AMEAÇAS AO BRASIL: ELAS EXISTEM (?) (!)
1 – Introdução
É comum ouvirmos que não existem ameaças ao Brasil.
Os principais documentos que condicionam a defesa nacional parecem corroborar esta impressão.
Mas antes de entrarmos no mérito do título do artigo faz-se necessário introduzir algum significado acerca do termo “ameaça”. Ameaçar um país pode ser interpretado como um gesto intimidativo, algo que possa ter implicações na soberania do país. Uma ameaça pode não implicar em uma guerra, mas desencadeia uma crise entre Estados. Adiante veremos o que isso significa.
Vamos, então, analisar inicialmente como os principais documentos oficiais tratam sobre ameaças externas.
Podemos ler na atual Política de Defesa Nacional em vigor que:
“Após um longo período sem que o Brasil participe de conflitos que afetem diretamente o território nacional, a percepção das ameaças está desvanecida para muitos brasileiros.”
Na mesma publicação encontramos:
“A América do Sul, distante dos principais focos mundiais de tensão e livre de armas nucleares, é considerada uma região relativamente pacífica. Além disso, processos de consolidação democrática e de integração regional tendem a aumentar a confiabilidade regional e a solução negociada dos conflitos.”
Na Estratégia Nacional de Defesa observamos:
“O Brasil é pacífico por tradição e por convicção. Vive em paz com seus vizinhos. Rege suas relações internacionais, dentre outros, pelos princípios constitucionais da não intervenção, defesa da paz e solução pacífica dos conflitos. Esse traço de pacifismo é parte da identidade nacional e um valor a ser conservado pelo povo brasileiro.”
No novo Livro Branco de Defesa Nacional, em processo de aprovação pelo Congresso Nacional, visualizamos:
“A região sul-americana é a que tem apresentado menor incidência de conflitos entre Estados. Um ambiente regional pacífico vem contribuindo, mormente na última década, para o crescimento econômico da América do Sul. A postura conciliatória do Brasil, que convive em paz com seus vizinhos há mais de 140 anos, tem contribuído historicamente para a estabilização da região. Esse legado deve ser valorizado e preservado. A estabilidade e a prosperidade do entorno brasileiro reforçam a segurança do País e têm efeitos positivos sobre todos os países da América do Sul.”
O Ministro da Defesa, Embaixador Celso Amorim, em sua aula magna de abertura dos Cursos de Altos Estudos Militares das Forças Armadas (FA) e da Escola Superior de Guerra, do ano de 2012, intitulada “A Política de Defesa de um País Pacífico”, disponível na Revista da Escola de Guerra Naval, edição nº 18, externou:
“Um problema fundamental para a segurança de qualquer Estado, particularmente para aqueles cujo território se caracteriza pela continentalidade, é a definição de suas fronteiras.
No Brasil, a habilidade de homens como o Barão do Rio Branco – justamente cultuado nas instituições militares -, somada ao próprio peso específico do país na América do Sul, assegurou que esse enorme desafio fosse enfrentado pela negociação e o recurso a outros meios pacíficos.
Essa realidade repercute até os dias de hoje: seguro em suas fronteiras, o país pôde dedicar-se prioritariamente às tarefas do desenvolvimento e, com mais ardor recentemente, ao imperativo de reduzir a desigualdade e erradicar a pobreza.
Costuma-se dar o nome de poder brando (ou soft power) à capacidade persuasiva, negociadora e de irradiação de valores que, no caso do Brasil, tem produzido ganhos concretos. Ao poder brando estariam associados outros atributos como a simpatia do povo brasileiro, sua tão propalada índole pacífica e uma capacidade de compreender situações complexas vividas por outros países. Muitas dessas qualidades derivam diretamente da miscigenação de que tanto nos orgulhamos.”
É intenção estudarmos, em dois artigos, a premissa da inexistência de ameaças ao Brasil. No primeiro deles, o atual, daremos prioridade ao cenário terrestre em que nos inserimos e, no segundo, ao cenário marítimo.
A pontuação interrogativa e afirmativa entre parêntesis no título do presente trabalho é proposital. Ao final de nosso debate, o leitor amigo poderá escolher qual melhor se adéqua à nossa realidade.
2 – Uma breve visão sobre o fenômeno “Crise”
Não é intenção, no presente artigo, fazermos um estudo aprofundado do fenômeno Crise, mas a compreensão do mesmo é importante para termos um entendimento melhor da importância de conhecermos as potenciais ameaças ao Brasil.
A Doutrina Militar de Defesa[i] (DMD) define “Conflito” como:
“Um fenômeno social caracterizado pelo choque de vontades decorrente do confronto de interesses, constituindo uma forma de buscar-se uma solução ou compromisso. Os meios a empregar e as ações a desenvolver dependem do poder relativo dos oponentes, da liberdade de ação concedida por outros atores e pela importância atribuída ao objetivo a conquistar ou manter”
A ocorrência de conflitos, sua natureza e magnitude no ambiente externo ou interno de uma nação caracterizam os estados de paz, de crise ou de conflito armado (guerra), estados estes que abrangem todo o espectro dos conflitos.
Este espectro pode ser melhor visualizado na figura abaixo (DMD, pág. 21):
E a Crise é definida como:
“Um conflito desencadeado ou agravado imediatamente após a ruptura do equilíbrio existente entre duas ou mais partes envolvidas em um contencioso. Caracteriza-se por um estado de grandes tensões, com elevada probabilidade de agravamento (escalada) e risco de guerra, não permitindo que se anteveja com clareza o curso de sua evolução”
No estudo de Crises identificamos uma em particular, conhecida como Crise Internacional Político-Estratégica, que nos interessa diretamente.
