Por Luiz Padilha
Alguns dias antes da abertura da Euronaval 2024, visitamos a fábrica e a pista de testes da BAE Systems Hägglunds em Örnsköldsvik, na Suécia. Uma oportunidade única para conhecer o processo de fabricação não só do Veículo de Combate de Infantaria IFV (Infantry Fighting Vehicle) CV90, como também do veiculo blindado anfíbio articulado BsV10.
Na chegada à cidade de Örnsköldsvik, fui recebido pelo Sr. Håkan Näslund, diretor de relações públicas da BAE Systems Hägglunds, debaixo de uma chuva fina mas constante e temperatura na casa dos 5ºC. Já na manhã seguinte, uma surpresa. Nevava forte com todos os telhados cobertos pela neve (0ºC), e por um momento pensei esse clima pudesse ser um impeditivo para nossa ida a pista de testes. Lêdo engano. Foi justamente o primeiro local que o Sr. Håkan me levou para conhecer.
As estradas apesar da neve estavam com o trafégo normal e após alguns minutos desde o hotel, chegamos a pista de testes, onde logo como um cartão de visitas, me deparo com o protótipo do CV90 equipado com o canhão de 120mm. Este protótipo foi montado em um CV90 MkIII, e quando entrar em produção, já será na versão CV90 MkIV com um canhão de 120mm montado em uma torre própria da BAE Systems Hägglunds.
Dentro das instalações ao lado da pista de testes, me encontrei com o Sr. Edward Kleberg, gerente de demonstrações de veículos e marketing e o Sr. Tarkan Turkcan, diretor da plataforma CV90, que fizeram apresentações sobre os dois veículos que se encontravam no local. O BsV10 e o CV90 MkIII.
Com mais de 1.280 unidades vendidas para 7 países europeus, 4 membros da OTAN, que operam 15 variantes, o Veículo Blindado de Combate de Fuzileiros (VBC FUZ) CV90 pode ser considerado o veículo de combate mais moderno em serviço ativo atualmente. Com um número considerável de unidades em operação, como o CV90Mk0 operado pela Suécia até o CV90MkIV que irão equipar as forças armadas da Tchecoslováquia e Eslováquia.
Com um histórico comprovado de suporte personalizado de pós-venda, a BAE Systems Hägglunds entrega soluções que abrangem serviços de manutenção, serviços técnicos, cadeia de suprimentos e treinamento, que tem como finalidade entregar suporte operacional rápido em teatros operacionais.
CV90 Canhões
Ao longo do tempo a BAE Systems Hägglunds desenvolveu versões do CV90 equipadas com diferentes canhões. Inicialmente os CV90 foram equipados com o canhão Bofors de 40mm (CV9040), mais tarde com um canhão de 30mm Mk44 Bushmaster II da ATK, sendo a versão mais exportada.
A empresa desenvolveu o CV90 para que o mesmo pudesse receber diferentes tipos de equipamentos e armamentos, e em 1994 criou um protótipo baseado na versão CV90Mk0 com uma torre GIAT e um canhão de 105 mm (CV90105), mas esta variante acabou não sendo adquirida por nenhum cliente.
Com esta experiência a empresa decidiu desenvolver uma versão com canhão 120 mm, o CV90120 como mencionado anteriormente e devido ao cenário atual onde os Main Battle Tank vem sendo alvo de ataques na Guerra da Ucrânia, as forças armadas podem vir a optar por tanques médios, que custam menos, são mais velozes e dependendo da blindagem e calibre do canhão, podem ser mais eficientes do que os pesados Main Battle Tank hoje no mercado.
O governo holandês fez uma encomenda in 2004 para 184 CV90 MkIII equipados com o canhão Bushmaster III de 35mm, um binômio que atualmente se provou ser a variante mais eficaz. As munições da versão holandesa podem ser do tipo APFSDS-T, APDST, de treinamento TPFSDs-T e KEFT (Kinetic Energi Time Fuzed).
CV90 Blindagem
Os CV90 possuem uma blindagem básica contra impactos de armas de calibre 14,5mm, mas os modelos CV9040B e posteriores oferecem proteção eficaz contra o impacto de projéteis Armour-Piercing Fin-Stabilized Discarding Sabot (APFSDS) calibre 30mm. Algumas das variantes, incluindo o CV9030N, podem ser equipadas com o sistema MEXAS, uma armadura de cerâmica aplicada que fornece proteção contra estilhaços e impactos de munições de maior calibre ou munição APFSDS de calibre 30 mm.
