Por Gabriele Hernandez
Em agosto de 2023, as eleições primárias argentinas deram vitória ao candidato Javier Milei, que prometeu congelar as relações com a China, importante parceiro comercial nacional. Além de ser um dos maiores importadores argentinos, Pequim tem interesses muito específicos no sul do país, vendo a Argentina como porta de entrada para suas estações antárticas na região.
No início do século XX, Argentina, Chile e Reino Unido se viram disputando a mesma porção do continente antártico. À época, embora o Reino Unido ainda fosse o império mais poderoso do mundo, as duas Guerras Mundiais, a perda de espaço para os Estados Unidos, a reestruturação de suas colônias e a própria dependência da carne argentina foram fatores que frearam a soberania britânica na região e levaram à assinatura do Tratado da Antártica. Assim, Buenos Aires se consolidou em definitivo como um dos atores com maior presença na Antártica, especialmente graças a sua proximidade geográfica.
Os três Estados dispõem de cidades portuárias antárticas e investem cada vez mais em logística, emprestando a área para parceiros estratégicos que desejam acessar o sexto continente. A China, embora seja o país que mais investiu no local na última década, não dispõe de portões de entrada que garantam apoio ao transporte regional, sendo refém da cooperação internacional. No entanto, a disputa tripartite é a oportunidade perfeita para o aporte chinês no sul argentino mediante as inúmeras crises econômicas que Buenos Aires enfrenta, como foi o caso do acordo entre o governo da Terra do Fogo e uma estatal chinesa para instalação de um porto na cidade de Rio Grande. A implantação garantiria com mais facilidade não só o acesso de Pequim à Antártica, mas também ao Atlântico Sul, e complementaria seu programa de telecomunicações, acusado internacionalmente de ser uma ferramenta de espionagem.
A Antártica ganhou importância para a China no governo do Presidente Xi Jinping como parte da Iniciativa Cinturão e Rota, objetivando a construção de sua quinta estação de pesquisa, o desenvolvimento de sua infraestrutura de telecomunicações e seu programa espacial. Além da localização estratégica, o fato de ser a maior reserva de água doce do mundo e conter vastas reservas de petróleo, gás natural e outros minerais são fatores que fazem do continente uma região relevante para Pequim. Com os investimentos chilenos e britânicos em seus respectivos portos, a China pode ser a chance de a Argentina virar o jogo e disparar à frente como potência antártica. O custo, no entanto, é sua própria autonomia.