Por Luiz Padilha e Guilherme Wiltgen
O editor do Defesa Aérea & Naval (DAN), Luiz Padilha, esteve presente na cerimônia a bordo do NAM Atlântico (A 140), onde na presença do Presidente da República, Jair Bolsonaro, foi anunciada a melhor oferta para o Projeto de Obtenção do Navio de Apoio Antártico (NApAnt) a ser construído no Brasil para a Marinha do Brasil. O anúncio foi feito pelo Comandante da Marinha, AE Garnier no salão nobre do navio na presença de convidados, como pode ser visto clicando aqui.
A melhor oferta foi feita pelo Estaleiro Jurong Aracruz Ltda / SEMBCORP Marine Specialised Shipbuilding PTE. LTD. Logo após o anúncio, fizemos uma rápida entrevista com o Diretor Geral de Material da Marinha, AE, Cunha acompanhado do Diretor de Gestão de Programas da Marinha, VA Calheiros, que os leitores podem conferir clicando aqui.
Como o assunto é muito abrangente, muitas dúvidas surgiram. Solicitamos então ao VA Calheiros, uma entrevista mais aprofundada, sobre a escolha da Marinha do Brasil. Confiram abaixo:
DAN – Como foi montado o Programa NApAnt pela Marinha?
VA Calheiros – O projeto foi montado pela DGePM em conjunto com as Diretorias Especializadas do Setor do Material (DEN, DSAM e DCTIM), pelas Organizações do Setor da Secretaria Geral da Marinha e da Diretoria Geral de Navegação.
Na elaboração da RFP (Request for Proposal), considerou-se o desempenho pretendido para o navio, além da Gestão do Ciclo de Vida (GCV) e da participação da Industria Nacional, dentre outros requisitos.
Defesa Aérea & Naval – O senhor pode nos explicar como se deu o apoio do BNDES e da FGV no processo da escolha do NApAnt?
VA Calheiros – O BNDES auxiliou no estabelecimento do índice de conteúdo local e nas métricas para medição das informações apresentadas pelas proponentes.
A FGV apoio na elaboração dos modelos e na aplicação das metodologias de Análise Multicritério (AMD) e de Análise de Risco (AR), tendo inclusive realizado treinamento das equipes da Marinha do Brasil (MB) no uso dessas duas ferramentas.
DAN – Foram analisados mais de 300 critérios para a escolha da oferta vencedora. O senhor pode nos explicar quais foram os principais critérios?
VA Calheiros – Os principais critérios, além dos Requisitos Obrigatórios que tiveram que ser atendidos, foram distribuídos nas seguintes áreas:
– Desempenho do Navio;
– Modelo do Negócio Financeiro;
– Ciclo de Vida e Apoio Logístico Integrado; e
– Estratégia Construtiva.
DAN – A escolha se baseou em duas ferramentas de análise de decisão: a análise multicritério e análise de risco. O senhor pode nos esclarecer a utilização dessas ferramentas?
VA Calheiros – A metodologia de Análise Multicritério compreende o estabelecimento de uma árvore de critérios, bem como a determinação do peso destes por meio de análise comparativa, a qual foi realizada por diversos especialistas.
O processo de elaboração dos critérios e pesos é feito com o auxílio de um software e ocorre antes do recebimento das propostas, conferindo qualidade técnica ao processo de seleção e grande segurança jurídica a todo o processo.
A Análise de Risco constitui instrumento pautado em uma permanente análise dos riscos envolvidos nas diversas fases do processo de seleção da melhor oferta. O modelo considera os elementos apontados como relevantes para a tomada de decisão, avaliados para todas as proponentes.
DAN – Tendo em vista que o NApAnt vai substituir o NApOc Ary Rongel, o senhor pode explicar quais serão as novas capacidades que esse navio irá trazer à OPERANTAR?
VA Calheiros – As principais capacidades que o futuro NApAnt apresentará oferecerá à OPERANTAR são:
- Classificação PC6, capaz de operar em campos de gelo de até 1 ano no período verão/outono com espessura de até 1,2m.