É definida como:
“Um estágio do conflito, entre dois ou mais Estados, em que o desencadeamento proposital de uma situação de tensão visa a alcançar objetivos políticos ou político-estratégicos, por meio da manipulação do risco de uma guerra, com atitudes e comportamentos que indicam ser a situação extrema compatível com razões maiores, quase sempre ocultas ou não explicitamente declaradas.”
O trecho acima foi sublinhado pelo autor.
Na definição vemos que uma Crise pode ser desencadeada propositalmente, por Estados, a fim de alcançar objetivos políticos ou políticos-estratégicos do interesse de um determinado país. Estes objetivos resultam de antagonismos definidos, já existentes e não criados do imaginário.
Daí a importância de conhecermos possíveis antagonismos, as “ameaças” citadas anteriormente, de não permitimos o desencadeamento de uma Crise por não visualizarmos uma oportunidade que aparece para um suposto adversário, de entendermos que uma questão que consideramos, no Brasil, de menor importância, se mal negociada, pode ser usada para desencadear um processo que pode levar a um conflito armado.
3 – As questões que envolvem diretamente o Brasil
a) A Questão Amazônica
Muito já foi escrito sobre as ameaças que pairam sobre a Amazônia brasileira, principalmente sobre a questão da internacionalização da mesma. As fontes sobre este tema são vastíssimas e podem ser encontradas com facilidade com uma simples busca na internet.
Mas pretendo apresentar uma visão nova, extremamente abalizada, da questão. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) acaba de publicar um trabalho intitulado “DEFESA NACIONAL PARA O SÉCULO XXI – Política Internacional, Estratégia e Tecnologia Militar”.
Em seu capítulo dois, intitulado “POLÍTICA DE DEFESA E SEGURANÇA DO BRASIL NO SÉCULO XXI: UM ESBOÇO HISTÓRICO”, de autoria do Professor Francisco Carlos Teixeira da Silva, de quem tive o privilégio de ser aluno, aprendemos:
“Contudo, ameaças de outra natureza pairam sobre um país tão vasto como o nosso (e nem sempre tão cuidadoso, como deveria ser, com a preservação de seu meio ambiente e de suas riquezas naturais). Trata-se da posição da Amazônia e do debate sobre seu uso e sua preservação no cenário mundial. Para muitas personalidades, organizações (governamentais ou não) e mesmo organismos internacionais, a relevância da floresta amazônica (também nem sempre entendida de forma correta) é tão grande para a humanidade que a soberania brasileira deveria ser apenas relativa ou mesmo abolida sobre a imensa floresta tropical. Para não nos perdermos em citações desimportantes, cabe trabalhar com apenas um caso, como se segue.
Em 2001, o prestigiado cientista político e estrategista Pascal Boniface publicou, em Paris, o livro Guerres de Demain (Guerras do Amanhã), em que construía prováveis cenários de grandes guerras que ocorreriam ao longo do século XXI. Um dos cenários construídos, com categoria de elevada probabilidade de conflito, era a guerra ambiental, a travar-se em algum momento depois de 2030.
Note bene: Pascal Boniface não é um amador qualquer. Trata-se do diretor do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS) da França e Conselheiro do Comitê de Desarmamento junto ao secretário-geral da ONU, em Nova York.
Para Boniface é bastante provável que, em determinado momento deste século, surja uma guerra entre países “preservacionistas” – potências altamente industrializadas do Ocidente – e o Brasil pela posse da Amazônia. Ou, nas próprias palavras do estrategista francês: “A Amazônia pertence plenamente ao Brasil. Mas, se as potências ocidentais ignoraram o princípio sagrado da soberania nacional para fazer a guerra na Iugoslávia e ajudar os kossovares (mesmo Kossovo pertencendo plenamente a Servia/Iugoslávia) por que não o fariam contra o Brasil para se apropriar da Amazônia? O pretexto não seria mais a proteção de uma população, mas de toda a espécie humana… isto seria um dever dos outros estados em nome de toda a humanidade” (Boniface, 2002).
Assim, pode-se constatar, longe de qualquer paranoia ou fantasia, a discussão séria de uma alternativa bélica contra o Brasil num cenário futuro onde a questão ambiental, o aquecimento global, venha a se constituir em ameaça real ao planeta.”
As “citações desimportantes” que o Professor Francisco Carlos evita transcrever podem ser obtidas facilmente.
Algumas delas são:
“Ao contrário do que os brasileiros pensam, a Amazônia não é deles, mas de todos nós” – Al Gore;
“O Brasil precisa aceitar uma soberania relativa sobre a Amazônia” – François Miterrand;
“O Brasil deve delegar parte de seus direitos sobre a Amazônia aos organismos internacionais competentes” – Mikhail Gorbachev;
“As nações desenvolvidas devem estender o domínio da lei ao que é comum de todos no mundo. As campanhas ecológicas internacionais que visam à limitação das soberanias nacionais sobre a região amazônica estão deixando a fase propagandística para dar início a uma fase operativa, que pode, definitivamente, ensejar intervenções militares diretas sobre a região” – John Major; e
“Os países industrializados não poderão viver da maneira como existiram até hoje se não tiverem à sua disposição os recursos naturais não renováveis do planeta. Terão que montar um sistema de pressões e constrangimentos garantidores da consecução de seus intentos” – Henry Kissinger.
Podemos continuar tratando a questão amazônica como paranoia de militares, como uma “muleta” onde os mesmos encontrariam justificativa para a própria existência, onde poderiam oferecer uma “missão” a ser apresentada aos condutores políticos da nação?
