andino, Cone Sul e Atlântico Sul).
Fora desse âmbito, o Brasil tem interesses que correspondem às responsabilidades assumidas nos Fóruns Internacionais e Organismos Multilaterais e ao seu status na ordem mundial. Este é conformado por combinação de fatores históricos, políticos, estratégicos, militares, econômicos, científicos, tecnológicos e culturais. Sem defesa adequada, a segurança nacional e a perenidade desses interesses estarão seriamente comprometidos e, consequentemente, não poderão ser assegurados. Daí, ressalta-se a imperiosa necessidade de contarmos com Forças Armadas preparadas, suficientemente poderosas e aptas ao emprego imediato, capazes de desencorajar qualquer intenção de agressão militar ao país, pela capacidade de revide que representam.
Essa estratégia é enfatizada para evitar a guerra e exige, como corolário, o fortalecimento da expressão militar do poder nacional, além de impor excelente grau de aprestamento e prontificação das Forças Armadas, desde o tempo de paz, através da realização de treinamentos, exercícios operacionais dentro de cada força singular, não sendo excluída a necessidade de planejamento e do treinamento de operações conjuntas e combinadas no âmbito das FFAA.
O estudo da História, particularmente da História Militar de uma nação, conduz a conclusões e realça aspectos capazes de influir na expressão militar de seu poder nacional. O estudo das campanhas militares, com seus erros e acertos, o respeito às tradições, o culto aos heróis etc, trazem reflexos à formulação da doutrina, ao moral e à estrutura militares.
As tradições históricas e militares constituem, ainda, fatores de influência sobre a expressão militar. Essas tradições, que cumpre cultuar e manter, não devem, por outro lado, apresentar obstáculos intransponíveis à evolução, ao desenvolvimento e à tecnologia militares. No equilíbrio entre essas idéias, às vezes opostas, está o acerto que revigora a expressão militar.
Assumem, também, papel de destaque, os aspectos qualitativos dos recursos humanos; o apoio em maior ou menor grau da opinião pública nacional e mesmo internacional; a coesão interna e a vontade nacional. E, nesse contexto, ressalta a fundamental importância do povo – expressão máxima das forças vivas da nação – como verdadeiro esteio das Forças Armadas, quando a elas se une, nelas se apóia e com elas se confunde. A população traduz sua indispensável solidariedade à expressão militar através da opinião pública, que deve constituir, sem dúvida, preocupação constante quando se pretende manter em alto nível aquela expressão do poder nacional. Nesse sentido, é imperioso o esforço para conservar integrados o homem militar e o homem civil, sem discriminações de qualquer natureza, sem privilégios, embora respeitadas suas diversas, mas naturais, destinações.
O papel que caberá às Forças Armadas brasileiras nas próximas décadas é multifacetado e deve estar calcado em amplo debate, cujo resultado deverá sertão satisfatório quanto maior for o desenvolvimento da sociedade.
O esboço de qualquer arranjo de defesa, em Estado democrático, para que possa contar com recursos, deve estar respaldado por base de legitimidade.
Entendemos que, para a consecução desses objetivos, devem ser consultadas personalidades representativas de diferentes espectros de opinião: ministros de Estado, acadêmicos, analistas políticos, economistas, diplomatas, militares, jornalistas, todos com reconhecida competência na área de defesa e alguns críticos do atual sistema de defesa nacional. Evidentemente, não se trata de deixar em mãos desses pensadores a formulação de políticas e estratégias militares. Trata-se, tão-somente, de ouvi-los e de reunir novos conceitos e idéias que permitam oxigenar antigos preceitos e identificar referenciais para a defesa do país, as quais estejam mais em sintonia com os desafios dos novos tempos e consentâneos com a realidade nacional.
Tais contribuições, depois de avaliadas por setores competentes do Ministério da Defesa, poderão ou não ser incorporadas no planejamento estratégico.
Indubitavelmente, para a consecução dessa tarefa, mister se faz uma conjunção de esforços. Nesse sentido, somam-se, num processo sinérgico, o imprescindível apoio do presidente da República, a compreensão do Congresso Nacional, a efetiva colaboração do Ministério da Defesa e de outras áreas do governo, a confiança e o respaldo dos comandantes das Forças e a ativa participação de todas as forças vivas da nação.
Temos plena consciência de que não se pode justificar a hipertrofia das Forças Armadas em prejuízo do processo de desenvolvimento da nação, mas não se pode admitir, por ilógico e temerário, que a expressão militar do poder nacional seja colocada em plano inferior – vivenciando processo gradual de sucateamento e de desmantelamento devido à crônica insuficiência de recursos financeiros -, na falsa concepção de que a prioridade absoluta deve ser dada ao desenvolvimento. Não existem nações desarmadas, porque nenhuma delas seria capaz de desfazer-se de sua expressão militar para merecer, por esse ato ingênuo, o respeito e a simpatia de todos os países. Não há fórmula miraculosa capaz de manter a paz sem ameaças de conflitos internos ou de guerra entre os povos.
A benfazeja e oportuna aquisição de 36 aeronaves de caça Gripen NG, da empresa sueca Saab, após 12 anos de sofrida espera, nos contempla com um certo alívio no que concerne à operacionalidade da FAB, mas não diminui as nossas preocupações com relação ao imprescindível equilíbrio de forças que deve existir no cenário geopolítico sul-americano.
Torna-se imperativo e oportuno conferir mais prestígio às Forças Armadas e racionalizar, modernizar e fortalecer o aparato defensivo brasileiro. Lembremo-nos das sábias palavras do insigne Barão do Rio Branco, o Chanceler da Paz, que, habitualmente, enfatizava a imperiosa necessidade de possuirmos um bom sistema de armas para respaldar as nossas proposições no concerto das nações.
FONTE: Portal Monitormercantil por Manuel Cambeses Júnior – Coronel-aviador reformado, conselheiro do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica e conferencista especial da Escola Superior de Guerra (ESG)