Exército capacita esquadrões contra bombas e ameaças biológicas e Abin rastreia credenciados em busca de possíveis suspeitos de extremismo
Por Humberto Trezzi
O treino foi conduzido pelo Comando Conjunto de Prevenção e Combate ao Terrorismo (CCPCT) do Ministério da Defesa, sob coordenação do Comando de Operações do Exército. O treino serviu para padronizar procedimentos entre as diversas forças envolvidas nas Olimpíadas. Para o evento, será montada a maior operação de segurança da história do Brasil, com 85 mil pessoas destacadas para atuar na segurança. A maioria desses agentes já passa por treinamentos a fim de executar suas funções no ano que vem.
Só das Forças Armadas serão convocados 38 mil militares para atuar no Rio de Janeiro e nas cidades sedes do futebol (Manaus, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador e Brasília). Os demais são ligados a polícias militares, civis, federal e rodoviária federal, bombeiros, Defesa Civil, sistema penitenciário e guardas municipais. A estimativa é de que 80 chefes de Estado passem pelo Rio nos 17 dias de competição. Após treinar em Goiânia, os militares do Exército se deslocarão para todas as cidades onde ocorrerão Jogos Olímpicos.
— Lá irão fazer, juntamente com pessoal da segurança pública, toda a arquitetura de defesa específica de contra terror. Farão também prevenção de ataques cibernéticos — detalha o general Mauro Sinott Lopes, comandante de Operações Especiais do Exército.
Os militares acreditam ter efetivo suficiente. Das 669 unidades do Exército espalhadas pelo Brasil, a maioria tem uma sessão de Inteligência Classe C (a chamada S2), capaz de fornecer dados e produzir informes para o sistema de inteligência. Entre as preocupações estão ações terroristas e sabotagens diversas, criminalidade e violência urbana e comprometimento do sistema de mobilidade urbana, da saúde pública e de serviços essenciais, ataques cibernéticos e até desastre naturais.
Já o papel dos serviços civis de inteligência, para os Jogos Olímpicos, foi detalhado na Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Senado pelo diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Wilson Roberto Trezza. Serão 206 os países participantes dos jogos e um dos trabalhos estratégicos da Abin é fazer uma varredura dos perfis de todos os interessados em se credenciar. Seja para o evento propriamente dito, seja para o tour da Tocha Olímpica, que vai passar por 300 cidades. Serão também buscadas informações sobre extremistas políticos ou religiosos junto aos adidos policiais e militares nas embaixadas, no Exterior.
Os ministérios da Defesa e Justiça, além da Abin, terão no Rio um Centro Integrado de Combate ao Terrorismo até o final deste ano. A iniciativa foi anunciada à imprensa, em julho, pelo chefe da assessoria especial de grandes eventos do Ministério da Defesa, general Luiz Felipe Linhares. Uma das principais atribuições do centro será monitorar incidentes que estejam ou possam estar relacionados a atos de terrorismo.
— Se uma mochila ou mala for, a princípio, esquecida no saguão do aeroporto, primeiro temos que isolar a área. Em seguida, a segurança do aeroporto entra em ação. Na sequência, dependendo das circunstâncias, a polícia militar deve ser chamada. Se houver indício de algo mais grave, o passo seguinte é com o esquadrão antibombas da Polícia Civil. Por fim, avaliando-se a gravidade, as Forças Armadas são acionadas — detalhou o general.
O Ministério da Justiça investiu R$ 350 milhões em segurança para os jogos. Desse total, R$ 100 milhões foram direcionados para a compra de equipamentos de proteção individual, entre outros fins.
Entrevista
André Luís Woloszyn, especialista em contraterrorismo
O Brasil está longe de permanecer salvo da ameaça terrorista. Pelo contrário. Essa é a opinião do analista de assuntos estratégicos André Luís Woloszyn. Gaúcho, o coronel reformado da Brigada Militar é um dos principais especialistas brasileiros em contraterrorismo. Escreveu três livros sobre o tema (com destaque para Terrorismo Global — Aspectos Gerais e Criminais), fez cursos no Exterior e foi analista da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Nessa entrevista, ele analisa os atentados de Paris e os riscos para outros países, como o Brasil.
O que o senhor achou dos atentados em Paris? É uma nova fase do Estado Islâmico?
Eram previsíveis. Começou com o ataque ao jornal Charlie Hebdo, ocorreram mais uns três, pouco divulgados, e agora esse massacre. Encurralado, o EI passou um duro recado: não há lugar seguro para seus inimigos. É a velha mensagem terrorista, agora amplificada pela internet. Eles tentam inviabilizar a conferência mundial que ocorrerá na França, em alguns dias. Talvez consigam.
O senhor enxerga algum risco para o Brasil?
Sim. Vamos sediar os Jogos Olímpicos no ano que vem e os brasileiros correm risco, porque o país nem de longe está preparado para terrorismo, até por desconhecer esse problema em décadas recentes. Se a França, acostumada ao terror desde a Guerra de Independência da Argélia, foi miseravelmente surpreendida com esses ataques da sexta-feira, o que se dirá de um país como o Brasil, sem tradição de combate a esse tipo de crime?
Mas por que atacariam no Brasil, um país sem tradição de beligerância, sem engajamentos com guerras dos outros?
Porque o território é propício, sem maiores controles. E, veja, o Brasil vende armamento. Bombas cluster fabricadas no Brasil (do tipo que espalha pequenos projéteis explosivos), proibidas pela Convenção de Genebra, foram lançadas na Síria e no Iêmen, em áreas controladas pelo Estado Islâmico. Até coisas assim podem gerar vingança. Mas espero que não aconteça, para nosso bem.
FONTE: Jornal Zero Hora