Para garantir vigilância de 22 milhões de quilômetros quadrados e sustentar a soberania do espaço aéreo do Brasil, a Força Aérea Brasileira precisa estar sempre pronta para atuar na defesa do País.
Um dos responsáveis por essa tarefa é o Comando de Preparo (COMPREP), que coordena a formulação da doutrina aeroespacial, define os padrões de eficiência dos militares e sistemas de armas, além de planejar o treinamento de unidades de combate e avaliar seu desempenho.
Uma das principais ações do COMPREP é a implementação do suporte operacional do Gripen no Brasil na Ala 2, em Anápolis (GO).
Para falar sobre o andamento destas operações, convidamos para uma entrevista o Comandante de Preparo, o Tenente-Brigadeiro do Ar Luiz Fernando de Aguiar.
O Comandante já recebeu 19 condecorações nacionais e uma internacional, e possui cerca de 4.900 horas de voo em 12 tipos diferentes de aeronave.
1. Quais são as ações que estão sendo realizadas para a implementação operacional do Gripen no Brasil?
Nós pensamos no Gripen não só como um avião, mas sim como um completo sistema de combate, com diversas funcionalidades que extrapolam as capacidades de qualquer outra aeronave que já operamos na FAB. Além disso, a sua característica “swing-role” permite que vários tipos de missão sejam realizados quase que simultaneamente, o que também é algo novo para nós.
Para tanto, estamos revisando nossos conceitos doutrinários de modo a expandir os horizontes e criar um ambiente propício a novas estratégias, táticas e técnicas, uma vez que de nada adianta implantar um sistema tão moderno se não inovarmos também na nossa forma de operar.
Outra importante tarefa do COMPREP é preparar os militares que serão responsáveis por voar e dar suporte ao voo do F-39 E. Estamos selecionando não só os pilotos, mas também profissionais de diversas áreas que terão a responsabilidade de operar equipamentos tais como os simuladores de voo, as estações de planejamento de missão, os equipamentos de programação de guerra eletrônica, dentre outros tantos equipamentos de suporte operacional. Somado a isso, estamos desenvolvendo projetos para elevar o padrão nas áreas do conhecimento, importante para que o potencial do Gripen e seus sistemas sejam aproveitados ao máximo.
2. Como os pilotos brasileiros estão lidando com os treinamentos na Suécia? Que tipo de preparo prévio foi feito no Brasil para que estivessem preparados para esse momento?
Os nossos pilotos, rotineiramente, já passam por extensos treinamentos e, desde sua formação inicial na Academia da Força Aérea (AFA), são constantemente postos à prova para garantir um elevado desempenho operacional. Ainda assim, para aqueles que foram selecionados, tivemos o cuidado de realizar a imersão no inglês, que é o idioma que está sendo usado no curso. Demos também atenção especial para o preparo físico, uma vez que pilotarão uma aeronave da classe de 9G e, portanto, bastante exigente quanto à força e resistência muscular. Também fizemos trabalhos onde os pilotos tiveram que desenvolver táticas e técnicas que costumavam receber prontas. Fruto de todo esse preparo, temos recebido reportes bastante positivos dos treinamentos sendo conduzidos na Suécia e tudo está fluindo conforme esperado.
Ressalto que o mérito desse resultado não é somente da nossa parte. O alto nível de experiência dos instrutores da Força Aérea Sueca, aliado à fidalguia sempre demonstrada nos relacionamentos entre as nossas Forças, tem sido fator decisivo para o grande êxito que experimentamos hoje.
3. Como Comandante de Preparo, como é fazer parte deste momento histórico da aviação brasileira?
Além de uma grande responsabilidade, é um grande orgulho. A história da FAB é marcada por algumas grandes mudanças, tais como a introdução de caças a jato, seguida pela incorporação de aeronaves supersônicas e pela criação de um sistema inovador, o SISDABRA, que passou a integrar a Defesa Aérea com o Controle do Tráfego Aéreo geral.
Agora passamos por mais um desses grandes momentos, o reaparelhamento que nos coloca no topo da envergadura para entregar a capacidade de defesa que o Brasil merece. Não é todo oficial que tem a oportunidade de participar de uma implantação tão importante, e de ver o brilho nos olhos dos seus comandados refletindo a empolgação por um futuro promissor.
