Relato do Primeiro Tenente Relações Públicas Vitor Amaral.
“No dia anterior ao resgate, houve a confirmação de que eu seria ‘o resgatado’, imediatamente veio aquele frio na barriga e o nó na garganta… pensei: Por que fui inventar de me voluntariar? Adoramos enfrentar desafios, mas quando ele está, de fato, à nossa frente, não é nada muito agradável, às vezes até um pouco assustador.
Seria muito mais fácil fazer a cobertura jornalística/mídias sociais do Exercício Operacional CSAR 2014 no pátio da Base Aérea de Campo Grande (BACG), registrando a chegada e saída de aeronaves e utilizando o apoio de computadores e internet na barraca operacional climatizada montada para o Exercício.”
O Exercício CSAR (Combat Search And Rescue) 2014, que aconteceu no início do mês de setembro na BACG, é um treinamento de busca e salvamento em combate. Ele consiste na coordenação e execução de uma Força Tarefa para resgate de militar ou civil em território inimigo, como por exemplo, um piloto ejetado em combate, um jornalista ou qualquer pessoa isolada ou sob domínio de forças hostis. Essa Força Tarefa envolve diversos vetores e fatores, como helicóptero de resgate, aeronaves de escolta, rotas planejadas para fuga das defesas inimigas, tropa de operações especiais para incursão em solo, enfim, um planejamento detalhado para enfrentar quaisquer tipos de ameaças.
Considerada uma das missões mais perigosas da guerra aérea moderna, uma operação CSAR se dá em condições totalmente adversas e complexas. No entanto, é comum que, por mais próxima da realidade que a simulação seja, “os resgatados” tenham a tranqüilidade de saber que serão encontrados e salvos, afinal trata-se de um treinamento.
Mesmo assim, o pouco tempo que fiquei isolado em um descampado, bem distante da cidade de Campo Grande, naturalmente refleti sobre as possibilidades de alguma coisa dar errado. A mente humana, especificamente a minha, é maravilhosa para imaginar e divagar sobre as possibilidades de um desastre.
Para “melhorar”, por obra do acaso, estava eu sem qualquer meio de comunicação com os militares do Centro de Comando e Controle na BACG, os amigos da operação, ou qualquer outro órgão de defesa, muito menos familiares, já que havia perdido o celular no dia anterior, durante a operação. Tudo conspirava para que o exercício adquirisse contornos um pouco mais próximos da realidade.
Naquela situação de desvantagem, isolado em um ambiente totalmente desconhecido, mesmo que por alguns instantes, o sentimento de abandono e de inutilidade veio logo à cabeça. Fiz o exercício de refletir sobre as dificuldades físicas e conflitos psicológicos de uma pessoa envolvida em uma situação real e percebi o quanto somos frágeis sem o aconchego do lar e a companhia de outras pessoas. Fomos criados para socializar, para compartilhar experiências, e naquele momento de solidão, mesmo se tratando de um treinamento, me senti apenas um número, uma “baixa”, algo que pudesse ser descartável, carregando apenas a insegurança e o medo de todos os sonhos e desejos serem interrompidos.
Em pouco tempo, as reflexões e o silêncio, intercalado pelo barulho da brisa batendo no mato seco, foram cessados pelo maravilhoso som do H-60 BlackHawk cortando os ares daquela região. A aproximação da aeronave trouxe também a segurança e a tranqüilidade de que o exercício ocorreria tudo conforme o previsto.
O helicóptero sobrevoou duas vezes ao meu redor, em baixa altura, aparentemente tentando confirmar minha localização. Na terceira volta, ele veio diretamente em minha direção. Seu nariz foi inclinando para cima, apontando para o céu, e a sua cauda fazendo o movimento inverso, apontando para o solo, e, em questão de segundos, a aeronave pousou – mais tarde fui saber que aquele movimento de extrema perícia e plasticidade é conhecido como “pouso de assalto”, usado especificamente para embarque e desembarque de tropas em território inimigo.
Uma equipe do Esquadrão Aeroterrestre de Salvamento (PARA-SAR) desembarcou da aeronave fazendo a cobertura e segurança do resgate. Um dos militares se aproximou, confirmou minha identidade, e me acompanhou até o embarque. Tudo foi muito rápido, em instantes já estávamos em pleno vôo, de volta à Base Aérea.
“Foi uma experiência incrível” – a frase é clichê, mas bem adequada. A oportunidade de participar ativamente do exercício (e da notícia), finalizando com um vôo de BlackHawk, permitiu-me não apenas cumprir com uma das atribuições típicas do trabalho de relações públicas – a divulgação dos assuntos de interesse público –, mas a possibilidade de realização de um sonho.