Por Roberto Godoy
Os dias andam agitados nos comandos militares em Brasília. É tempo de enxugar o orçamento – e o que se sabe é que haverá cortes de 24,8% no valor fixado originalmente na Lei Orçamentária Anual, que era de R$ 22,6 bilhões. Na prática, significa redução para R$ 17 bilhões e o contingenciamento, uma espécie de congelamento, de R$ 5,6 bilhões que podem vir a ser liberados se houver dinheiro.
É muito, mas a proposta original do setor econômico do governo era mais pesada, batia em pouco acima de 50%, o que levaria o caixa de 2015 para um patamar de alto risco, coisa de R$ 11 bilhões. Havia o temor de que, nessa escala, os programas destinados à modernização das Forças fossem comprometidos. Não serão, garante Jaques Wagner, ministro da Defesa. “Os projetos estratégicos podem sofrer os efeitos de uma velocidade um pouco menor”, disse, em referência ao ritmo de execução dos planos já contratados, ressaltando que, “para colocar em pé programas como esses, o processo é sempre demorado mas, para acabar com qualquer um deles, é muito rápido”.
Na segunda e na terça-feira a secretária-geral da Defesa, Eva Chiavon, faz reuniões para definir com equipes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica o volume contingenciado e onde serão feitos os cortes. Os recursos de custeio, como os de contratação de serviços, das despesas cotidianas e das concessões de diárias, foram limitados a R$ 1,1 bilhão até o fim do ano.
A economia não será linear. O ajuste prevê variações da quota porcentual de acordo com critérios como necessidade imediata e negociação mais favorável a partir da discussão com os fornecedores. A meta geral, todavia, será mantida em 24,8%.
O Ministério da Defesa é o quinto na linha das perdas.
Negociação. Os primeiros dias de maio foram estranhos, e não apenas pelo clima, frio e chuvoso, incomum no outono do planalto central. “Circulava a informação de que os técnicos da Fazenda e do Planejamento preparavam uma amputação, e não só um ajustamento para baixo nas contas da Defesa”, disse ontem um oficial ligado à gestão financeira do setor.
Houve ao menos dois encontros para discussão e “análise das consequências decorrentes, por exemplo, do cancelamento de determinadas iniciativas”, de acordo com o mesmo oficial. Havia forte receio de que o Prosub, ambicioso programa de construção de submarinos – um dos quais de propulsão nuclear – fosse interrompido. O desenvolvimento do super cargueiro multiúso da Embraer, o KC-390, estaria na zona vermelha. A encomenda dos caças Gripen NG, 36 jatos de alta tecnologia adquiridos sob regime de transferência de tecnologia da Saab sueca, nem sequer entraria no cálculo. Sem contrato assinado e fora dos desembolsos previstos para o ano, iria para o limbo à espera de redenção.
A essa altura, Wagner estava em campo. Levado para a equipe do primeiro círculo do governo pela presidente Dilma Rousseff, com apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-governador da Bahia é um hábil articulador político. Atraiu Joaquim Levy, o poderoso ministro da Fazenda, para a sensibilidade da tomada de decisões no campo da Defesa – um viés pelo qual Dilma tem interesse e é bem informada. Wagner sentava-se à mesa com cartas na manga.
No jogo com os economistas, o argumento mais forte era aritmético: a paralisação dos compromissos implicaria altas multas contratuais, talvez superiores ao ganho com a ruptura. Outra: o prejuízo para o esperado efeito multiplicador do conhecimento tecnológico não poderia ser pior. Somente o Prosub movimenta perto de 50 diferentes setores da indústria, requalificados para o empreendimento.
Com os companheiros próximos, os integrantes da assessoria política do Planalto, Wagner discutia os números sociais. A rede Sisfron de controle das fronteiras – uma blindagem de 17 mil km de sensores, radares, bases operacionais e centros de inteligência – gerará 5 mil empregos diretos durante os 10 anos da implantação total, além de absorver a atividade de 15 mil militares. O primeiro módulo está pronto e em atividade em Dourados (MS), com a 4.ª Brigada de Infantaria. Mantém vigilância sobre a linha das fronteiras com Bolívia e Paraguai. É a seção piloto do sistema – mede 680 km de extensão.
FONTE: Estado de São Paulo