- Posicionamento Dinâmico Classe 2 (DP-2) constitui um sistema de controle em que todos os componentes e sistemas de energia, propulsão e controle atendam à Classe 2, que controla automaticamente a posição e aproamento do navio por meio de propulsão ativa, importante no apoio logístico e operacional aos projetos de pesquisa realizados.
- Aumento de aproximadamente 45% da capacidade de transportar Gas Oil Artic (GOA) destinados ao abastecimento da EACF.
- Aumento de mais de 70% da capacidade de acomodar carga nos porões, para apoio logístico ao PROANTAR.
- Aumento de 20% da Velocidade Econômica de Cruzeiro (VEC). O NApOc Ary Rongel opera com 10 nós e o futuro NApAnt, 12 nós.
- O NApAnt terá guindaste orgânico com capacidade de embarcar e desembarcar por ambos os bordos, com peso de 30 t, aumento de mais de 70% em comparação com o Ary Rongel, que possui Pau de Carga com capacidade de 17,5 t.
- A propulsão do NApAnt será diesel-elétrica, enquanto o Ary Rongel possui propulsão diesel composta por MCPs e MCAs.
- Hangar com capacidade para dois helicópteros, o que facilita a manutenção e conservação dos helicópteros no ambiente Antártico.
DAN – Poderia nos apresentar maiores detalhes do projeto vencedor através de desenhos ilustrativos de como será o NApAnt?
VA Calheiros – O projeto da EJA baseou-se no projeto do RV Investigator, o qual será customizado para atender aos requisitos estabelecidos na RFP.
DAN – O senhor pode explicar qual será o IACS Polar Class do NApAnt e qual a importância dessa capacidade para o PROANTAR?
VA Calheiros – – O NApAnt deverá ter a capacidade mínima de operar em campos de gelo de até 1 ano de idade, no período de verão/outono, categoria “B” do Código Polar, de acordo com o Anexo da Convenção SOLAS, equivalente à classificação PC6 da IACS, possibilitando a ampliação do período e da área de atuação do navio na região Antártica.
DAN – Como a principal missão do NApAnt é o apoio logístico à OPERANTAR, o senhor pode explicar qual a capacidade de carga do navio e se terá capacidade de transportar containers 20×20 e 20×40?
VA Calheiros – A capacidade de carga total nos porões está acima de 1.900m³. O sistema de manuseio de carga de bordo possuirá capacidade para embarcar e desembarcar contêineres de 20 pés e peso de até 30 t.
DAN – Em quanto a capacidade de carga do navio será superior à do NApOc Ary Rongel?
VA Calheiros – A capacidade de carga dos porões será superior em mais de 70% em relação ao Ary Rongel.
DAN – O NApAnt terá apenas um guindaste?
VA Calheiros – O NApAnt terá guindaste orgânico com capacidade de embarcar e desembarcar por ambos os bordos, carga com peso de 30 t, e também contará com guindastes auxiliares para manobra de embarcações miúdas.
DAN – Com relação a operações aéreas, qual será o limite do estado de mar para operações seguras com helicópteros?
VA Calheiros – Os sistemas do NApAnt terão capacidade de realizar operações aéreas até o estado de mar 4, na escala Douglas.
DAN – O convoo poderá operar com qual classe de aeronave e o hangar terá capacidade para quantos e quais modelos de helicópteros?
VA Calheiros – O convoo poderá operar com carga < 13 t. O hangar terá capacidade para 2 helicópteros similares ao AH-11B Wild Lynx.
DAN – Falando um pouco sobre propulsão, qual foi a propulsão oferecida para o navio (fabricante/modelo)?
VA Calheiros – A propulsão do futuro NApAnt será Diesel-Elétrica com 3 Grupos Geradores a diesel. Os fornecedores podem ser alterados durante as negociações do contrato.
DAN – O NapAnt será equipado com o sistema DP2 para posicionamento dinâmico. No modelo base existem 3 Thrusters na proa. O NapAnt seguirá esse modelo ou terá mais Thrusters para auxiliar sua operação?
VA Calheiros – O projeto prevê a utilização de dois Thrusters na proa e dois na popa para atender o sistema de posicionamento dinâmico.
DAN – O modelo no qual o NapAnt será baseado possui uma velocidade máxima de 12 nós. Para operar no Atlântico Sul e na região Antártica, essa velocidade não é baixa?