Ou devemos considerar seriamente a ameaça que pesa sobre a soberania brasileira?
b) Brasil e Bolívia: A Ilha de Guajará-Mirim
A quase totalidade dos brasileiros cremos que as fronteiras terrestres brasileiras estão perfeitamente demarcadas por tratados.
Mas esta não é a realidade.
A Ilha de Guajará-Mirim é situada no Rio Mamoré, na fronteira entre o Brasil e a Bolívia, sendo objeto de contenda entre os dois países.
A delimitação desse trecho fronteiriço foi estabelecida pelo Tratado de Ayacucho, de 1867, e os trabalhos demarcatórios foram realizados por duas comissões mistas. A primeira ocorreu em 1879/1871 e a segunda teve início em 1875 e estendeu-se até 1878.
Foi produzida ampla cartografia, inclusive as “Plantas Geográficas dos Rios Guaporé e Mamoré”, chanceladas pelos delegados brasileiros e bolivianos. Em 1878 e 1879, houve troca de Notas da chancelaria boliviana com a embaixada do Brasil em La Paz, acusando o recebimento e aprovando a “Carta Geral”.
Ao realizar inspeção de fronteira na região, no período de 1928/1930, o Marechal Rondon constatou a ocupação indevida da ilha por uma firma boliviana, a Suárez Hermanos, com sede em Trinidad. Daí o nome de Isla Suárez usado pelos bolivianos.
Em abril de 1930 a Legação Brasileira em La Paz reclamou da ocupação indevida da ilha. Em 1937 foi apresentado pelo Ministro das Relações Exteriores da Bolívia um estudo da região em que o mesmo alegava a maior proximidade da ilha com a margem boliviana. A Legação Brasileira rebateu e seguiu-se intensa troca de notas.
Na década de 1950, houve a intenção das autoridades brasileiras de estabelecer na ilha um posto aduaneiro ou de polícia. A Bolívia foi contrária a esta intenção, pois nas discussões de 1937 tinha declinado de estabelecer uma aduana na ilha ante protesto do governo brasileiro.
Mais tarde, por ocasião das discussões de outro acordo, o Acordo de Roboré, que compreendia negociações sobre petróleo, foi acertada uma nota sobre limites. Esta nota estabeleceu que “O governo do Brasil concorda com o governo da Bolívia em considerar, em outra oportunidade, a questão referente ao estatuto jurídico da ilha de Guajará-Mirim.”
Desde 1968, a questão da soberania sobre a ilha segue sem desfecho. Para o Brasil, a ilha faz parte do município de Guajará-Mirim, no Estado de Rondônia. A Bolívia, por sua vez, considera a ilha parte do Departamento de Beni. Atualmente a mesma, ainda objeto de contenda, encontra-se sob administração boliviana.
Até quando vamos postergar esta questão?
c) Brasil – Bolívia: a questão da faixa de fronteira
Em 30 de julho de 2009, o Portal Terra publicava uma reportagem sobre a expulsão de brasileiros do Departamento de Pando, na Bolívia, na fronteira com o Acre, com a roupa do corpo somente, sob a alegação da necessidade de garantir a soberania na região e assentar 4 mil camponeses oriundos de La Paz e Cochabamba, em 200 mil hectares de terras localizadas na região fronteiriça.
Em 14 de agosto do mesmo ano, o jornal Folha de São Paulo anunciava a decisão do governo boliviano em expulsar “…à força cerca de 20 famílias de brasileiros que vivem no povoado de San Ignacio de Velasco, no departamento de Santa Cruz.”
No mesmo mês de agosto, o governo brasileiro anunciou que iria financiar, com um montante de R$ 20 milhões, a retirada de agricultores brasileiros da área de fronteira para o interior da Bolívia e que só os que aceitassem continuar naquele país receberiam indenização. Os que preferissem voltar ao Acre não ganhariam nada pela terra que possuíam.
O interessante é saber que desde 2006, quando Brasil e Bolívia assinaram um acordo anual, renovado duas vezes, para realizar o processo de regularização de imigrantes, apenas oito brasileiros foram legalizados pela Bolívia.
Já o Brasil, no mesmo período, regularizou 48 mil bolivianos sob o marco do convênio, a maioria morando na cidade de São Paulo.
Qual será a reação brasileira se ocorrer violência contra esta população?
d) Brasil – Paraguai: os “Brasiguaios”
Brasiguaios é como são conhecidos os cerca de 350 a 500 mil brasileiros e descendentes que vivem no Paraguai.
Esta emigração começou com a construção da represa de Itaipu e a necessidade da desapropriação de terras no Estado do Paraná. Atraídos pelo preço das propriedades no país vizinho e pela revogação, na época, da lei que proibia a venda de terras próximas às fronteiras para estrangeiros, estes colonos se dirigiram para o Paraguai.
Por um período de 40 anos os mesmos se dedicaram a agricultura, principalmente a plantação de soja, trazendo grande crescimento econômico para o país vizinho, que se tornou um dos principais exportadores do produto.
Mas, ao invés de integração entre nativos e imigrantes (paraguaios e brasiguaios), o que vem ocorrendo são conflitos que se aproximam da xenofobia.
“Os paraguaios acusam os brasileiros de ocuparem suas terras, afirmando que elas foram ilegalmente adquiridas, em prejuízo do povo nativo. Invasões lideradas por Movimentos de Sem-Terra têm ocorrido, expulsando pequenos produtores brasiguaios de suas lavouras e impedindo que eles vendam ou plantem nas terras que habitam e cuidam há pelo menos vinte anos.