Ainda assim, temos pela frente grandes desafios para que o Gripen comece a operar efetivamente na FAB. Existe uma série de desenvolvimentos que precisam ser concluídos para que as capacidades operacionais almejadas sejam finalmente entregues. Como Comandante de Preparo, me sinto responsável por garantir que esses desafios serão superados. Mas, como aviador e, acima de tudo, como cidadão, tenho a satisfação de ver que a aviação brasileira, onde se inclui a indústria aeronáutica nacional, está por atingir a excelência em importantes setores.
4. Dentro da Aeronáutica, quais são as responsabilidades do Comando de Preparo (COMPREP)?
O Comando de Preparo é responsável por manter a Força Aérea Brasileira sempre pronta para atuar na defesa do Brasil. Para isso, coordenamos a formulação da doutrina aeroespacial, definimos os padrões de eficiência dos nossos militares e dos nossos sistemas de armas, planejamos o treinamento das nossas unidades de combate e avaliamos o seu desempenho. Ou seja, mantemos os nossos pilotos, mecânicos, controladores de voo e todos os demais componentes de um complexo cenário de defesa em constante prontidão para que cumpram com eficiência o seu papel.
Ressalto que não são somente os nossos militares que são constantemente lapidados, nossas aeronaves, armamentos e demais equipamentos também são submetidos a panoramas cada vez mais desafiadores. Fazemos isso para que tenhamos a certeza de que o binômio homem-máquina esteja sempre pronto para lidar com as ameaças que possamos enfrentar, hoje e no futuro.
5. Como foram escolhidos os pilotos que irão operar o Gripen no Brasil?
Como se trata da implantação de uma nova aeronave, com novos sistemas e capacidades ainda desconhecidas pelo nosso pessoal, entendemos que precisaremos dos nossos melhores profissionais para que todas as capacidades do Gripen sejam exploradas ao máximo. São eles que irão definir como o F-39 irá mudar a concepção de combate que empregamos hoje e, assim, estabelecerão a base inicial de onde se edificará toda a doutrina de emprego dessa aeronave na FAB. Portanto, tivemos o cuidado de selecionar os futuros pilotos com base na experiência de voo e no desempenho operacional.
Estabelecemos que nessa fase inicial somente aqueles que já têm certa experiência no F-5M ou o A-1M, que são os nossos caças a jato, seriam escolhidos. Nesse universo de pilotos, que já é bastante seleto, procuramos ainda aqueles que tiveram as melhores notas na atividade aérea, considerando o desempenho desde a Academia da Força Aérea (AFA) e incluindo as notas das provas teóricas e também notas de voo. São pilotos altamente capacitados e temos a certeza de que irão extrair do Gripen toda a capacidade de combate que ele pode dar. Ressalto que também os mantenedores, graduados e oficiais foram selecionados dentre os melhores, pois comporão o Sistema Gripen também.
6. Com o retorno dos pilotos ao Brasil, quais serão seus próximos passos?
Uma vez terminado o curso do Gripen C/D na Suécia, os pilotos retornarão ao Brasil para começarem, efetivamente, a implantação operacional do modelo brasileiro, o Gripen E. Apesar de serem modelos diferentes, a experiência no Gripen C/D é uma introdução para o tipo de desempenho e caraterísticas de pilotagem de uma aeronave com asa em delta, canards e comandos de voo do tipo “fly-by-wire”. Além disso, com essa experiência inicial, eles terão uma ideia mais clara dos conceitos de operação que são empregados pela Saab no “Sistema Gripen”.
Assim, ao chegarem ao Brasil, os pilotos terão o conhecimento suficiente para preparar a Unidade Aérea para a chegada do simulador de voo e dos equipamentos de suporte à operação, que serão instalados no 1º Grupo de Defesa Aérea, em Anápolis; e posterior chegada das aeronaves. Nesse ínterim, deverão assessorar o COMPREP nas adaptações que serão feitas nos conceitos operacionais e na concepção de emprego do F-39, além de preparar os planos de treinamento que serão utilizados para a formação e para a manutenção operacional no Gripen E.
