Presidente Michel Temer fala à revista Tecnologia & Defesa
Michel Temer foi eleito vice-presidente em 2010 e reeleito, em 2014. Ocupou por três vezes a presidência da Câmara dos Deputados e está licenciado da presidência do PMDB Nacional, para a qual foi eleito em 11/09/2001 e reeleito outras cinco vezes.
Como vice-presidente, recebeu como principais atribuições a defesa do interesse do País em foros, encontros e negociações internacionais. Chefiou missões para discutir temas de relevo com alguns dos principais líderes mundiais. Visitou países do Oriente Médio, das Américas, da Europa e da África com a missão de divulgar a economia brasileira, apontando oportunidades de investimentos e parcerias. Também presidiu dois fóruns de discussões internacionais com os governos da China e da Rússia.
No âmbito interno, enquanto vice-presidente, também coordenou o Plano Estratégico de Fronteiras, baseado nas operações Sentinela e Ágata, oportunidade na qual concedeu sua primeira entrevista a Tecnologia & Defesa. É autor dos livros “Constituição e Política”, “Territórios Federais nas Constituições Brasileiras e Seus Direitos na Constituinte” e “Elementos do Direito Constitucional”. Foi deputado constituinte e esteve à frente da Secretária de Segurança Pública de São Paulo por duas ocasiões, tendo criado os Conselhos Comunitários de Segurança (CONSEGS) e a primeira Delegacia da Mulher no Brasil. Também instituiu a Delegacia de Proteção aos Direitos Autorais, importante instrumento de combate à pirataria, e a Delegacia de Apuração de Crimes Raciais.
Familiarizado com assuntos relativos aos temas Defesa Nacional, Forças Armadas e Segurança Pública, o presidente Michel Temer tem, hoje, como seu principal objetivo retirar o Brasil da mais profunda crise de sua história, colocando-o no rumo da recuperação econômica e ética, anseios de toda a sociedade. Nesse contexto, com uma agenda bastante complexa o presidente, gentil e atenciosamente, concedeu esta entrevista exclusiva à Tecnologia & Defesa.
ENTREVISTA
Tecnologia & Defesa – O Brasil vem passando por um período de dificuldades de ordem econômica, talvez, sem paralelo na sua história recente. A chegada do senhor ao posto máximo da República, sem dúvidas, trouxe alento quanto equacionamento dessas questões e uma visão de futuro sustentável, embora não sejam poucos os percalços a serem ultrapassados. O senhor poderia discorrer sobre esse esforço que vem sendo conduzido sob sua gestão?
Presidente da República Michel Temer – Quando assumi interinamente a Presidência da República, o Brasil estava mergulhado numa profunda recessão e, com muito trabalho e diálogo com os diversos setores, saímos dela. Em menos de um ano, a economia brasileira mostra sinais de recuperação. Para se ter uma ideia, a inflação, que em janeiro de 2016 era da ordem de 10,7%, caiu para 5,35% em janeiro de 2017. Aprovamos medidas importantes no Congresso Nacional, como a Desvinculação das Receitas da União; a PEC do Teto, que limita o crescimento das despesas do governo durante os próximos dez anos e permite ao País ter suas contas sob controle; extinguimos mais de cinco mil cargos em comissão e funções de confiança; liberamos os recursos do FGTS; trabalhamos em reformas importantes como da Previdência e Fiscal. O significado dessa e outras inúmeras medidas que tomamos é a restauração da confiança e da credibilidade no Brasil. Por essa razão, os investimentos começaram a aumentar, o real se valorizou frente ao dólar e o risco Brasil recuou 51,3% em um ano. Os juros também começaram a cair. Tenho dito frequentemente que eliminamos a recessão e agora vamos para o desenvolvimento e crescimento do País. O Brasil tem rumo.
T&D – Uma das marcas iniciais do governo do Sr foi mudança nos rumos da política externa do Brasil, através do Itamaraty. O senhor poderia comentar esses novos rumos?
Presidente Temer – Recolocamos a política externa a serviço do Brasil e em sintonia com as nossas prioridades. Temos aproveitado o potencial da diplomacia como instrumento para a retomada do crescimento e a geração de empregos. Essa é uma vocação que a diplomacia tem: abrir mercados e atrair investimentos. Em minhas viagens, a mensagem é clara: o Brasil está pondo a casa em ordem, o momento é de oportunidades. A política externa de meu Governo está alinhada com o esforço de superação da crise. Está alinhada também com a nossa melhor tradição de universalismo e defesa das liberdades e dos direitos humanos. O Brasil se relaciona com todos os países. Anima-nos a busca do consenso, com base no respeito e no diálogo. Na América do Sul, nossa vizinhança imediata, atuamos, com nossos parceiros regionais, na construção de um espaço de democracia e de prosperidade. Também cooperamos com esses parceiros no combate ao crime organizado transnacional, em nome da segurança de nossas cidades, de nossas escolas, de nossas famílias.