Parte dos brasileiros não consegue comprovar na Justiça que são donos das terras, pois muitos fizeram acordos, quando chegaram à região, com colonos paraguaios, sem registro de títulos. Há cerca de 20 anos, o governo paraguaio demarcou e distribuiu, em alguns departamentos (estados), a título de reforma agrária 10 hectares de terra para camponeses nativos, que, por não terem intimidade com a lavoura, acabaram vendendo a gleba para brasileiros, muitas vezes em acordos verbais.
Há também os brasiguaios que possuem não só as escrituras das terras que ocupam há décadas, como também os recibos de pagamentos efetivados ao Banco Nacional de Fomento (BNF) em favor do Instituto de Bem-Estar Rural (IBR).
Mas o atual presidente do INDERT – Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra, órgão substituto do IBR, alega que o antigo IBR emitiu escrituras falsas para os agricultores e estes enfrentam uma batalha judicial, de grande influência política, que pode terminar na perda das terras que utilizam há mais de 20 anos.
As terras em disputa estão cobertas por plantações diversas, como soja, amendoim, mandioca e algodão. Também existem alguns silos e outras benfeitorias.
Os paraguaios acusam os brasileiros de se segregarem: de falarem sua própria língua, de usarem uma moeda própria, de hastearem a bandeira de outro país e de possuírem as melhores terras em território paraguaio. Numa onda forte de nacionalismo, reclamam de que a segunda língua dos filhos dos brasiguaios é o português, em vez do guarani. Em discursos inflamados afirmam que há uma ameaça real à soberania do Paraguai, que precisa recuperar e fazer valer a própria identidade.
As futuras autoridades acusam agricultores brasileiros de violarem a lei ambiental que proíbe o uso de alguns produtos químicos, de não preservarem, como exige a lei florestal, as terras localizadas nas proximidades dos rios paraguaios e de possuírem grandes extensões de terra, apesar de serem estrangeiros.
Os brasiguaios alegam que seus filhos sempre foram discriminados na escola e que a Justiça paraguaia está contaminada pela política anti-Brasil que vigora no país.”[i]
Aqui cabe a mesma pergunta anterior: qual será a reação brasileira se ocorrer violência contra esta população?
e) Brasil – Uruguai: a “Ilha Brasileira”
Aqui outra questão de fronteira, agora com o Uruguai.
A questão da “Ilha Brasileira” foi levantada oficialmente pelo Uruguai em 1940, pela apresentação de uma Nota Diplomática, reclamando da Convenção Complementar de Limites entre o Brasil e a Argentina, celebrada em 27 de dezembro de 1927.
Nessa nota o governo uruguaio reclama que no acerto feito entre o Brasil e a Argentina, para definir o limite em um pequeno trecho da fronteira, não foram levados em consideração os interesses de seu país.
Esporadicamente utilizada por pescadores ou contrabandistas no passado, a ilha tem sido ocupada nos últimos 40 anos por um brasileiro e seus familiares, que mantêm sua pequena casa de madeira e modesta plantação nas poucas áreas que continuam secas nas épocas de cheia do rio Uruguai.
Para o Brasil, o contencioso apresentado pelo Uruguai simplesmente não vai ser aceito.[i]
4 – As questões que poderiam afetar o Brasil
Neste tópico vamos ler, de maneira resumida, questões existentes entre nossos vizinhos que, se escalarem, poderiam afetar ao Brasil, seja com o transbordamento de um conflito para o território brasileiro, seja criando um fluxo de refugiados ou afetando economicamente a região.
a) Suriname – Guiana Francesa: os tributários do rio Maroni
O contencioso trata de uma porção de território no sul da fronteira entre o Suriname e a Guiana Francesa.
A disputa entre qual dos dois rios, Lawa ou Tapahony, daria origem ao rio Maroni remonta a 1860.
Em 1861, uma comissão franco-holandesa determinou, após medir a vazão dos rios, que o rio Lawa, como defendiam os franceses, era a cabeceira do Maroni. Não houve problemas sobre essa decisão até 1885, quando se descobriu ouro na área entre os rios Lawa e Tapahony.
Em 1888, França e Holanda chegaram a um acordo, segundo o qual a questão seria arbitrada pelo Czar Alexandre II. Este decidiu que o rio Lawa era a cabeceira do Maroni e, por conseguinte, deveria ser considerado a fronteira entre os territórios holandês e francês. Surgiu, então, uma nova dúvida sobre qual seria a nascente do rio Lawa. A Holanda considerou o rio Marowini e a França o rio Litani.
A definição sobre qual é a nascente do rio Lawa segue sem definição. Em 1992, o governo do Suriname, mesmo instado pela imprensa a tomar uma posição, não se manifestou sobre a presença de militares franceses em seu território e a ocupação de ilhas no rio Maroni, legalmente surinamesas, por nacionais da França, fatos constatados por uma patrulha de reconhecimento do exército.
b) Suriname – Guiana: os tributários do Courantyne e o New River Triangle
Há duas disputas territoriais entre a Guiana e o Suriname: uma a respeito da jurisdição sobre o rio Corentyne, que serve de fronteira entre os países, e outra relativa à região do Triângulo do New River, área conhecida como região do Tigre, ao sul dos dois países e na fronteira com o Brasil.
A fronteira marítima entre os dois países também foi, até recentemente, objeto de disputa. Essa questão foi levada ao Tribunal Internacional de Direito do Mar (ITLOS) que, em dezembro de 2007, emitiu sentença arbitral favorável à Guiana.
A questão lindeira era de menor importância, até o descobrimento de importantes recursos naturais nas regiões contestadas. Foram encontradas jazidas de ouro na região do New River Triangle e de petróleo na plataforma continental.