CV90 CBRN
Atendendo alguns operadores do CV90, a BAE Systems Hägglunds equipou unidades do CV90 com a capacidade CBRN (Chemical, Biological, Radiological and Nuclear), onde cada veículo tem um sistema de filtragem que regula o ar para dentro do veículo, sendo criada uma sobrepressão para que nenhum ar externo (contaminado) possa entrar no veículo, “evidentemente com todas as escotilhas fechadas”. Dependendo do cliente, o veículo pode carregar comida e água por 24 ou 48 horas para a tripulação e pelotão. Alguns têm até uma chaleira para esquentar rações ou ferver água. Alguns operadores optaram por colocar um assento com sacos plásticos para os tripulantes fazerem o nº1 e nº 2 enquanto estiverem isolados dentro do veículo.
CV90 Esteiras de Borracha
Para a BAE Systems Hägglunds produzir um carro veloz, econômico, leve e eficaz não bastava. Então ela ao optar por trocar as esteiras de aço pelas de borracha, acrescentou mais um predicado ao CV90: a discrição.
Tornando o CV90 mais silencioso, os operadores ganham mais uma vantagem no teatro de combate. A troca das esteiras de aço para esteiras de borracha, reduziram o peso do veículo e aumentou o conforto no seu interior veículo, com a redução do ruído interno em até 10 dB e redução de vibração de 65%.
Os CV90 holandeses equipados com as esteiras de borracha, operaram no Afeganistão e as tripulações elogiaram tanto a sua resistência quanto ao conforto por elas gerado.
As novas esteiras de borracha foram desenvolvidas pela BAE Systems Hägglunds e pela Soucy International de Quebec, Canadá, reduziram o peso do CV90 em até 1 tonelada, o que permite a inclusão de novos equipamentos no veículo sem comprometer seu desempenho. Outra grande vantagem é que com a redução das vibrações, os equipamentos eletrônicos passam a ter uma expectativa de vida útil maior.
IFV CV90 Motor e Suspensão
Desde o primeiro IFV CV90 Mk0, a motorização é feita por motores Scania 8 cilindros em V. A versão do CV90 MkIV possui um motor Scania com 1.000hp e Transmissão Automática Allison/Perkins/Caterpillar transmission 4040. O motor e a transmissão são construídos juntos para uma troca rápida que fornece ao veículo um tempo de inatividade reduzido. A manutenção do motor poderia ser facilitada pela presença da Scania que se encontra no Brasil desde 1957.
O sistema de suspensão do CV90 é composto por barras de torção com braços de arrasto e amortecedores ativos nas estações de rodas, minimizando o choque e a fadiga para a tripulação ao mesmo tempo em que proporciona alta velocidade.
Este sistema ativo fornece uma função anti-dive (em caso de uma parada brusca) e pode ser controlada pelo motorista.
IFV CV90 Equipamentos
As versões CV90 MkIII e MkIV são equipadas com a chamada Torre Digital , e podem ser encomendadas nas versões IFV, Comando e Controle e Reconhecimento. O exército Holandês selecionou o Iron Fist Active Protection System (APS) da Elbit Systems em sua frota com a integração sendo realizada pela BAE Systems Hägglunds. O Iron Fist é uma tecnologia avançada que detecta, rastreia e neutraliza automaticamente ameaças recebidas para proteger o veículo e sua tripulação.
Atualmente os clientes podem optar por um canhão automático de 30mm, 35mm ou um de 50 mm. O de 50mm tem capacidade de perfurar tanques russos até mesmo na frente e derrubar drones a até 3 km no ar. A versão D-Turret pode também vir a ser equipada com o lançador embutido para mísseis guiados antitanque, podendo ser o Spike LR da Rafael ou o Akeron MP da MBDA. Abaixo duas fotos com o CV90 com o lançador de mísseis antitanque embutido na torre.
A versão CV90 Mjölner lançadora de morteiros de 120mm, mostra mais uma capacidade onde a versatilidade do véiculo é comprovada. O veículo possui sistemas C4I (comando, controle, comunicações e inteligência), e sua precisão pode ser aprimorada com munição guiada por GPS.