T&D – A indústria de defesa e de segurança é especialmente alavancada por novas tecnologias e potencialmente exportadora. Como o governo poderia ajudar a promover os produtos brasileiros do setor, tomando como exemplo o trabalho institucional feito pelas lideranças políticas das grandes potências mundiais?
Presidente Temer – A indústria de defesa está na pauta do Governo. Trata-se de setor de ponta, que forma profissionais altamente qualificados, move a pesquisa e produz inovação, aspectos fundamentais para uma nação moderna. Há, ainda, uma clara relação entre defesa e desenvolvimento: além de criar empregos, a consolidação da indústria de defesa tem efeito irradiador, que beneficia outras áreas, como a de aviação civil. O nosso Governo tem atuado com empenho para aprimorar o ambiente produtivo no Brasil e fazer com que as nossas exportações sejam cada vez mais competitivas. Esse esforço vale também para a indústria de defesa.
T&D – Em épocas de contração econômica, os orçamentos da Forças Armadas estão entre os mais atingidos por medidas restritivas. Isso se reflete negativamente em aspectos como o reequipamento e a atualização tecnológica, e a própria manutenção dos níveis de operacionalidade desejáveis. Como a sua administração está acompanhando esta questão? De que modo o atual quadro pode, ou não, influir na reavaliação da Estratégia Nacional de Defesa em curso?
Presidente Temer – É verdade que enfrentamos um momento de ajustes, em que se faz necessário um redimensionamento das despesas de acordo com a receita. No entanto, há setores que merecem mais atenção, como é o caso de Educação, Saúde e Segurança. Aumentamos em R$ 10 bilhões o orçamento da Saúde e outros R$ 10 bilhões o da Educação em 2017, em relação a 2016. Nas áreas de Segurança e Defesa estamos impulsionando os projetos estratégicos das Forças Armadas, que andavam a passos lentos na gestão anterior por falta de recursos. O pagamento realizado em 2016 foi significativamente superior ao de 2015. Enquanto em 2015 foram pagos R$ 16,5 bilhões, em 2016 foram pagos R$ 21,3 bilhões, representando uma elevação de R$ 4,8 bilhões. A proteção das nossas fronteiras é imprescindível para o combate a ilícitos.
T&D – Embora o Governo Federal conceda aos Estados a isenção de impostos na compra de material de defesa e segurança, a recíproca não ocorre no caso de compras dos órgãos federais e tampouco entre os Estados. Considerando-se que a liberação do ICMS ampliaria o poder de compra dos órgãos federais e forças polícias estaduais, existe no governo algum estudo visando ampliar a isenção fiscal a este setor estratégico para a sociedade brasileira?
Presidente Temer – De fato, este é um problema recorrente enfrentado pelo setor e algumas tratativas já foram iniciadas com o objetivo de amenizar distorções. Estamos conversando com secretários de Fazenda dos Estados para tratar justamente da ‘bitributação’ do ICMS.
T&D – Projetos de materiais de emprego militar, os MEM, demandam longo tempo desde a sua até a entrada em serviço. A isso se soma também o fator escala de produção. Assim é necessário um fluxo constante de recursos para o cumprimento dos prazos previstos. Considerando-se o ganho em conhecimento e domínio tecnológico que os MEM trazem agregados, como o senhor entende que se possa manter um ritmo que seja o mais adequado possível para esses dentro da realidade atual?
Presidente Temer – Como disse, a defesa é um setor importante para o desenvolvimento nacional. E a produção de materiais e equipamentos para atender ao setor requer elevado nível tecnológico e transferência de tecnologia. Mas somente com o País equilibrado economicamente, com as contas em dia, é possível criar um ambiente de negócios favoráveis, investir e desenvolver o setor. E esse é o dever de casa que estamos fazendo com as reformas que enviamos ao Congresso.
T&D – Por sua relevância no contexto mundial, seria natural que o Brasil fosse exportador e não importador de material de defesa e segurança. Porém, a legislação atual estimula a importação desse tipo de material com alíquota zero. Como o governo vê essa questão?