Enquanto o Suriname reclama o Rio Novo como o maior rio do tributário e, portanto, a fronteira correta, a Guiana defende que o rio Kutari constitui a cabeceira do rio Courantyne e, assim, o verdadeiro limite entre os dois países.
Em 14 de outubro de 2008, o barco de transporte de açúcar de bandeira guianense “MV Lady Chandra I”, com capacidade de 500 TPB, foi apresado pela guarda costeira do Suriname no rio Corentyne. Sua tripulação foi detida e multada no porto de Nickerie, sob a alegação das autoridades surinamesas de que a embarcação teria entrado sem autorização em águas sob a jurisdição do Suriname.
A atitude do governo surinamês, que dispõe de Forças Armadas (FA) mais fortes e bem equipadas do que as da Guiana, parece pretender forçar decisão em seu favor, relativa ao traçado da linha territorial na área do Triângulo do New River. Pode indicar ainda a intenção de enfraquecer economicamente a Guiana, por meio da elevação de custos de operação de atividades petrolíferas e açucareiras. Tal atitude poderia ser compreendida também como uma espécie de represália motivada pela sentença arbitral do Tribunal do Mar, que teve repercussão negativa no Suriname e provocou mobilização de setores da oposição, que acusaram o governo de não defender o interesse nacional.
c) Guiana – Venezuela: Guiana Essequiba e Ankoro
Essequibo, região situada entre o rio Cuyuni e o rio Essequibo, com extensão de 159.500 km² (cerca de 60% do território guianês), pertence atualmente à Guiana, mas tem sua soberania reivindicada pela Venezuela.
Os mapas venezuelanos apresentam esta região como área em litígio.
A colônia, onde atualmente está situada a Guiana, passou a ser posse da Grã-Bretanha (UK) em 1814, por meio do Tratado de Londres, decisão ratificada no ano seguinte pelo Tratado de Paris, determinando que o território britânico compreenderia a região entre os rios Orinoco e Essequibo, cartografado politicamente em 1838 pelo explorador Robert Schomburg, prussiano a serviço da coroa britânica. As bases históricas e geográficas utilizadas para a definição destas fronteiras sempre foram alvo de críticas por parte dos governos brasileiro e venezuelano.
Em 1899, forma-se um Tribunal Arbitral proposto pelos Estados Unidos (EUA), cuja decisão é o Laudo Arbitral de Paris, que concede o território a oeste do rio Essequibo à Guiana Inglesa. Em resposta, a Venezuela o declara “nulo e írrito”, postergando a possibilidade de negociação.
Em 1965, é aprovado pelo Congresso venezuelano um novo mapa político que abarca oficialmente a região de Essequibo, denominada Zona de Reclamación. No entanto, o UK dava continuidade à sua política de não fazer qualquer concessão territorial.
Em 1966, tropas venezuelanas invadiram e ocuparam metade da Ilha de Ankoro. Também, nesse momento, incidem sobre a Venezuela outras acusações de violência, como a pretensão de anexar parte das águas territoriais e zonas contíguas da fronteira com a Guiana, em 1968, e a Revolta Separatista do Rupununi, no sul do país, apoiada pelos venezuelanos.
No ano de 2006, sob a presidência de Hugo Chávez, a Venezuela aprovou a modificação da bandeira do país, com o acréscimo de uma estrela que representaria a região do Essequibo.
Atualmente a questão é mediada pelas Nações Unidas (ONU), que aguarda um pronunciamento da Venezuela indicando um novo mediador, após o falecimento daquele que negociava a questão.
d) Colômbia – Venezuela: o Golfo da Venezuela
Praticamente desde a dissolução, em 1830, da “Gran Colombia”, formando a Venezuela, Colômbia, Equador e Panamá, o conflito a respeito do Golfo da Venezuela, ou de Maracaibo, como o denominam os colombianos, permanece.
Em 1941, após mais de cem anos de negociações, os dois países assinaram um tratado que definiu a demarcação das fronteiras terrestres e a navegação dos rios comuns. Após a Segunda Guerra Mundial, com as evoluções relativas ao Direito do Mar, tornou-se necessária a delimitação da fronteira marítima.
Em 1952, o chanceler colombiano, em episódio altamente controvertido, que se configurou uma das raízes do atual problema, outorgou à Venezuela a soberania sobre o Arquipélago “Los Monjes” que, na pretensão venezuelana seria o ponto de partida para a demarcação dos limites da fronteira marítima.
A partir de 1954, foram iniciadas tratativas para a delimitação do mar territorial e da plataforma continental, sem sucesso.
Em 1980, a questão esteve perto de ser resolvida através de um Tratado que ficou conhecido como Hipótese de Caraballeda. Devido à forte reação contrária por parte da opinião pública venezuelana, o acordo não pode ser assinado.
O ápice dos atritos entre os países deu-se em agosto de 1987, em episódio conhecido como “A crise da Corveta Caldas”, quando esta embarcação colombiana ingressou, acompanhada de um submarino, em águas consideradas pela Venezuela como de sua soberania. Seguiu-se mobilização militar venezuelana, mas o conflito entre as duas FA foi prevenido pela atuação diplomática bilateral e do Secretário-Geral da OEA.
e) Peru – Equador: a controvérsia amazônica
A questão territorial tem suas raízes no período colonial, em que eram fixados apenas limites jurisdicionais.
A disputa entre os dois Estados tem início em 1854, quando para saldar dívidas junto a credores internacionais, o Equador vende, para colonos europeus, parte de suas terras consideradas “ociosas” na região amazônica. Nesse contexto, o governo peruano alega soberania sobre tais áreas e exige que tais vendas sejam canceladas.
