Ex-presidente, arrolado pela defesa de seu sucessor, declarou à Justiça Federal que, ao final de seu segundo mandato, ‘achou melhor não fazer uma compra que seria paga por outro governo’
Por Fábio Fabrini
“Depois de um longo processo de escolha, houve uma reunião e a decisão da FAB naquela época era de comprar os aviões suecos. Os suecos estavam dispostos a transferir tecnologia”, disse o ex-presidente tucano. “Não foi tomada a decisão. Como estava se aproximando o fim do meu mandato, achei melhor não fazer uma compra que seria paga por outro governo”, acrescentou.
Fernando Henrique depôs como testemunha de defesa de Lula na ação penal em que o petista é acusado de fazer tráfico de influência para que o governo da sucessora, Dilma Rousseff, adquirisse os caças da Saab e também para viabilizar a edição da medida provisória 627, editada pela petista em 2013, que prorrogou incentivos fiscais de montadoras de veículos.
A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) elencou mensagens e documentos mostrando que Lula teria tratado dos assuntos com os lobistas que trabalhavam pela contratação dos caças e a aprovação da MP. Como revelou o Estado em 2015, um deles pagou R$ 2,5 milhões ao empresário Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente. Os procuradores sustentam que o dinheiro foi uma remuneração pelo apoio oferecido por Lula.
A investigação sobre o caso não mostrou se, efetivamente, Dilma ou algum outro agente político chegou a ser influenciado por Lula ao tomar decisões. Somente o fato de “vender fumaça”, ou seja, oferecer a possibilidade de interferência em troca de vantagem, é crime, conforme o MPF.
Os advogados de Lula têm sustentado, com base em depoimentos de testemunhas, que a decisão dos caças foi técnica, tomada após estudos de uma comissão da FAB, e não foi influenciada por Lula.
Fernando Henrique disse que não se recorda de ter conhecido Mauro Marcondes Machado, lobista acusado de pagar R$ 2,5 milhões a um dos filhos de Lula para conseguir viabilizar os interesses da Saab e das montadoras que representava.
“Se conheço, não me recordo de quem seja. Em 86 anos, imagine quantas pessoas que eu conheço e conheci e que não me lembro. O nome me soa.”
O ex-presidente afirmou que políticas de incentivo fiscal a montadoras de veículos, a exemplo da tratada na medida provisória, são normais e vêm de muito tempo, exigindo muita discussão de todos os órgãos envolvidos. “Essas decisões são muito mastigadas, não é ele (o presidente) que vai tomar essa decisão, passa pelo Congresso, tem debate, tem discussão. Não são medidas do dia para a noite, há um processo”, comentou.
Nesta terça, 12, também depuseram como testemunhas de Lula o ex-ministro da Fazenda na gestão de Fernando Henrique Pedro Malan, além dos ex-ministros da Justiça José Eduardo Cardozo e da Defesa Nelson Jobim. Os dois últimos exerceram os cargos nos governos petistas.
As testemunhas negaram saber de qualquer interferência de Lula no governo de Dilma para viabilizar a MP e o contrato dos caças. “Absolutamente, não, nenhuma (tentativa de Lula). Quero lhe falar algo que eu presenciei: a presidente Dilma tinha uma característica de não permitir ingerência política de quem quer que seja. Reagia muito mal”, disse Cardozo.
Jobim explicou que uma comissão da Aeronáutica entendeu ente 2009 e 2010 que os Gripen eram os modelos que mais atendiam às necessidade do Brasil. Porém, em sua gestão, a Defesa decidiu fazer uma reavaliação sobre o caso, levando em conta a estratégia nacional de defesa, que envolvia questões mais amplas, e indicou os caças franceses Rafale como melhor opção, embora eles fossem mais caros.
Ele explicou que deixou o governo em 2011 e não participou mais de tratativas a respeito, mas que a FAB manteve sua opção original. Jobim contou que, ao assumir o cargo, em 2007, o então presidente Lula lhe deu carta branca para tocar o projeto dos aviões e nunca interferiu nas negociações. “Em momento algum, o presidente fez qualquer tipo de referência sobre esse tema”, disse.
FONTE: O Estado de
COLABOROU: Manuel Flávio