Como nossos antepassados portugueses na conquista do Atlântico Sul e do Índico, temos vantagens comparativas
O mar profundo é uma nova fronteira, talvez a última, que se abre como desafio à humanidade. Uma fronteira do conhecimento e da economia que o Brasil tem todos os motivos e condições para explorar.
Entretanto, a atuação científica e a tecnologia brasileira nessa fronteira são ainda modestas em proporção ao tamanho do seu interesse econômico e estratégico para o país. No entanto, o mar profundo já é uma prioridade econômica, na medida em que nosso petróleo vem e virá de águas cada vez mais profundas.
Como nossos antepassados portugueses na conquista do Atlântico Sul e do Índico, temos vantagens comparativas importantes decorrentes do avanço na conquista do petróleo em águas profundas e do ambicioso programa na área de submarinos, incluindo o submarino nuclear nacional.
A conjunção desses dois esforços pode se dar na obtenção de um Veículo de Imersão Profunda (VIP) com capacidade para três ou quatro tripulantes, visando à realização de pesquisas científicas, bem como atividades de prospecção, exploração e apoio à produção mineral e de petróleo. O VIP japonês Shinkai 6500 operou recentemente ao largo de nosso litoral por força de um convênio firmado entre o Brasil e o Japão. A expedição conjunta denominou-se Iatá-Piuna (em tupi-guarani: “navegando em águas profundas”). Cientistas brasileiros participaram das atividades de coleta de amostras no fundo do mar a profundidades de cerca de 2.000 metros.
Na Elevação do Rio Grande foram encontradas claras evidências de que essa região é parte submersa de nosso litoral, sendo chamada “Atlântida Brasileira”. Tal fato poderá assumir importantes implicações no que diz respeito à demarcação de nossa plataforma continental.
Note-se que já existem primeiros resultados sobre ocorrências de minérios em nossa plataforma e em certas regiões contíguas. A disponibilidade de Navio Hidro-Oceanográfico (NHOc) nacional capaz de apoiar um VIP também nacional para a realização de tais trabalhos, de vital importância estratégica para o país, permitiria evitar a dependência de veículos estrangeiros.
A importância de o Brasil lançar-se à exploração dos recursos existentes em sua plataforma continental e áreas contíguas tem dimensões econômicas, políticas, estratégicas e geopolíticas.
A criação do Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas e Hidroviárias (INPOH) e a construção do NHOc Vital de Oliveira, iniciativas em andamento, somadas à obtenção do VIP nacional, constituiriam a infraestrutura necessária para criação de um programa de governo para avançar na fronteira do conhecimento do mar profundo, explorando nossa plataforma continental e áreas contíguas.
Exemplos de VIP com mais de um tripulante são Alvin e Trieste (EUA, 4.500m e 11.000m), Konsul e Mir (Rússia, 6.500m e 6.000m), Shinkai (Japão, 6.500m), Jiaolong (China, 7.500m) e Nautile (França, 6.000m). Note-se que a tecnologia desses veículos é restrita a esses cinco países.
A obtenção do VIP nacional poderia ser objeto de uma extensão do acordo estratégico já vigente entre o Brasil e a França para construção de submarinos. O Nautile recentemente atuou com sucesso nas buscas dos restos da tragédia do AF-477.
Como uma janela para o futuro, a necessidade de calor e força motriz é um dos grandes obstáculos na exploração do petróleo ou outros recursos minerais no fundo do mar. O uso da energia nuclear para essas aplicações pode trazer uma revolução tecnológica para a exploração dessa nova fronteira. A capacitação nuclear existente no país, em especial o desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro, nos proporcionam importante vantagem competitiva também nesse caso.
Como disse o presidente Kennedy quando, no início da década de 60, engajou os EUA no projeto de levar o homem à Lua, o mar profundo “é um novo oceano que devemos navegar”. Na verdade, o Brasil já está nele navegando desde que se engajou na exploração de petróleo em águas profundas. Falta assumir esta tarefa como um verdadeiro desafio nacional e levar brasileiros aos mais remotos e profundos pontos do nosso mar.
FONTE: O Globo – Leonam dos Santos Guimarães, Carlos Feu Alvim e Luiz Philippe da Costa Fernandes