Inicia-se o período de conflitos entre os dois países, ocorridos em 1859, 1941, 1978, 1981 e 1995.
O Peru e o Equador aceitam, em 1995, após a Guerra do Cenepa, a mediação oferecida pelos países garantes do Protocolo do Rio de Janeiro de 1942 e assinam, em 17 de fevereiro, em Brasília, a “Declaração de Paz do Itamaraty”.
Em 26 de outubro de 1998, o Peru e o Equador assinaram um acordo de paz abrangente, que estabeleceu um quadro para acabar com a disputa. A demarcação formal das regiões fronteiriças começou em 13 de maio de 1999. O acordo foi ratificado sem oposição pelos congressos dos dois países, finalmente pondo fim ao litígio.
f) Bolívia – Chile: o acesso ao mar
O pleito boliviano de uma saída para o mar nos remete à Guerra do Pacífico, em que este país perdeu sua faixa litorânea.
A figura abaixo representa os limites entre Peru, Bolívia e Chile, antes e depois da Guerra do Pacífico.
A guerra terminou com a perda pela Bolívia do seu acesso ao mar, situação formalizada em trégua assinada em 1884 e confirmada por acordo em 1904.
A Bolívia continua até hoje a reivindicar do Chile a concessão de uma faixa territorial soberana que permita sua saída ao mar. A resolução da questão consta, inclusive, como Objetivo Nacional em sua Constituição e tem servido de plataforma política para grande parte dos presidentes bolivianos. A questão da mediterraneidade, além de principal problema geopolítico da Bolívia, é também o principal condicionante de sua doutrina militar, motivo pelo qual o Chile é visto como maior rival potencial. Em março de 1978 a Bolívia rompeu relações diplomáticas com o Chile, por julgar que a negociação referente ao tema não avançava.
O Chile, por sua vez, age com equilíbrio, citando sempre o Tratado de 1904.
g) Chile – Peru: a fronteira marítima
A área em disputa corresponde a cerca de 35 mil km² de águas ricas em recursos marítimos no Oceano Pacífico.
Em janeiro de 2008 o governo peruano iniciou um “Caso” na Corte Internacional de Justiça, em Haia, referente à “delimitação marítima entre a República do Peru e a República do Chile”.
Ambos os países se comprometeram a respeitar o veredicto.
h) Argentina – Chile: Campos de Gelo Sul
A Argentina e o Chile tiveram uma quantidade de diferendos sobre demarcação fronteiriça, sendo o mais relevante a delimitação da Patagônia.
O último deles no continente, pois trataremos da questão antártica no próximo artigo, situa-se na região conhecida como “campos de gelo sul”.
Segundo a Argentina, a fronteira deve ser traçada através de uma linha divisória que passaria pelos picos mais altos, de acordo com o relevo da zona. Esta solução levaria a fronteira argentina para somente 14 km do Pacífico. O Chile argumenta que o limite deve ser estabelecido por uma linha reta entre o Monte Fitz Roy e o Cerro Murallón, o que lhes garante grande parte dos 2.200 km em disputa.
Não há previsão de solução para a questão.
5 – Conclusão parcial
No presente artigo nos propusemos a estudar a premissa da inexistência de ameaças ao Brasil, inicialmente no cenário terrestre em que nos inserimos.
Procuramos mostrar, no item dois, de forma muito simplista, o que significa o fenômeno “Crise” e entender que a mesma resulta de um antagonismo definido, já existente, e que pode ser desencadeada propositalmente por um suposto adversário em um processo que pode levar a um conflito armado. Daí a importância de conhecermos os antagonismos que nos afetam.
Apresentamos, no item três, questões que envolvem diretamente o Brasil, as julgadas mais importantes, pois não tratamos da questão do ataque às FARC realizado pela Colômbia no território equatoriano, a questão do Sendero Luminoso no Peru, a questão das Papeleras entre a Argentina e o Uruguai, do narcotráfico, do contrabando, do garimpo,da questão indígena, entre outros assuntos, a fim de não saturar o presente artigo.
No item quatro, descrevemos as questões existentes entre nossos vizinhos e que podem afetar o Brasil, seja pelo transbordamento de um conflito para o interior de nossas fronteiras, seja criando um fluxo de refugiados ou comprometendo economicamente a região.
No próximo artigo trataremos do que pode nos afetar no cenário marítimo.
Para terminar, utilizo-me de uma frase proferida pelo grande brasileiro Rui Barbosa:
“Uma nação que confia em seus direitos, em vez de confiar em seus soldados, engana-se a si mesma e prepara a sua própria queda.”
[i] Para maiores informações: http://www.info.lncc.br/uilhab.html
[i] Fonte: http://www.igeduca.com.br/vestibular/temas-atuais/quem-sao-os-brasiguaios.html
[i] Disponível em: http://www.arqanalagoa.ufscar.br/pdf/doutrina_militar_de_defesa.pdf
Parabéns pelo texto, bastante explicativo. Me permita citar Ciro:Sábios conselhos:- Se demonstrares força e pobreza todos te temerão. Demonstrando força e riqueza, todos querem ser teus aliados. Se demonstrares fraqueza e pobreza ninguém te dará importância, mas demonstrando riqueza sem demonstrar força atrairás sobre a tua cabeça todas as ambições do mundo.
Conselho do príncipe Ciro (futuro rei dos médo-persas ) ao seu tio, então Rei da Média, em uma visita de uma delegação do Egito, a maior potência militar da época.” Nossos antepassados nos legaram esta nação continental, miscigenada,multicultura(ñ multietnica), cristã e indivisivel, com muitas lutas,sangue e ousadias, senão seriamos uma nação fragmentada, atrasada,como a Africa e em conflitos tribais, adorações pagãs, escravidão e até sacrificios humanos.
