Uso contínuo preocupa Forças Armadas

Forca-Nacional-e-PRF-Copa-do-mundo-Fifa-2014-Brasil

BRASÍLIA – Quando se fala de Exército, normalmente se pensa no combate a um elemento externo. No entanto, mais e mais as tropas federais vêm sendo chamadas para ações “fora da normalidade”. Pior: a preocupação maior dos militares é que eles têm sido chamados para tudo, desde garantia da lei e da ordem, como durante a Rio-2016, passando pelo socorro à segurança no Rio Grande do Norte até a distribuição de água, comida, vacinas, atendimento cívico e social.

Na semana passada, em 48 horas, o Exército recebeu dois novos chamados de socorro. O primeiro, do Acre, a pedido do governador, diante da seca severa que atinge várias cidades. O segundo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a pedido do governo do Rio, para que as Forças Armadas permaneçam nas ruas até novembro, depois das eleições. Nos dois casos, como em todos os outros, as tropas vão se preparar para atender ao pedido e executar o que eles chamam de “missão”.

Chamados desde o início do processo para coordenar o sistema de segurança da Olimpíada, que teve a abertura oficial na sexta-feira, os militares não estão satisfeitos com as multifunções que têm sido atribuídas, sem o devido reconhecimento. A prática se acentuou durante os governos petistas e acabou levando as Forças Armadas, particularmente o Exército, a receber dois apelidos: “Bombril” – pelas mil e uma utilidades – e Posto Ipiranga – um lugar completo, em qualquer lugar, onde é possível encontrar tudo o que se precisa.

Apesar das preocupações com os diversos braços de atuação em missões que não são as originalmente constitucionais, os militares reconhecem a necessidade de serem empregados em muitos casos e atendem, prontamente a todos os chamados. “O problema é que os chamados fora da destinação principal têm sido cada vez mais frequentes”, comentou um general da ativa, que prefere o anonimato. A avaliação dessas autoridades é que “o Exército deve ser o último recurso, mas não é bom que o último recurso seja usado a toda hora”.

Para este oficial-general “os governadores, em razão desta facilidade de chamar os militares para tudo, acabam negligenciando alguns pontos da questão de segurança”. Segundo o militar, “é o caso do Rio de Janeiro, que está completamente desmontado, e tem usado o Exército em seguidas oportunidades para tentar garantir estabilidade e isso é um inferno, com potencial de encrencas e problemas incontáveis.”

Problema olímpico

No caso da Olimpíada, de acordo com os militares, o uso de Forças Armadas para auxílio na segurança é até tradição, em todos os países. Mas o problema, comentam eles, é a forma e a falta de programação e previsão para a solicitação deste emprego. Desde 2014, quando começaram as primeiras reuniões preparatórias para a Rio-2016, os militares advertiram sobre as dificuldades de se recrutar, reunir e gerenciar um grupo de 10 mil pessoas para executar a missão de revista pessoal, controle nas entradas das arenas, segurança e fiscalização interna nos 51 pontos de competições. Apesar das advertências reiteradas, apenas em junho deste ano o governo federal abriu a concorrência para a contratação de 5 mil pessoas para fazer estes serviços. “Obviamente, não conseguiram”, comentou um militar. No momento, esta seria a principal brecha na segurança dos jogos.

Outro problema apontado pelos militares foi que o Ministério da Justiça não conseguiu reunir os 9,6 mil homens prometidos para integrar a Força Nacional, para executar missões de segurança nas vias do Rio e nos locais de competição. Menos de 5 mil chegaram ao Rio. Sem pessoal, no fim de maio, o governo do Rio pediu reforço das Forças Armadas. Para os militares, esse emprego tem riscos. O principal é que o soldado não é treinado para enfrentamento ao crime. Ele é treinado para a guerra.

Outro problema nesta convocação de militares foi quando o governo decidiu conceder uma diária de R$ 550 para os PMs dos Estados que foram chamados. Um militar receberá R$ 30 de diária. Uma desproporção para trabalhos semelhantes.

RN tem contado com auxílio federal desde o ano passado

 Ao lado do Rio de Janeiro, o Rio Grande do Norte pode ser apontado como um Estado que vem usando as forças federais como “muletas” para garantir a segurança pública nas crises. Foi assim após a rebelião no sistema carcerário em 2015 – que, para a Justiça, terminou fortalecendo a facção Sindicato RN  – e foi assim na semana passada.

Para o governador Robinson Faria (PSD), não havia opção. O Rio Grande do Norte tem taxa de 46 mortes para cada 100 mil habitantes, segundo as informações do Anuário do Fórum Brasileiro da Segurança Pública de 2015. É o terceiro Estado mais violento. “Fiz todo tipo de tratativas. Promovi policiais, equipei a polícia, dei aumento, mas acabamos descobrindo que os indicadores não estavam atendendo aos anseios do povo.”

O diagnóstico, segundo ele, foi que a liberdade dos presidiários em se comunicar com o mundo fora dos muros era “a raiz do problema” de segurança nas ruas. E a decisão política, tomada no começo do ano, foi colocar bloqueadores nas cadeias. A ideia era ir para o embate com as facções criminosas – mesmo sem condições de vencer sozinho e ter de pedir ajuda. / COLABOROU BRUNO RIBEIRO

Sair da versão mobile