O CV90 Mjölner confere aos soldados a capacidade de não precisar sair do veículo para operar os morteiros, já que o veículo tem mais espaço para pessoal, munição e equipamento. A torre do Mjölner tem 60º de giro em azimute sem exigir uma solução assistida por energia e oferece uma faixa de elevação de 45º a 85º, permitindo o engajamento de alvos em uma ampla faixa de distâncias que vão de 7 à 12 quilômetros.
A pedido do Exército Norueguês, a BAE Systems Hägglunds desenvolveu a versão de engenharia denominada STING. Esta versão desenvolvida em cooperação com a Ritek, incorpora um braço remotamente controlado para o manuseio de engenhos explosivos; uma estação de armas remotamente controlada Protector da Kongsberg Protech Systems e a capacidade de operar o cilindro frontal SPCR (Self Protection Combat Roller) de neutralização de minas terrestres e o sistema frontal SCD (Surface Clearance Device) de remoção de obstáculos, ambos da Pearson Engineering.
IFV CV90 Interior
O interior do CV90 MkIII ou o do MkIV é bastante confortável. A equipe da BAE Systems Hägglunds trabalhou bastante para proporcionar a tripulação e aos soldados, o conforto necessário para que possam entrar e sair do veículo com rapidez e segurança. Abaixo umas poucas imagens do seu interior.
IFV CV90 em Örnsköldsvik
Ao chegar na fábrica da BAE Systems Hägglunds em Örnsköldsvik, eu não tinha a noção exata de como os veículos são produzidos. Os Sr. Håkan Näslund e Edward Kleberg me levaram para conhecer o passo a passo da produção tanto do CV90 como também do BsV10. As chapas de aço com as espessuras préviamente determinadas são levadas para as máquinas de corte, sendo uma delas a laser.
Com o programa em seus computadores, as chapas de diferentes tamanhos e formas vão sendo separadas para serem levadas aos locais onde começarão a dar forma a suspensão, ao chassi e assim por diante.
Uma coisa que me chamou a atenção foi a alta qualidade das soldas em todas as peças, fruto dos vários robôs que a fabrica possui. Todos os corredores são amplos e limpos, e em cada baia, os veiculos vão tomando forma. Já no final da linha de montagem foi possível ver um CV90 Mjölner sendo finalizado para entrega ao cliente.
IFV CV90 Resumo
Ao final de minha visita, volto para o Brasil com a certeza de que, caso o Exército Brasileiro (EB) ou o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), venham a optar pelo IFV CV90 MkIV, seja na versão equipada com o canhão de 35mm e suas poderosas munições ou equipado com o canhão de 120mm, as forças armadas brasileiras estarão muito bem servidas. A oferta ao País contempla a produção local do veículo, o que tornaria o Brasil parte do clube de operadores de CV90 e com a seleção de empresas brasileiras para a cadeia de suprimentos, o Brasil passaria a ser mais um dos fornecedores de partes do veículo, trazendo divisas ao país.
É evidente que tanto para substituir os velhos MBTs Leopard 1A5 no EB, a força terá que analisar prós e contras, porém, ante ao cenário dos conflitos no mundo atualmente, onde se verifica cada vez mais que grandes MBTs não estão tendo mais o sucesso que tinham antigamente, face de seus pesos elevados e sua falta de agilidade, talvez o CV90 com suas diferentes variantes, possa ser o caminho para a modernização da Cavalaria do Exército Brasileiro.
Já no caso da Marinha do Brasil, é necessária a troca dos SK-105 Kürassier devido a sua obsolescência, onde a dificuldade em encontar peças para sua manutenção faz com que o número ideal de veículos seja cada vez mais reduzido. Vale colocar aqui que a fábrica da BAE Systems Hägglunds está longe de paralisar a fabricação do IFV CV90, ante as mais de 700 unidades encomendadas.
O vídeo abaixo demonstra bem as qualidades deste veículo que pode fazer com que tanto Exército como a Marinha tenham uma alta qualidade operacional.
Parabéns pela excelente e completa matéria Padilha, lerei com maior atenção em casa !!!
Tem componentes alemães ?
Eles são muitos temperamentais , qualquer coisa bloqueia o Brasil!
Ótima matéria!
Obrigado pela correção Rafael.