Entre nações existem interesses políticos, econômicos e de segurança. O novo continente, foi habitado por imigrantes que aqui chegaram pelo estreito de Bering e me parece Indonesia.P. ex. Os mayas exterminaram tribos rivais, sendo comuns sociedades exterminarem ,absorverem ou sendo absorvidos por culturas diversas. Politicas equivocadas de isolar e fortalecer grupos,segundo origens antepassadas, só servem para aflorar discriminações e purificação etnicas, evitando-se miscigenações(politica nazi).O Iraque foi invadido,contrariando a própria carta da organização de alecrins ONU. Alguém acredita que a Coreia do Norte, desenvolveu armas atômicas e misseis de cruzeiro, sozinha, no quintal de Russia e China? Como já é conhecimento de nacionais, o nosso “aliado” estadunidense, promoveu e faz restrições tecnológicos, que provocaram atrasos em nosso desenvolvimento, como no desenvolvimento dos misseis de curto alcance e no casos das centrifugas. Me desculpe alguns comentaristas, mas essa historia de que devemos ter conhecimentos e depois “se necessário”, fabrica-los, num mundo de lobos nucleares, é conversa de traíra ou desinformados.Se necessitar fabricar algo para defesa ou persuasão, não haverá tempo para tal! Moral da historia:” um reino na China, se tornou próspero e sem forças de defesas.Um reino vizinho, poderoso e ambicioso, invadiu e o destruiu”.
A única solução totalmente pacífica e possível para todas essas questões (Itens 3 e 4) é a unificação dos 12 países integrantes da América do Sul em um superpaís continental. Findas as disputas por território, a União Sul-Americana também estaria livre de tensões internas entre povos (Que poderiam circular livremente entre os territórios) e poderia gerenciar melhor as ameaças externas contra sua soberania e integralidade, em especial àquelas vindas de “um certo país estrangeiro cuja capital é Washington”.
A única maneira de fazer valer suas vontades perante os grandes atores globais, é juntando esforços, recursos, pessoal e território para a transformação do continente América do Sul em uma nação América do Sul.
Já quanto à Guiana Francesa, ficaria a cargo dos habitantes se desejam permanecer franceses ou se integrarem ao novo país, mas com a América do Sul unificada, a reintegração de imigrantes ilegais na Guiana Francesa de volta para a União Sul-Americana seria menos complicada.
Uma verdadeira aula de História.
A reportagem abaixo foi publicada hoje no Estado de São Paulo e caberia no artigo:
Brasil é acusado de roubar território na Guiana
Jamil Chade / Genebra
Pescadores e garimpeiros cercam o consulado brasileiro em Caiena, na Guiana Francesa, em protesto contra o que eles chamam de “roubo” dos recursos naturais do território francês por empresas e imigrantes irregula-res brasileiros. O protesto come-çou na última sexta-feira e os organizadores da manifestação ga-rantiram ao Estado que vão man-ter o bloqueio pelo menos até o próximo dia 7.
Os pescadores da Guiana Francesa acusam barcos, empresas e simples pescadores brasileiros de sair principalmente do Mara-nhão e Amapá para pescar ilegal-mente nos 350 quilômetros de águas territoriais francesas. Sem controle, essa carga seria trans-portada ao Brasil e vendida no mercado nacional,
O que os sindicatos de traba-lhadores pedem é que o Brasil ratifique um tratado assinado pe-los ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolas Sarkozy, em 2008, e que estabelecia que Brasília criaria programas para reintegrar esses imigrantes, de volta em território brasileiro.
“Há dez anos estamos alertan-do para o fenômeno da pesca ile-gal”, declarou ao Estado Patrí-cia Triplet, diretora do Sindicato de Pescadores da Guiana. “O que queremos é o fim dessa práti-ca. Hoje, barcos de pesca indus-trial brasileiros estão instalados nas águas da Guiana, com um for-te impacto para nossos pescado-res. Nos últimos doze meses, ve-mos cada vez mais nossos bar-cos voltarem vazios”, alertou.
“Três mil pessoas vivem da pesca na Guiana e o setor é o ter-ceiro mais importante na econo-mia da região. Mas o que esta-mos vendo é empresas falirem”, insistiu Patricia Triplet. “Por is-so, decidimos cercar o consula-do”, completou.
Para chamar a atenção, foram colocados caminhões de som, câ-maras de frigoríficos e carros blo queando as ruas que dão acesso ao consulado brasileiro. Mas os sindicatos garantem que uma passagem foi deixada para que funcionários possam entrar e sair do local a pé.
No fim de semana, organiza-dores alegam que um dos fun-cionários do escritório brasilei-ro tentou romper o bloqueio com seu carro, o que acabou ge-rando uma confusão entre mani-festantes e autoridades. Troca de ofensas entre os funcioná-rios brasileiros e os manifestan-tes também foram registradas por testemunhas.
Adesão. Hoje, será a vez de ga-rimpeiros se unirem ao protes-to. Eles também acusam os brasi-leiros de levar o ouro da Guiana Francesa de forma ilegal.
Ao Estado, o representante dos garimpeiros da Guiana, Gotier Ort, explica que a categoria já desistiu de protestar diante das autoridades francesas.
“Sabemos que estamos crian-do potencialmente um inciden-te diplomático. Mas nos demos conta de que a responsabilidade disso tudo não é apenas da França, que não controla a entrada desses trabalhadores irregulares, mas do governo brasileiro que faz vista grossa ao problema porque, de fato, ganha muito com o esquema que existe”, ex-plicou o sindicalista. Os garim-peiros passarão a apoiar a mani-festação oficialmente a partir de hoje, disse ele.
