Desde a criação do CLA, já foram realizadas 95 operações envolvendo veículos suborbitais de testes e treinamento
Por Bruno Lacerda
Criado em 1983, o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) nasceu com o objetivo de consolidar o Brasil no contexto da corrida aeroespacial global. Através do lançamento de satélites e foguetes produzidos no país, a base espacial foi efetivamente implementada em 1989, com a “Operação Pioneira” – que lançou os foguetes SBAT, Sistema Brasileiro Ar-Terra.
A escolha da sede no Maranhão se deu por conta da posição geográfica estratégica do estado em relação à Linha do Equador, o que permite a economia de combustível para colocar satélites e foguetes em órbita. Pouco estratégico, no entanto, é o fato de que o estado, sede de uma das principais iniciativas da Agência Espacial Brasileira, não possui nenhum centro de formação profissional na área das ciências aeroespaciais.
Segundo o professor doutor João Viana, do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Maranhão, faltam incentivos para o desenvolvimento de conhecimento local. “Em relação ao Maranhão, nós ainda temos muito a desenvolver. Como pesquisador, eu vejo que não existe uma ocupação de Alcântara em relação ao seu entorno. Você precisa ter toda uma indústria que gere ao redor disso. No nosso país, está tudo concentrado no interior de São Paulo. O pessoal tem que se deslocar pra cá para lançar foguetes. (…) Isso precisa ser incentivado aqui”, afirma.
Outro fator que tem dificultado a evolução do Centro de Lançamento de Alcântara são os repetidos cortes no orçamento federal. Nos últimos dois anos, a redução foi da ordem de 14% – o que colocou o Brasil em um volume de investimento consideravelmente menor que o de países com menor tradição na corrida espacial – com um recurso de US$ 122 milhões, contra os quase US$ 4 bilhões investidos conjuntamente por Índia e China.
Em nota, o Centro de Lançamento de Alcântara admite que a redução orçamentária tem afetado o desempenho das atividades de lançamento. “Com o ajuste fiscal e dificuldades financeiras enfrentadas pelo país, cronogramas precisam ser revistos e adequações precisam ser feitas visando aproveitarmos ao máximo as operações de lançamento que são realizadas em Alcântara”.
Um novo fôlego
De acordo com a Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia (Secti), está em curso uma iniciativa para a criação de um programa de pós-graduação na área da Engenharia Aeroespacial no estado. Caso implementado, o Mestrado deverá apoiar o polo do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), cuja criação foi anunciada pelo deputado Bira do Pindaré (PSB), na última segunda-feira, em pronunciamento no plenário da Assembleia Legislativa.
Junto ao Ministério da Ciência e Tecnologia, está em curso um pleito do Governo Estadual para a criação de um Centro Vocacional Tecnológico (CVT) para a formação de pessoal técnico em apoio às atividades ligadas ao aeroespaço e aeronáutica. “Nos diálogos [com a Agência Espacial Brasileira], a prioridade é potencializar o CLA para a economia do Maranhão, especialmente na área de capacitação dos recursos humanos, turismo científicoe na exploração e desenvolvimento de pesquisas que possam ativar esse setor para as universidades públicas locais”, afirmou em nota, a Secti.
Retrospectiva
Desde a criação do CLA, já foram realizadas 95 operações envolvendo veículos suborbitais de testes e treinamento, estudos e pesquisas espaciais e lançadores de satélites. Destes, três episódios trágicos demarcaram o programa espacial brasileiro. Os dois primeiros, ocorridos em 1997 e 1999, não concluíram a missão de inserção em órbita de satélites.
O último e mais grave, em 2003, vitimou 21 técnicos do Comando Aeroespacial e gerou uma longa pausa nas atividades da Agência Espacial Brasileira no estado. O teste de um lançador capaz de pôr satélites de grande porte em órbita geoestacionária acabou em tragédia. O incêndio começou na Torre Móvel de Integração (TMI), plataforma de lançamento do Veículo Lançador de Satélites (VLS), e gerou uma série de explosões secundárias. Daquela plataforma, o foguete deveria levantar voo após três dias.
O incidente de 2013 gerou atrasos em cadeia. A previsão da AEB era de que um voo-teste do VLS fosse feito em 2014, com um segundo lançamento estipulado para 2016, que deveria levar uma carga útil contendo um experimento tecnológico. O foguete completo, em sua quarta versão (V04), estava inicialmente previsto para ser lançado em 2017, já com um pequeno satélite a bordo. Nenhum desses prazos foi mantido.
Sobre os acidentes, a equipe do Centro de Lançamento garante ter tirado grandes lições. “As falhas que ocorrem em todo o programa espacial são inerentes à atividade. Contudo, é importante tirar lições, aprendizados que passam a ser incorporados em operações futuras. O CLA dispõe hoje de um Plano de Gerenciamento de Crises e Apoio a Emergências (PGCAE) mais complexo, que foi aperfeiçoado ao longo dos últimos anos. O Prédio de Segurança é uma construção cuja necessidade é reunir todos os profissionais envolvidos em operações de lançamento em uma única área segura e permitindo o controle do acesso às áreas de risco”.
Em relação ao novo cronograma de atividades, em nota, o CLA afirma que “o programa envolvendo os Veículos Lançadores de Satélites encontra-se em revisão crítica no escopo dos projetos relacionados ao Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE)”. Contudo, afirmam que os estudos são preliminares e que uma decisão final envolve instâncias governamentais superiores.
Fonte: O Imparcial