7. O que representa para a aviação de caça brasileira a inclusão de um caça inteligente como o Gripen na Força Aérea Brasileira?
A modernização da arma aérea é essencial para que consigamos acompanhar a constante evolução mundial. Um mundo que aspira pela paz e harmonia entre os povos, mas que continua complexo e imprevisível. Para quaisquer ameaças futuras, é essencial que provermos uma resposta ágil e eficiente. Isso para garantirmos a defesa do nosso país, a segurança e a liberdade do nosso povo. Incorporar um caça inteligente é cumprir com essa obrigação. O Gripen garantirá primeiramente a dissuasão, desencorajando eventuais agressores e oferecendo uma resposta rápida, eficiente e precisa, frente aos mais ousados.
Cito o Gripen como um caça inteligente não só pelos modernos sistemas que ele incorpora, que favorecem sobremaneira o sucesso da missão, mas também por ter uma relação custo-benefício bastante promissora. Frente às necessidades do nosso povo, não podemos de maneira nenhuma investir mal os recursos públicos. Ter um caça com excelente capacidade de combate e relativo baixo custo de operação, aliado a todos os benefícios advindos da transferência de tecnologia incluída no programa, é também uma forma inteligente e eficiente de se atingir o bem comum.
8. Na sua opinião, qual foi o momento mais marcante em relação ao Programa Gripen?
O Programa Gripen é repleto de momentos marcantes: desde a assinatura do contrato, que formalizou o início de uma cooperação entre a FAB e a Saab, bem como entre o Brasil e a Suécia, uma vez que garante a participação nacional no desenvolvimento e na produção dos aviões, transcendendo uma simples compra de equipamento e avivando o tão esperado reaparelhamento da Força.
A partir daí, tivemos o voo do primeiro protótipo do Gripen E, em Linköping na Suécia, o que mostrou que a cooperação estava dando certo e que aquele projeto estava realmente saindo do papel. Tivemos então a produção do primeiro Gripen Brasileiro, o FAB 4100, que fez seus voos iniciais também em Linköping, sendo pilotado inclusive por um piloto de provas da Força Aérea Brasileira e, em seguida, enviado para o Brasil.
Mas, de todos os momentos, o mais marcante foi definitivamente o voo do 4100 em Brasília, no último dia 23 de outubro, data em que comemoramos o Dia do Aviador e da Força Aérea Brasileira. Cito como o mais marcante porque esse voo simbolizou a apresentação do Gripen à nação brasileira, que é o nosso bem maior, para quem todos os nossos esforços estão voltados e a real beneficiária de todo esse investimento. Esse voo mostrou para os nossos militares e para o nosso povo que aquele futuro tão esperado já está aqui.
9. Qual é o legado que o Programa de Transferência de Tecnologia deixa para a indústria de Defesa do Brasil?
O Programa de Transferência de Tecnologia foi idealizado com diversos objetivos. Em um primeiro momento, procuramos desenvolver a base industrial do Brasil para que pudesse atuar na produção de subsistemas, peças e outros componentes do F-39, além de se tornar capaz de apoiar a cadeia logística, de fazer a manutenção dos principais sistemas e sensores e de realizar a integração de novas capacidades e armamentos. Com isso, conseguimos que a nossa indústria participe ativamente no desenvolvimento e produção do Gripen Brasileiro e, inclusive, integre a cadeia global de fornecedores da Saab, ampliando a sua capacidade de produção e suporte para atender encomendas feitas pela própria Suécia e por outros futuros operadores.
Para tanto, como beneficiários diretos, incluímos mais de 350 técnicos e engenheiros no Programa, sejam eles das diversas empresas, sejam da própria FAB. Com isso, trazemos oportunidades de negócios e de empregos, diretos e indiretos, para o Brasil, aumentamos a nossa inserção em diversas áreas de tecnologia de ponta e, futuramente, esperamos ter a capacidade de desenvolver o nosso próprio caça de última geração.
10. Gostaria de adicionar alguma informação?
Gostaria de finalizar agradecendo à Força Aérea Sueca a cooperação e a fidalguia com que estão instruindo nossos pilotos na F7 Wing, concretizando uma parceria que irá perdurar para sempre.