Presidente Temer – Mesmo contando com uma Base Industrial de Defesa consolidada e com elevado nível de conhecimento, alguns produtos e tecnologias que ainda não dominamos precisam ser importados. A redução do volume de importações de produtos com alto nível tecnológico depende do investimento interno nas nossas indústrias. A meu ver é importante, neste momento, investir em projetos que tragam novas tecnologias para o Brasil. Nessa linha, estamos incentivando pesquisas.Só para o Ministério de Ciências, Tecnologia, Inovação e Comunicações aumentamos o aporte para pesquisas em 5,65%. Por outro lado, a partir de 21 de março deste ano, data marcada para o lançamento do satélite geoestacionário de comunicações, em Kourou, na Guiana Francesa, o Brasil contará com um novo sistema de comunicação por satélite, capaz de abrigar o tráfego de informações das Forças Armadas e ainda permitir a ampliação da banda larga, tornando possível, desta forma, o acesso mais rápido e eficaz à Internet para brasileiros de regiões longínquas
T&D – Dentro de uma nova realidade mundial, em tempos de globalização e internet, como o senhor interpreta os conceitos de soberania nacional?
Presidente Temer – Vivemos em um mundo onde não há fronteiras quando falamos sobre internet, o que se torna um desafio muito grande para todos os países. Garantir a segurança e fluidez de informações importantes para o País requer investimentos. Logicamente que nenhum país está imune a ataques cibernéticos, mas o Brasil tem desempenhado o seu papel e investido de forma decisiva nesta questão. Um exemplo disso foi o trabalho desenvolvido pelas Forças Armadas nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016. Mostramos ao mundo um trabalho sério de segurança da informação. Apesar das muitas tentativas, nenhum ataque cibernético foi capaz de atrapalhar o brilho dos eventos.
T&D – As Forças Armadas são instituições permanentes e com caráter que, não raro, transcende sua destinação constitucional, notadamente como fator de integração nacional. Qual é o pensamento do senhor a respeito?
Presidente Temer – As Forças Armadas brasileiras estão sempre prontas para cumprir a sua missão constitucional. São a presença do Estado de norte a sul do país e, principalmente, nos lugares mais distantes, para onde levam segurança e assistência à população. Como coordenador do Plano Estratégico de Fronteiras, tive a grata satisfação de acompanhar o trabalho dos militares do Exército, da Marinha e da Aeronáutica nas operações Ágata, que contam com o apoio de outras respeitadas instituições federais e estaduais. Um trabalho sério, exemplar, tendo como foco o bem do País. Já no meu governo, as Forças Armadas atuaram com êxito nas Olimpíadas, bem como nos estados diante da crise de segurança pública em operações de Garantia da Lei e da Ordem, como no caso recente do Espírito Santo e Rio de Janeiro. Cito ainda o trabalho de varreduras em presídios, apoiando os órgãos de segurança dos estados. Claro que essas foram atuações emergenciais em que tivemos que empregar as Forças Armadas, mas tenho claro que o papel desses militares não é de polícia. Essa é uma tarefa dos estados.
T&D – Uma das maiores preocupações da população brasileira está relacionada à segurança pública. O governo, recentemente, apresentou um Plano Nacional de Segurança para enfrentar o problema, onde se prevê, inclusive, uma efetivação da FNS. O Sr entende essa medida como suficiente? Não seria também o caso de se propor uma ampla revisão de todo o arcabouço jurídico penal de modo a termos leis mais em sintonia com a grave realidade vivida hoje? O que a sociedade pode esperar da criação do Ministério da Justiça e Segurança Pública levando-se em conta as atribuições definidas na Constituição Federal?
Presidente Temer – O Plano Nacional de Segurança é uma ampla proposta de parceria entre o Governo Federal e os governos estaduais. A partir de três objetivos básicos – combate ao homicídio doloso, ao feminicídio e à violência contra a mulher; racionalização e modernização do sistema penitenciário; combate à criminalidade transnacional organizada, como tráfico de drogas e armas –, o Plano Nacional de Segurança traz um amplo espectro de ações que envolvem diversos órgãos ligados aos Ministérios da Justiça e Segurança Pública e de Direitos Humanos.Pela primeira vez o Governo Federal assume como prioridade o tema da Segurança em apoio aos estados, propondo ações concretas para enfrentar o problema. E esse é o grande diferencial. Repassamos aos estados R$ 1,2 bilhão do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN) para construção de presídios e compra de equipamentos. E mais R$ 230 milhões de reais para instalação e manutenção de bloqueadores de celular e construção de cinco novos presídios federais de segurança máxima.
Nota do Editor: O DAN agradece ao Sr. Francisco Ferro, editor chefe da revista T&D, parceira do DAN, o compartilhamento desta entrevista, e ao editor-adjunto da revista, Sr. Paulo Maia, responsável pela condução de todo o processo.