Por Ilia Plekhanov
“Nossa frota está ao nível quase tão baixo como a da época da Primeira Guerra Mundial. Isso foi há tempo. Muito tempo. E não acontecerá mais”, declarou recentemente o presidente dos EUA, Donald Trump, falando na base militar do Comando Central na Flórida.
Já há muito tempo que Trump se preocupa com este assunto: ainda durante a campanha eleitoral Trump falou sobre os planos de lançar um programa de grande escala de construção naval nos EUA e aumentar a Marinha norte-americana de 272 para 350 navios.
Nas últimas semanas foram tornados públicos pelo menos três grandes relatórios sobre a criação da futura frota dos EUA.
Em janeiro de 2017, o Centro para Avaliação Estratégica e Orçamentária (CSBA — Center for Strategic and Budgetary Assessments) publicou o seu relatório. Em 2 de fevereiro, um documento semelhante foi tornado público pelo famoso especialista em questões navais do Serviço de Investigação do Congresso, Ronald O’Rourke. Por último, em 10 de fevereiro, o senador John McCain apresentou ao Congresso a investigação da Marinha norte-americana sobre a futura plataforma alternativa da frota dos EUA.
Ronald O’Rourke fala abertamente das razões que exigem o aumento do número de navios. As duas razões principais são a China, que está modernizando a sua Marinha, e a Rússia, que intensifica a sua atividade no mar Mediterrâneo e no norte do oceano Atlântico.
O especialista também nota que não se trata de um aumento realmente significativo do número de navios, pois tais planos já existiam no relatório de 1993.
A Rússia e China, na opinião de autores deste último relatório, estão dispostas a desafiar a ordem mundial existente e dentro de 15 anos serão elas — não o terrorismo internacional — que se tornarão a principal dor de cabeça para os estrategistas militares dos EUA.
A mera presença da Marinha dos EUA no teatro de operações militares não freará os “agressores”, por isso a Marinha deve estar pronta a prevenir uma agressão ou punir imediatamente os atacantes para fazer parar suas ações. Estas eram as tarefas principais da Marinha norte-americana na época da Guerra Fria, indicam os relatórios, e agora está chegado o momento de realizá-las de novo.
Ao mesmo tempo, a Marinha da Rússia ainda não é capaz de efetuar operações militares distantes nos oceanos, mas a frota russa é equipada com mísseis de cruzeiro, está construindo novos submarinos silenciosos, submarinos nucleares com mísseis balísticos e está também desenvolvendo drones.
A China representa ameaça primeiramente por causa dos seus mísseis antinavio, sistema de vigilância de satélites e rede de radares costeiros. Além disso, a Rússia e a China vendem tecnologias navais a tais países como o Irã e a Coreia do Norte, o que é considerado uma ameaça para os interesses nacionais dos EUA.
No seu relatório, John McCain trata não só das ameaças provenientes desses países. De acordo com ele, a Marinha deve considerar três fatores principais. Primeiro, em uma época de globalização está aumentando o tráfego de cargas nas rotas comerciais marítimas, aparecem novas rotas (no Ártico), os recursos submarinos tornam-se mais acessíveis. As rotas marítimas estão sendo cada vez mais usadas para a imigração em grande escala das populações. Segundo, na época da informação, os cabos submarinos tornam-se objetos de importância estratégica. Terceiro, o avanço tecnológico geral irá influenciar todas as esferas da vida, incluindo no mar.
Existe ainda um fator interno. O orçamento é limitado e só aumentar as despesas não é suficiente para “comprar o futuro”.
Hoje a Marinha dos EUA deve ser tão ameaçadora que leve os outros países a nem sequer pensarem em conduzir operações militares, de contrário o inimigo conseguirá entrincheirar-se nos territórios ocupados e será difícil retirá-lo de lá.
O relatório destaca que os EUA devem ter uma Marinha que seja capaz de efetuar ofensivas rápidas nos anos 2030.
Outro assunto importante é a capacidade de realizar operações navais de forma independente, sem a participação da OTAN, pois a Aliança Atlântica precisará de muito tempo para dar uma resposta militar, devendo a Marinha norte-americana estar pronta a interferir de forma rápida, especialmente porque as capacidades militares dos aliados também deixam muito a desejar.
Entretanto, existe a possibilidade de os adversários poderem influenciar os aliados dos EUA ou países neutros e estes deixem de estar dispostos a aceitar a presença de tropas terrestres ou Força Aérea estadunidenses. Desta forma, é provável que a Marinha seja o único móvel e autônomo de projeção da força dos EUA.
O Centro para Avaliação Estratégica e Orçamentária propõe dividir a frota em dois grupos principais: as forças de dissuasão e as de manobra. As primeiras correspondem a regiões geográficas concretas. As segundas devem estar prontas para responder às ameaças nos oceanos Atlântico e Índico, no Oriente Próximo. As forças de dissuasão devem prevenir ou não permitir a realização bem-sucedida de operações militares da Rússia e China; as forças de manobra devem apoiá-las em qualquer ponto dos oceanos.
Devido ao avanço tecnológico, não vale a pena diminuir a importância dos drones e meios de comunicação. Assim, os canais de conexão serão vulneráveis em uma guerra futura, por isso é provável que as decisões sejam tomadas independentemente em regime autônomo, ou seja, sem conexão à sede.
O relatório de McCain pronuncia-se pela criação de uma frota “distribuída” altamente tecnológica, onde o poder ofensivo não esteja concentrado só nos porta-aviões mas seja distribuído por todos os tipos de navios no teatro de operações militares. É evidente que essa ideia exige um alto nível da autonomia da Marinha.
O Centro para Avaliação Estratégica e Orçamentária propõe aumentar o número de navios para 382 e pôr em serviço 40 submarinos superpesados e 40 drones submarinos. A construção de tal frota custará cerca de 23,6 bilhões de dólares por ano (20 por cento mais do que as despesas planejadas) e as despesas operacionais serão cerca de 16,5 bilhões de dólares.
Ronald O’Rourke opina que a atual base industrial permitirá construir mais navios e submarinos, ou seja, não há necessidade imediata de construir novas usinas e desenvolver novos modelos de embarcações.
A Marinha dos EUA sugere que as atuais capacidades não estão totalmente utilizadas. Mas antes de começar o programa de construção de navios de grande escala, os representantes da Marinha querem saber quais serão os valores destinados à reparação e manutenção dos navios em funcionamento.
Resumindo, a questão financeira na modernização e aumento da frota não é a principal da agenda. O tema principal de discussão é o ritmo de realização do programa (considerando as capacidades crescentes das frotas da Rússia e da China) e a escolha da “arquitetura” da futura Marinha dos EUA (nas condições de autonomia da Marinha e de existência de aliados não muito confiáveis).
FONTE: Sputnik