VA Calheiros – O NApAnt terá Velocidade Econômica de Cruzeiro (VEC) de 12 nós (20% superior ao Ary Rongel) e Velocidade Máxima Mantida (VMM) de 15 nós (7% superior ao Ary Rongel).
DAN – Qual será o número de tripulantes e qual a capacidade de pessoas fora a tripulação (pesquisadores por exemplo), que o navio poderá transportar?
VA Calheiros – O NApAnt terá capacidade de acomodação de, aproximadamente, 90 pessoas. Sendo cerca de 25% de pesquisadores e os outros da tripulação (até 26 pesquisadores e 69 militares).
DAN – Está prevista a utilização de sonar de casco como no RV Investigator, no qual o NapAnt será baseado?
VA Calheiros – O sonar de pesquisa do NApAnt será instalado no casco.
DAN – A Marinha definiu qual empresa/modelo fornecerá o sonar de casco para o navio?
VA Calheiros – Não, a Marinha determinou que o sonar será instalado internamente no casco do navio. Os fornecedores, apresentados pela proponente, podem ser alterados durante as negociações do contrato, entretanto, não será possível redução de requisitos apresentados na proposta final.
DAN – O navio poderá operar com ROVs?
VA Calheiros – Não foi um requisito considerado necessário para o NApAnt, porém poderá, caso a MB deseje, ser adotado no futuro.
DAN – A customização do navio com a inclusão do Hangar e Convoo, representou a perda de alguma capacidade no modelo base?
VA Calheiros – Não. A proposta para a construção do NApAnt se baseou em um projeto de propriedade intelectual da PROPONENTE (Navio de Propriedade Intelectual da PROPONENTE – NAPIP).
O objetivo principal é a contratação de empresa especializada em construção de navios desse tipo, para que seja possível a construção em Estaleiro Nacional.
Não se quer um navio igual ao NAPIP e todas as customizações feitas no projeto base foram para atender às necessidades solicitadas na RFP do NApAnt.
DAN – Na parte de sistemas, que tipo de radares e sistemas de comunicação o navio terá?
VA Calheiros – O sistema será composto de dois radares de navegação que operam em duas bandas diferentes: X e S.
O NApAnt terá capacidade de estabelecer comunicações, em voz e dados, nas faixas de MF, HF, VHF e UHF (Marítimo e Aeronáutico) e será dotado de um Sistema de Comunicações por Satélite, com capacidade de estabelecer comunicações compatíveis com o SISCOMIS (banda X) e segmentos espaciais contratados (L, Ku e Ka).
DAN – Após verificar o perfil do estaleiro Jurong Aracruz no Espírito Santo, vimos que ele possui capacidade focada na construção de “jaquetas” para navios tipo FPSO (Floating Production Storage and Offloading). Sem ter um dique seco, como o estaleiro irá colocar um navio de 6.000t na água?
VA Calheiros –A proponente selecionada é composta pelo Estaleiro Jurong Aracruz Ltda. e SEMBCORP Marine Specialised Shipbuilding PTE. LTD..,o qual possui total expertise na construção de navios. As empresas irão constituir uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) para dar início ao processo de construção.
O processo de lançamento do navio ao mar será feito pelo método de arraste, denominado skidding, com o auxílio do HLV (Heavy Lift Vessel), que irá submergir possibilitando a flutuação e posterior atracação do NApAnt em cais para conclusão das obras.
DAN – Já é possível informar o valor do contrato com o EJA?
VA Calheiros – Não é possível informar, pois ainda estamos na fase de negociações.
DAN – Este programa irá gerar algum Offset (acordo de compensação) para a Marinha?
VA Calheiros – Acordos de Compensações (Offset), somente ocorrerão de acordo com a Portaria n°61/GM-MD – Art. 12
Diante da necessidade de meios de superficie de patrulha,escolta e logistica,(frota defasada em número e tecnologia) será este navio prioritário para as nececessidades e orçamento da Marinha?
Sem um navio adequado para substituir o Ary, a MB comprometeria a sua tarefa fundamental no PROANTAR. As prioridades sempre serão muitas, e não apenas no setor operativo.