Oficiais militares do Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército (CPEAEx) fazem uma reflexão sobre as possibilidades de conflitos no Atlântico Sul, com propostas de ações para o País fazer frente a ameaças nessa área estratégica.
A fim de contextualizar o emprego da Força Terrestre sob a perspectiva de conflitos no Atlântico Sul e em consonância aos propósitos estipulados pelo EME para o Projeto Interdisciplinar do CPEAEx no ano de 2015, o trabalho desenvolvido teve como objetivo analisar as possibilidades de conflitos no Atlântico Sul, elaborando propostas de ações para fazer frente a ameaças nessa importante área estratégica.Historicamente, a importância do Atlântico Sul está ligada ao desenvolvimento da navegação em mar aberto a partir do final do século XV. O domínio marítimo britânico nos séculos XVII, XVIII e XIX proporcionou a criação de uma diagonal insular no Atlântico Sul, que permanece sob domínio inglês até os dias atuais. A Inglaterra não é a única nação europeia que mantém sua presença no Atlântico Sul. A França manteve seu interesse no continente sul-americano por meio da Guiana Francesa, território ultramarino, praticamente na entrada do Atlântico Sul.
Da análise das tensões e conflitos recentes ocorridos na América do Sul entre nações com projeção para o Atlântico: o episódio conhecido como “Guerra da Lagosta”, na década de 60; a questão de Itaipu e influência sobre a Bacia do Prata, na década de 70; a questão do Canal de Beagle e Cabo Horn, nas décadas de 70 e 80, e a Guerra das Malvinas, em 1982, observa-se a incidência de quatro grandes atores. As duas potências europeias com territórios no hemisfério sul, França e Inglaterra, e os dois maiores países da América do Sul com projeção para o Oceano Atlântico, Brasil e Argentina.
Na continuação desta análise, foram levantadas como possíveis causas de tensões e conflitos futuros na área geoestratégica do Atlântico Sul o interesse internacional na descoberta de novas reservas petrolíferas, bem como de recursos minerais e pesqueiros na plataforma continental brasileira e na costa africana. Também no litoral africano, a questão da pirataria no Golfo da Guiné pode ser escalada para uma tensão internacional.
Por último, a presença de atores extrarregionais como Rússia, China e Índia, pode vir a questionar a hegemonia americana nos oceanos. O aumento da presença e influência desses países no continente africano, nas áreas econômica e militar, bem com o lançamento dessas potências emergentes ao mar, pode suscitar nos EUA a necessidade de uma demonstração de sua força naval. Com isso, foram levantadas como as principais áreas focais no Atlântico Sul: o Cone Sul Africano onde se encontra o Cabo da Boa Esperança; o saliente africano e o Golfo da Guiné; a região do Estuário do Rio da Prata e sua projeção sobre o arquipélago das Malvinas; e a Foz do Rio Amazonas com sua projeção para o arquipélago de Fernando de Noronha. Dessas áreas, as duas últimas foram levantadas como as mais possíveis de serem atingidas por um conflito, tendo em vista o histórico contencioso e os atores envolvidos.
Conclui-se então que em um eventual conflito no Atlântico Sul, a FTer poderá ser empregada como: Comando de Zona de Defesa, comando conjunto ativado a partir de um ou mais Comandos Militares de Área situados no litoral; FTC para emprego em Operações Contra Desembarque Anfíbio, defesa de áreas litorâneas estratégicas e defesa de ilhas oceânicas; e no emprego de capacidades assimétricas Antiacesso/Negação de Área (A2/NA).
Da análise de se o Processo de Transformação do Exército estará coerente com o poder dissuasório necessário para um eventual conflito no Atlântico Sul, chega-se à conclusão que para o emprego da FTer em ações na ZD, o Projeto PROTEGER, que abrange a defesa de infraestruturas estratégicas críticas, juntamente com os Projetos DEFESA CIBERNÉTICA e DEFESA ANTIAÉREA são de capital importância. Para o emprego como FTC nas ações no litoral e defesa de ilhas oceânicas, o Projeto GUARANI, com a nova família de blindados sobre rodas que serão utilizados pelas unidades de Cavalaria e Infantaria, juntamente com o Projeto DEFESA ANTIAÉREA, possuem destaque. Para o emprego de capacidades assimétricas Antiacesso/Negação de Área (A2/NA), o Projeto ASTROS 2020, juntamente com os Projetos DEFESA CIBERNÉTICA e DEFESA ANTIAÉREA, contribuem sobremaneira para ao aumento do poder de dissuasão brasileiro contra um eventual oponente com poder militar superior. Em segundo plano para esta ação estão os Projetos GUARANI e OCOP, este último, devido à sua finalidade de aumentar a capacidade operacional da FTer com a dotação de produtos de defesa modernos e suficientes, permeia o emprego em todas as possibilidades.
Destaca-se a afirmativa de que, em um conflito armado no Atlântico Sul, o emprego das Forças Armadas ocorreria sob o escopo da doutrina de operações conjuntas, com foco na interoperabilidade e respeitadas as especificidades de cada Força. Nesse contexto, a FTer está inserida com seus projetos estratégicos indutores da transformação em consonância com seu emprego nessas possibilidades de conflitos. Finalmente conclui-se que é de suma importância que o Exército Brasileiro não apenas se organize para atuar em todo o espectro dos conflitos, como também em todos os cenários previsíveis mais perigosos, devido à impossibilidade de se saber, de antemão, em que grau de gravidade os nossos interesses essenciais poderão ser ameaçados futuramente.
AUTORES:
Cel Inf SAMUEL VIEIRA DE SOUZA
Cel Inf ANATÓLIO DOS SANTOS JUNIOR
Cel Art LUÍS FERNANDO GONÇALVES
Cel Com FERNANDO COSTA ADAM
Cel Cav ROGÉRIO MARQUES NUNES
Cel Av MAURO BELLINTANI
CMG FN JORGE LUIZ CORDEIRO DAS NEVES