Citando dados da WWF, Ort aponta que o garimpo do ouro na Guiana sustenta cerca de 100 mil famílias no Brasil. “Temos gente que vem desde o Ceará pa-ra garimpar aqui”, declarou. “O que nós e os pescadores estamos dizendo é que há um roubo de nossos recursos naturais e, por-tanto, da renda de milhares de pessoas na Guiana”, insistiu.
“Enquanto um brasileiro vem, retira o ouro ou leva o peixe sem pagar impostos, nós somos obri-gados a ter tudo regularizado pa-ra poder trabalhar. Trata-se de uma concorrência desleal”, de-clarou Gotier Ort.
O Comitê Regional de Pesca, o Sindicato de Pescadores da Guiana e os garimpeiros ainda recusaram uma proposta de Pa-ris de viajar até a capital france-sa para tentar debater uma solu-ção. Segundo eles, trata-se ape-nas de uma estratégia para ga-nhar tempo.
Como mostrei no texto, há duas situações.
Umas afetando diretamente o Brasil e outras de maneira indireta, podendo acarretar o transbordamento de um conflito, um fluxo de refugiados ou afetando economicamente a região.
Ambas situações existem.
Prezado Cte Vinicius, Veja só que interessante, tendo em vista especificamente o caso que o Sr relatou na sua resposta eu entendo que vc na verdade enfatizou o meu ponto de vista. 🙂 Note que em momento nenhum desta “crise surinamesa” o Brasil se sentiu minimamente afetado ou realmente ameaçado pelo pequeno pais das guianas. (se nosso país realmente tivesse se sentido ameaçado o Brasil teria topado de cara invadir isoladamente ou com os EUA. Ao meu ver o que REALMENTE encomodou, foi a perspectiva de uma invasão americana com o potencial de isso gerar o estabelecimento de bases militares no nosso continente por período absolutamente indefinido. Ou seja, os vizinhos não são o problema, a interferência militar no nosso continente por americanos e europeus, sim é.
Faço sentido?
[]s FS
Um ótimo texto, como todos os outros dessa coluna. Quanto às disputas territoriais dos nossos vizinhos, será que nos cabe o papel de mediadores? Será que poderíamos ser responsáveis por manter a paz aqui, nem que pra isso tenhamos que levantar a voz e mandar ambos os lados ficarem quietos? Afinal de contas, mesmo o Brasil não tendo uma força armada decente, podemos fazer isso com qualquer país da AL…
Felipe, aguarde o próximo artigo que tratará do cenário marítimo.
Eu evitei saturar o presente artigo com uma quantidade de outras informações que poderiam ser citadas. Vou escrever uma das que não citei.
O livro publicado pelo IPEA, em seu capítulo 5, intitulado “O PODER MILITAR BRASILEIRO COMO INSTRUMENTO DE POLÍTICA EXTERNA”, de autoria de Fernando José Sant’Ana Soares e Silva, nos apresenta o seguinte fato histórico:
“Outro fato importante envolvendo um país vizinho se deu em 1983 na crise do Suriname. Esse país, devido a problemas políticos internos, estava isolado da comunidade internacional e buscou ajuda junto a Cuba. Havia a percepção, por parte dos Estados Unidos, que Cuba iria aumentar a influência comunista na região, inclusive com desdobramentos de tropas, através de uma aproximação com o Suriname e com Granada. Receosos desse intento, os Estados Unidos enviaram um emissário ao Brasil, em março de 1983, para propor que os dois países compusessem uma força militar aliada, com a finalidade de invadir o Suriname, prevenindo a ameaça comunista.
O governo brasileiro respondeu que não participaria de uma invasão a um país vizinho, dissuadiu o governo norte-americano de realizá-la e se comprometeu a resolver o problema, por acreditar que este ocorria em sua zona de responsabilidade.
Assim, houve uma missão, liderada pelo chefe da Casa Militar, general Venturini, que foi ao Suriname oferecer ajuda militar e econômica em troca do afastamento dos cubanos. A missão foi coroada de êxitos: o objetivo de segurança foi atingido. Granada, contudo, foi invadida em outubro daquele ano pelos Estados Unidos.”
Então, como pode observar, crises “aparecem” sem esperarmos, podem envolver países fracos militarmente, mas podem envolver poderes e interesses maiores que os nossos.
A despeito da discussão proposta, me agrada muito ler artigos de quem realmente estuda o assunto e sabe expor suas idéias com organização e concisão.
Novamente, obrigado por compartilhar o texto.
Muito interessante a analise, mas tendo em vista a pobreza acaxapante de TODO os nossos vizinhos continentais sou levado a crer que qualquer guerra hipotetica jamais passaria de uma “brevissima”briga de rua no estilo do que foi o “conflito do Cenepa”entre peru e equador ou o ataque seguido de desculpas dos colombianos contra a base dos FARCs no lado equatoriano do rio da fronteira…Pra mim, a melhor argumentação para FFAA modernas e capacitadas no Brasil reside em termos capacidade para faze frente a qualquer interferencias extra continentais nos nossos INTERESSES, seja com relação a qualquer vizinho seja em relaçao a nossa geopolitica na Africa. Dou um exemplo: 1982 nao nos intereesava de jeito algum o estabelecimento de uma guerra sangrenta e duradora entr reino unido e argentina. Na epoca nao tinhamos meios militaresminimamente plausiveis para ordenar que o GT britanico sustasse seu deslocamento para o sul, assim nos sobrou agir em prol da argentina “nas sombras”e esperar pelo melhor… Faço algum sentido?